Ana Laíns, 20 anos a remar pela maré
MÚSICA A cantora está de regresso aos palcos nacionais, depois de uma minidigressão pela Europa, para apresentar este domingo, em Famalicão, o álbum 20 Anos, com o qual atingiu o primeiro lugar do top nacional.
Será, porventura, a mais desconhecida das estrelas nacionais, mas o epíteto habitualmente atribuído aos ídolos de multidões não surge aqui por acaso. Afinal, não serão assim tantos a poderem gabar-se de ter atingido o primeiro lugar do top nacional. E mesmo sabendo que os números já não são como nos velhos tempos, estes refletem igualmente outras variantes, digamos mais tecnológicas, que são iguais para todos. Mas adiante, porque 20 anos de carreira também não estão ao alcance de todos, “apesar do reduzido espaço mediático” para artistas – “como eu” – que trabalham sozinhos e lançam discos de forma independente.
Especialmente numa área que não é só música tradicional, mas também não é pop, ou seja, “é um bocadinho de tudo”, como diz Ana Laíns com humor. “Não acredito que seja propositado, essa alegada falta de interesse talvez seja apenas preguiça, mas tudo fica mais difícil e isso acaba por nos penalizar a outros níveis”, atira, já mais a sério. Por exemplo, assinala, é difícil ser cabeça de cartaz em festivais: “Há muitos mais artistas como eu, mas somos sempre aqueles das letras pequeninas lá pelo meio ou, pior ainda, um dos ‘muitos mais’, que já se tornou numa espécie de nome do meio.”
Contrapõe a isto “o tal primeiro lugar” do top, que “deve querer dizer algo com muita força”. E acrescenta: “É uma questão que deve ser discutida, para, no final, permitir que o público seja soberano na escolha de quem quer ou não ouvir, porque sempre que nos apresentamos em qualquer lado os espetáculos estão cheios e temos sucesso, por isso existe espaço para esta música.”
E que música é afinal a de Ana Laíns, que à falta de melhor, e talvez por preguiça, continua muitas vezes a ser apresentada como fadista? “Fadista? É horroroso, porque parece mal e é redutor em termos da abrangência da minha música e, acima de tudo, injusto para quem é mesmo fadista e faz vida a cantar o fado mais tradicional”, sublinha.
No estrangeiro é rotulada de world music, “ok”, mas por cá basta-lhe cantora. “Ana Laíns, cantora, está ótimo, fico feliz assim”, diz com um sorriso. “Percebo que temos de balizar e descrever a música de alguém, mas rotular não, isso é redutor.” Basta ouvir o álbum 20 Anos – Ana Laíns e Convidados ao vivo no Casino Estoril para perceber a amálgama de influências a partir da qual constrói a sua música, que em cotêm um único fator, a língua portuguesa – “é o meu principal instrumento de trabalho”, assume. O disco regista o concerto de celebração de 20 anos de carreira da artista que esgotou o Salão Preto e Prata do Casino Estoril, em janeiro de 2020, com participações de vários convidados, como Luís Represas, Ivan Lins, Mafalda Arnauth e Fernando Pereira, entre outros, ou ainda o Grupo Cantares de Évora e as Adufeiras de Idanha-a-Nova. “Esse disco foi um miminho que decidi dar a mim própria, para também poder partilhar este momento feliz com os meus amigos em palco”, confessa. Foi um momento especial também, porque o Casino Estoril foi o seu primeiro palco enquanto cantora profissional, no antigo wonder bar, e portanto “teria um certo simbolismo fazer ali o espetáculo dos 20 anos de carreira”. Quanto aos convidados, “não poderiam ser outros, porque são todos amigos e pessoas importantes neste percurso. Felizmente todos aceitaram”. Também por isso fazia sentido perpetuar o momento, até porque lhe faltava um disco ao vivo no currículo. “Sou uma artista muito mais forte em palco do que em estúdio. Ao vivo é tudo mais fluido e verdadeiro. É o lugar onde gosto de estar, não tenho qualquer medo do palco, é a minha casa e tenho um gosto imenso de a partilhar com o público.” Como vai fazer já este domingo, no regresso aos palcos nacionais, com um concerto integrado no ciclo Anima-te, em Vila Nova de Famalicão, depois de uma minidigressão europeia que a levou até à Croácia, Lituânia e Espanha. “Mesmo sem ser muito conhecida, tenho muito trabalho. Tenho consciência de que sou uma artista de nicho, mas quero sempre chegar a mais gente”, admite.
Uma das novidades do último disco foram as letras traduzidas para mirandês, um idioma pelo qual se apaixonou já há alguns anos, quando ouviu pela primeira vez “o mítico disco Trás-os-Montes, de Né Ladeiras, e que entretanto começou a aprender. “Se há algo que me fascina deste sempre, é a enorme dimum
No estrangeiro é rotulada de world music, “ok”, mas por cá basta-lhe cantora. “Ana Laíns, cantora, está ótimo, fico feliz assim.”
versidade cultural deste país e sabia que mais tarde ou mais cedo também chegaria ao Mirandês”. Decidiu dar esse passo “para dar um contributo na defesa deste idioma minoritário e poder mostrar aos portugueses e ao mundo, a segunda língua oficial do país, proveniente do asturo-leonês, que tanto nos enriquece enquanto povo”. Não é por isso de estranhar que, entre os seus planos para o futuro, esteja a inclusão do mirandês num próximo disco ou espetáculo. “Vou fazê-lo”, garante. dnot@dn.pt