Diário de Notícias

Verão fraco faz cair os preços em Portugal

Em junho, Portugal deverá ter sido o único país da zona euro onde os preços recuaram. Diferencia­l de inflação está em máximos nas séries do Eurostat.

- TEXTO MARIA CAETANO maria.s.caetano@dinheirovi­vo.pt

A divergênci­a nos preços “está em parte associada à falta de sincronia dos impactos da pandemia nos vários países”, reflete nota emitida ontem pelo INE.

Apandemia está a abrir cada vez mais o fosso entre Portugal e o conjunto da zona euro em termos de inflação, com a variação no índice harmonizad­o de preços no consumidor português a atingir já um diferencia­l de 2,5 pontos percentuai­s relativame­nte ao indicador que guia a política monetária do Banco Central Europeu.

Em junho, Portugal apresenta-se para já como o único país do euro com um recuo nos preços face ao mesmo mês do ano passado no indicador do Eurostat, ostentando uma variação negativa de 0,6%, contra uma estimativa de subida de 1,9% nos preços na zona euro. É o maior diferencia­l de inflação em toda a série estatístic­a europeia, que arranca em 2015.

A divergênci­a no índice harmonizad­o para comparaçõe­s “está em parte associada à falta de sincronia dos impactos da pandemia nos vários países, que geram efeitos de base de diferentes magnitude”, reflete nota do Instituto Nacional de Estatístic­a (INE) publicada ontem. Fundamenta­lmente, a resposta para as diferenças de comportame­nto nos preços portuguese­s encontra-se no turismo.

“Na área do euro, os fatores que mais ponderam, e positivame­nte, são o aumento dos custos de transporte­s, a eletricida­de, casas, gás, e álcool e tabaco. Nós também temos esses a subir, mas depois temos um peso muito grande na restauraçã­o e na hotelaria, que na zona euro é positiva, apesar de muito baixinha”, explica o economista João Duque.

Em junho, os preços de restaurant­es e hotéis ficaram 6,3% abaixo dos de junho do ano passado no que diz respeito a consumidor­es nacionais. Mas, quando se junta o consumo de estrangeir­os, que conta para o índice harmonizad­o publicado pelo Eurostat, a queda é ainda mais profunda: de 8,9%, segundo os dados detalhados do INE. E o efeito dessa queda é ainda ampliado pelo facto de o turismo ter um peso muito superior no cabaz de preços que é seguido a nível europeu (vale quase um décimo), por comparação com o indicador doméstico do índice de preços no consumidor (conta apenas cerca de 6%).

Os dados mais detalhados do INE também permitem ver que não é tanto na restauraçã­o que os preços caem, mas sobretudo na hotelaria. Olhando apenas para os dados internos, do índice de preços no consumidor, os preços dos serviços de alojamento ficaram em junho deste ano 25% abaixo dos de junho do ano passado. Mas há um efeito de base a considerar. Há um ano, os preços da hotelaria cresciam ainda 1,5% face a junho de 2019.

Agora, admite João Duque, “haverá muita gente a fazer alguns descontos, provavelme­nte”, face à falta de procura. Não só externa, mas também interna. “Em cima dos que não vêm, há os que não ficam”, aponta o economista, lem

brando que, ao contrário do ano passado, há fronteiras abertas para quem está vacinado, testado ou imune. “Há uma coisa que no ano passado acontecia e que este ano não vai acontecer. Os portuguese­s este ano vão sair de Portugal para fazer férias em sítios mais seguros que Portugal. O ano passado isso não acontecia”, alerta.

É por essa via que Portugal poderá continuar a divergir cada vez mais da zona euro em termos de recuperaçã­o de preços, o que representa – ainda que não para já – um risco. “Se a política monetária é guiada por um indicador que está muito diferente daquele que é localmente o de Portugal, então a política monetária que é sempre ajustada para o indicador central está muito desajustad­a daquilo que é a nossa política monetária. O risco é o levantamen­to das medidas quando nós ainda precisaría­mos delas”, refere João Duque.

Depois de ter na passada semana alterado a meta da política monetária para uma inflação de 2%, admitindo ultrapassa­gens moderadas ou transitóri­as antes de fazer recuar estímulos, o Banco Central Europeu prepara-se para neste mês anunciar “alterações interessan­tes”, segundo avançou este fim de semana a presidente, Christine Largarde. Em todo o caso, assegurou, o programa de compras acionado em resposta à pandemia deverá manter-se, pelo menos, até março do próximo ano.

 ??  ?? Falta de turistas em Portugal é apontada como o principal motivo para a diminuição dos preços, ao contrário do que está a ocorrer nos outros Estados membros do euro.
Falta de turistas em Portugal é apontada como o principal motivo para a diminuição dos preços, ao contrário do que está a ocorrer nos outros Estados membros do euro.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal