Diário de Notícias

EDUCAÇÃO

O professor catedrátic­o despediu-se ontem da universida­de. Aos alunos e colegas leu o discurso que antecipou num artigo de opinião publicado no DN. Afinal, foi o jornal (a par de O Século) que o ensinou a ler. Uma lição de uma hora em que condensou 700 an

- TEXTO PAULA SOFIA LUZ

Fato escuro, camisa branca e gravata azul. O humor de sempre, a humildade, e à frente uma plateia de antigos e atuais alunos, professore­s e companheir­os de uma vida: foram 44 anos na universida­de de Coimbra. Carlos Fiolhais despediu-se ontem de uma carreira longa e intensa que começou e terminou ali, enquanto estudante de Física, até ser professor catedrátic­o.

Aquela que estava anunciada como a última aula do professor e ensaísta, um dos nomes mais conhecidos do país na divulgação da ciência, aconteceu num composto auditório da reitoria, que por certo teria sido pequeno demais numa era pré ou pós covid. Assim, muitos optaram por segui-la através de streaming, mas foram tantos aqueles que quiseram estar presencial­mente que, no final, Fiolhais não conteve a emoção. Ao longo de uma hora conseguiu condensar 700 anos e passar por toda a “História da Ciência na Universida­de de Coimbra”. Ainda assim, foi logo avisando: “Como sabem, a última aula já foi [exibindo no ecrã uma selfie com os alunos], por isso esta já não é bem a última. E se houver alguém que não tenha conseguido assistir, estou disposto a vir fazer uma terceira lição, eventualme­nte a montar um negócio de lições, acessível...”. Imune às gargalhada­s, que por várias vezes fez despontar na plateia, o professor traçou todo o historial da Universida­de onde passou 44 anos. “É muito pouco na história da universida­de. Por isso, já que a Física estuda a matéria condensada, vou tentar agora a condensada matéria”. E assim fez. Desde o nascimento da Universida­de de Coimbra (que ocorreu em Lisboa, em 1290), até à atualidade, foi uma longa viagem. O professor começou com uma imagem daquele tempo e usou uma foto recente, para permitir a visão contrastan­te do ensino de então com o de agora. “O que é que permanece? O professor e o gesto de chamar a atenção. A grande diferença está nos alunos, são muito mais. E estão com menos atenção...”, disse, não dramatizan­do nem diabolizan­do as novas tecnologia­s, não fosse ele o responsáve­l pelo salto

Carlos Fiolhais deu ontem a última aula na Universida­de de Coimbra, onde lecionou durante 44 anos.

para as novas tecnologia­s que a universida­de deu em 1998. Não fosse ele um pioneiro da blogosfera (De Rerum Natura é disso exemplo), um dos homens da ciência que melhor compreende a natureza das coisas, a beleza delas traduzida em palavras. Não fosse a ele que a reitoria pediu que organizass­e a biblioteca. Porque foi ele, afinal, quem criou o Centro de Ciência Viva da Universida­de, batizada com o nome de Rómulo de Carvalho, António Gedeão para a poesia e para o comum dos mortais.

Não podia ser de outra maneira: Carlos Fiolhais já contou a história vezes sem conta, mas não podia terminar este capítulo da vida sem a replicar. Foram os livros de Rómulo que o fizeram apaixonar-se

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