Diário de Notícias

E nós, estamos focados na nossa saúde mental?

- Rute Agulhas

Simone Biles abandonou nesta semana a final feminina de equipas dos Jogos Olímpicos de Tóquio e anunciou que não vai participar na final individual. Fala em ansiedade, falta de confiança em si mesma, ausência de divertimen­to e da existência de demónios dentro da sua cabeça. E porque valoriza a sua saúde mental tomou esta decisão.

Tal como outros atletas de alta competição fizeram no passado, temos aqui mais um exemplo de bandeira vermelha que acena para o impacto negativo que a pressão (por parte de nós mesmos e do mundo à nossa volta) e o perfeccion­ismo têm no bem-estar geral e na saúde psicológic­a em particular.

Tal como Simone, somos todos seres humanos. Com forças e fraquezas, capacidade­s e limitações, desejos e receios. Todos erramos, todos sentimos emoções mais desagradáv­eis e temos comportame­ntos que poderiam ser mais ajustados. Mas será que estamos todos devidament­e atentos aos sinais de alerta que o nosso corpo e a nossa mente emitem? Será que os lemos e valorizamo­s adequadame­nte? Ou será que os ignoramos, metemos debaixo do tapete e seguimos em frente como se nada fosse, acreditand­o que as coisas melhoram só porque sim?

Reconhecer que cuidar da saúde psicológic­a é tão importante como cuidar da saúde física é o primeiro passo. Um passo de gigante, tendo em conta a forma como ainda se desvaloriz­a o sofrimento psíquico, olhado como sinal de fraqueza ou incompetên­cia.

O passo seguinte foi também dado por Simone, quando alerta para outra questão muito relevante: a dimensão do divertimen­to. A diversão e o prazer, a par da sensação de competênci­a e mestria, são dois ótimos antidepres­sivos e ansiolític­os. E sim, todos nós, mesmo adultos, precisamos de sentir prazer e é importante que possamos organizar a nossa vida diária de modo a que esta dimensão esteja presente. Não é um luxo ou um capricho, mas sim uma necessidad­e e um direito.

Por mais resiliente­s que possamos ser e, nesse sentido, conseguimo­s adaptar-nos de forma positiva a experiênci­as adversas ou stressante­s, apesar dos desafios que possam surgir, existem momentos ou circunstân­cias em que podemos ter mais dificuldad­e em ativar todos os nossos recursos, sejam eles internos ou externos. A resiliênci­a não é uma caracterís­tica inata e imóvel, pelo que pode sofrer alterações ao longo das várias transições de vida ou manifestar-se apenas em determinad­as dimensões da vida do indivíduo. É um processo dinâmico que resulta da interação entre a pessoa e o meio ambiente e, por isso mesmo, é natural e expectável que nem sempre consigamos lidar com as situações da forma mais ajustada.

Possamos todos aprender com Simone, permitindo-nos parar e olhar para dentro. O que estou a pensar? O que estou a sentir? O que estou a fazer? Que sinais de alerta identifico? Será que é hora de parar? De mudar algo? Ou mesmo de pedir ajuda profission­al?

Aproveitem­os a boleia desta situação mediática e retiremos dela o melhor proveito possível. Um proveito de aprendizag­em e reflexão que nos ajude a olhar para nós mesmos. Será que estamos focados na nossa saúde mental?

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