O fascista e o imprestável
OBrasil é presidido por um fascista. E a segunda principal figura do executivo não presta.
Não é o colunista quem o diz – só porque poderia custar um maçador processo – mas os próprios.
Sim, quem afirmou que o presidente do Brasil é fascista foi o político que não presta; e quem chamou a segunda figura do executivo de imprestável foi o chefe de Estado fascista.
“Em relação ao Bolsonaro, eu tenho muita restrição porque ele é um fascista, tem um carácter fascista. É preconceituoso. É muito fácil ir para a televisão dizer que você vai matar bandido, mas isso não é discurso para um presidente da República”, declarava o senador Ciro Nogueira, sobre Jair Bolsonaro, em 2017, à Rede Meio Norte, do Piauí, na pré-campanha das eleições presidenciais do ano seguinte.
Nogueira é, desde esta semana ministro da Casa Civil, uma espécie de primeiro-ministro do presidente “fascista”.
Na mesma pré-campanha, Bolsonaro criticava o adversário Geraldo Alckmin por ter o apoio do “centrão”, conjunto de deputados liderado por Nogueira e outros, cujo foco é parasitar o poder. “Eu quero cumprimentar o Alckmin: ele juntou a alta nata de tudo o que não presta no Brasil ao lado dele”, afirmou. Meses depois, o general Augusto Heleno, capataz de Bolsonaro, cantava em comício “se gritar pega ‘centrão’ [em vez do original ‘ladrão’], não escapa um, meu irmão”.
Bolsonaro convidou para seu braço-direito o representante de tudo o que não presta para, justificou-se, “salvar o governo”.
Fernando Henrique Cardoso, presidente de 1995 a 2002, gastou centenas de páginas das suas memórias, os Diários da Presidência, a lamentar ter sido obrigado a alimentar a rapina do “centrão” da época, para manter o seu governo de pé.
Eleito sob discurso anticorrupção, com um ano ou dois de Planalto o governo Lula já oferecia um “mensalão” para acalmar a ganância dos deputados. Confrontado com as suas incoerências, Lula disparou: “Se Jesus Cristo fosse presidente do Brasil aliava-se até com Judas.”
Dilma Rousseff decidiu enfrentar o “centrão” em posição de fraqueza – acabou traída por outro dos seus vértices, Michel Temer, e destituída sem piedade.
Mas Bolsonaro, no momento em que deu um cheque em branco a Nogueira, disse mais: “Eu também sou do ‘centrão’...”
Com efeito, ao longo dos 30 anos como parlamentar, o ex-capitão militou em nove partidos, namorou com mais uma meia dúzia, fracassou ao tentar fundar o seu e passou a maior parte do tempo da sua insignificante carreira política no Progressistas (PP), a mesma formação de Ciro Nogueira.
O PP que, diga-se de passagem, é o partido mais visado da Operação Lava-Jato – não, não é o PT, conforme se ouve além-mar de observadores desavisados. São 33 deputados e senadores investigados, entre os quais Nogueira, himself, réu no Supremo Tribunal Federal por organização criminosa, denunciado por corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução de justiça e acusado de ter recebido 7,3 milhões de reais de subornos em esquemas da construtora Odebrecht, além de 2,5 milhões de reais para assegurar o seu apoio ao impeachment de Dilma da empresa JBS.
Bolsonaro tinha, pelos vistos, razão ao chamar Nogueira de “alta nata de tudo o que não presta no Brasil”. Mas, cá entre nós, Ciro Nogueira também acertou na mosca na definição de 2017 do hoje presidente.