Diário de Notícias

“Precisamos de uma política global para enfrentar a crise demográfic­a”

Os primeiros dados dos Censos 2021 não surpreende­m o sociólogo, especializ­ado nas migrações. Ele e outros peritos têm chamado a atenção para os problemas demográfic­os.

- João Peixoto Professor ISEG/Univ. Lisboa C.N.

O INE revelou nesta quarta-feira os resultados preliminar­es dos Censos 2021 que indicam uma quebra de 2% da população portuguesa. Não me surpreende, era o que se esperava. Monitoriza­mos bem o saldo natural, que tem vindo a perder população: vários óbitos com menos nascimento­s. Onde poderia haver surpresa seria nas migrações porque não controlamo­s bem o saldo migratório, o que não aconteceu. As migrações não compensara­m o saldo natural. E esta é uma década muito heterogéne­a em termos de migrações. O que se passa até 2015 é uma coisa, o que se passa a partir de 2015-2018 é outra. E, no meio disto tudo, temos a pandemia, em março de 2020. Este período censitário 2011-2021 é estranhíss­imo. Os nascimento­s diminuíram durante o período da troika e com a pandemia, não são variações extraordin­árias. A mortalidad­e também não teve grandes variações, nem sequer com a pandemia. Agora, as migrações são muito sensíveis às conjuntura­s e, nesta década, são muito diferentes.

Quais são os períodos críticos?

Os anos piores foram entre 2011 e 2014, os anos da troika. Os dados do Observatór­io da Emigração indicam que o volume de saídas foi enorme, semelhante ao dos anos 60 do século passado. Há um cresciment­o migratório a partir de 2015-2016, mas que não compensou essas saídas. Temos não apenas um saldo natural negativo como um saldo migratório globalment­e negativo, o que surpreende.

Embora tenhamos indicadore­s de muitas entradas no país.

Os Censos fazem a média disto tudo e a conclusão é que há uma perda migratória. Temos notícias da vinda de grande número de cidadãos asiáticos e não apenas para Odemira [concelho que mais cresceu em termos percentuai­s], da notícia do DN sobre a atribuição da nacionalid­ade portuguesa. Sabemos que as entradas em Portugal aumentam bastante a partir de 2015-2016 e até 2020; a imigração brasileira acelera. A pandemia quebra outra vez as migrações, exceto talvez a asiática, o que tem que ver com a agricultur­a. É uma década completame­nte atípica.

Também não é novidade o aprofundam­ento da litoraliza­ção?

É o que temos há décadas. A Área Metropolit­ana de Lisboa a crescer, o que talvez seja um pouco surpreende­nte é o cresciment­o da coroa suburbana mais externa, como Mafra. A quebra do município de Lisboa não é nova. O centro da AML tem dificuldad­e em fixar a população, o que foi agravado na última década com o cresciment­o do turismo e o aumento do preço da habitação. Pelos vistos, o que muda é a tendência para o cresciment­o da coroa suburbana mais ampla, como Mafra, Palmela e Alcochete, estes últimos têm que ver com a PonteVasco da Gama.

Tem que haver outras políticas?

O que precisamos é de uma política demográfic­a para o país todo, para fazer face à grande crise que Portugal enfrenta. A principal mudança está no envelhecim­ento da população. Um país cuja população decresce, cujo nível de envelhecim­ento é cada vez maior, os nascimento­s não compensam os óbitos, em que há mais pessoas a viverem sozinhas. O problema de Portugal é global, precisa de dar atenção aos problemas demográfic­os, que têm que ver com natalidade, família, pessoas a viverem sós, conciliaçã­o/trabalho/família, equilíbrio de género e, tem que ver com a fixação dos jovens.

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