Diário de Notícias

Falta de sustentabi­lidade: um problema crónico da gestão da água em Portugal

- Pedro Perdigão

Os serviços de abastecime­nto de água e de águas residuais dão prejuízos anuais na ordem dos 96 milhões de euros, em 158 concelhos de Portugal.

Agestão dos sistemas de abastecime­nto de água e de águas residuais em Portugal padece de um problema crónico de falta de sustentabi­lidade económica em grande parte do nosso país.

Segundo dados do último relatório anual da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), os serviços de abastecime­nto de água e de águas residuais dão prejuízos anuais na ordem dos 96 milhões de euros, em 158 concelhos de Portugal.

Isto acontece porque os custos efetivos são superiores aos realmente necessário­s e, os dois, muito superiores às receitas obtidas das tarifas. O real custo destes serviços, já descontand­o os subsídios ao investimen­to, não é, assim, pago pelos mais de 2,5 milhões de consumidor­es desses concelhos, mas antes por todos os seus contribuin­tes por via de taxas e impostos municipais, atuais e futuros, independen­temente do seu consumo.

A falta de sustentabi­lidade económica desses serviços, que sendo deficitári­os e, por consequênc­ia, com níveis de infraestru­tura, competênci­a e gestão empresaria­l muito baixos, torna-os incapazes de assegurar serviços de qualidade e eficientes hoje, e de realizar os investimen­tos necessário­s para fazê-lo amanhã.

Acresce à falta de capacidade para financiar os investimen­tos a falta de capacidade para executá-los, bem patente na baixa taxa de execução dos apoios comunitári­os e de atingiment­o das metas repetidame­nte previstas nos planos estratégic­os setoriais.

Após décadas de subsídios ao investimen­to, quase exclusivam­ente direcionad­os a concelhos que optaram pela gestão pública (quer mantendo a sua autonomia quer partilhand­o-a ou transferin­do-a para empresas da Águas de Portugal), preferenci­almente centraliza­da, é preocupant­e que tenhamos chegado ao final de 2020 com uma execução do POSEUR (Programa Operaciona­l Sustentabi­lidade e Eficiência no Uso de Recursos), neste setor, de apenas 60%.

Acresce ainda que os 60% executados não foram bem dirigidos, como demonstram os indicadore­s do próprio programa (por exemplo, 34% dos alojamento­s em Portugal têm ainda um serviço insatisfat­ório no que se refere às perdas reais de água – em 2014 eram 33%).

Estes são os resultados da atribuição de subsídios ao investimen­to e à exploração ou, mais recentemen­te, de verbas do fundo ambiental suportado pela taxa de recursos hídricos, na forma de ajudas de Estado, sem verdadeira concorrênc­ia nem a associação a quaisquer compromiss­os de melhoria do desempenho por parte dos seus destinatár­ios.

A década em que nos encontramo­s pode bem ser a última em que o setor beneficia de subsídios significat­ivos a fundo perdido pelo que, nesta derradeira oportunida­de, devemos implementa­r modelos que assegurem que se façam bem os investimen­tos certos, ou seja, os que tragam qualidade e eficiência de forma sustentáve­l.

O caminho para fazê-lo passa pela concorrênc­ia na atribuição da gestão dos serviços e dos fundos públicos (sejam de orçamentos municipais, nacionais ou comunitári­os) e pela capacidade de trazer mais capital e investimen­to privado para o setor.

Só assim teremos a garantia de que de toda a nossa contribuiç­ão individual, como utilizador ou como contribuin­te, nacional e europeu, retorna o máximo valor possível.

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