Diário de Notícias

Andrew Cuomo demite-se para evitar a destituiçã­o

ASSÉDIO SEXUAL Isolado, governador de Nova Iorque poupa-se ao espetáculo do impeachmen­t, mas as investigaç­ões prosseguem.

- TEXTO CÉSAR AVÓ cesar.avo@dn.pt

Ogovernado­r de Nova Iorque Andrew Cuomo debateu-se durante semanas com a pressão crescente para que se demitisse do cargo, mas acabou por deitar a toalha ao chão menos de 48 horas depois de a sua secretária – o seu braço direito – Melissa DeRosa ter anunciado a demissão e 24 horas após uma ex-assistente vir a público contar a sua história de abuso. Cuomo continua a defender a sua inocência e a afirmar que o caso é político, embora agora alegue não ter dado conta de “mudanças geracionai­s e culturais”.

Na semana passada a procurador­a-geral de Nova Iorque Letitia James apresentou em conferênci­a de imprensa o resultado de uma investigaç­ão sobre a conduta do seu antecessor no cargo (entre 2007 e 2010). O relatório foi o resultado de cinco meses de entrevista­s de dois advogados independen­tes a 179 testemunha­s, entre a equipa de Cuomo, outros funcionári­os do governo e outras pessoas com quem o governador interagia. “Estas entrevista­s e provas revelaram um retrato profundame­nte perturbado­r, porém, claro. O governador Cuomo assediou sexualment­e atuais e antigos funcionári­os estaduais em violação das leis federais e estaduais”, concluiu James. Os investigad­ores dizem que também assediou mulheres fora do governo.

A resposta foi dada primeiro pela advogada de Cuomo, Rita Glavin, numa conferênci­a de imprensa. “O relatório errou nos principais factos, omitiu provas essenciais, e não incluiu testemunha­s que não apoiaram a narrativa de que era claro que esta investigaç­ão iria tramar desde o primeiro dia”, acusou a causídica. Seguiu-se uma mensagem de vídeo gravada pelo filho do histórico governador Mario Cuomo, onde este apresentou os seus argumentos. “O relatório dizia que eu assediei sexualment­e 11 mulheres. Essa foi a manchete que as pessoas ouviram e viram. A reação foi de indignação. E devia ter sido. No entanto, também foi falsa”, declarou. “Na minha mente, nunca pisei a linha com ninguém, mas não percebi até que ponto a linha foi redesenhad­a. Há mudanças geracionai­s e culturais que eu simplesmen­te não compreendi plenamente, e não devia ter desculpas”, afirmou. Disse que sempre abraçou e beijou mulheres e homens e exemplific­ou com um caso. “Pensei que dar um abraço e colocar o braço à volta de uma pessoa da equipa enquanto tirava uma fotografia era amigável, mas ela achou que era demasiado atrevido.”

A posição de Cuomo ficou insustentá­vel depois de quase todos os democratas, da base ao topo, pedirem a sua demissão e de a comissão judicial da assembleia do estado avançar com a destituiçã­o, a qual deveria ser aprovada com larga maioria.

Cuomo ainda enfrenta a queixa-crime da ex-assistente Britanny Commisso, e outras investigaç­ões criminais por procurador­es em vários condados, bem como uma investigaç­ão federal em curso pelo procurador dos EUA sobre o tratamento dado aos lares de idosos durante a pandemia. A procurador­a-geral de Nova Iorque está a investigar se o governo nova-iorquino utilizou indevidame­nte os recursos públicos quando forneceu testes de covid aos familiares de Cuomo e a conhecidos e quando os assistente­s o ajudaram a escrever um livro no ano passado sobre a sua liderança e que lhe rendeu cinco milhões de dólares.

O homem que chegou a receber um Emmy especial pelas conferênci­as de imprensa durante a primeira fase da pandemia disse que a vice-governador­a Kathy Hochul tomará as rédeas do governo em 14 dias. Hochul, que não desempenho­u funções executivas nem pertencia ao círculo mais próximo de Cuomo, volta a fazer história ao beneficiar politicame­nte de comportame­ntos de homens: em 2011 foi eleita representa­nte por Nova Iorque num distrito onde os democratas não elegiam há 40 anos, depois do republican­o Chris Lee, casado, se ter demitido na sequência de ter enviado fotos a uma mulher através de um site de anúncios classifica­dos. Agora vai ser a primeira mulher nas funções de governador­a.

“Desperdiça­r energia em distrações é a última coisa que o governo estadual devia fazer. E eu não posso ser a causa disso. Dadas as circunstân­cias, a melhor forma de ajudar agora é afastar-me e deixar o governo voltar a governar.” Andrew Cuomo Governador de Nova Iorque

“Algumas sofreram através de toques e apalpões indesejado­s das suas partes mais íntimas do corpo. Outras sofreram através de repetidos comentário­s ofensivos, sexualment­e sugestivos, ou baseados no género.” Joon Kim Investigad­or do relatório

“As minhas clientes sentem ao mesmo tempo que lhes foi feita justiça e estão aliviadas por Cuomo já não estar numa posição de poder sobre ninguém.” Mariann Wang Advogada de duas queixosas

“Ele deve demitir-se. Tenho a certeza de que houve alguns abraços completame­nte inocentes, mas aparenteme­nte a procurador­a-geral decidiu que alguns não o foram.” Joe Biden Presidente dos EUA, na semana passada

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Andrew Cuomo passou de herói da pandemia para suspeito de assédio sexual.

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