“A estabilidade” no Grande Médio Oriente
Durante muitos anos a região do Grande Médio Oriente foi passando de uma crise para outra, mudando apenas alguns dos atores principais, criando alguns novos relacionamentos, mas permanecendo sem solução. Um a um, os países procuravam sem sucesso a estabilidade e o desenvolvimento, e, por uma série de razões, nunca o conseguiram.
Os últimos acontecimentos no Afeganistão são apenas mais uma prova de que a velha crise virá sempre à tona se a solução não for criada dentro das comunidades locais, sabendo que só a paz pode trazer-lhes uma vida normal. As diferenças religiosas ou as diferenças no entendimento da religião são apenas uma ferramenta, muito útil, para dividir as sociedades, empurrá-las para pegar em armas e começar a atirar contra as outras pessoas.
Algumas das guerras tiveram todos os elementos necessários para a explosão criados dentro dos países, algumas foram trazidas de fora por potências estrangeiras que lutavam para fortalecer os seus interesses e outras tiveram as duas características. No final torna-se quase irrelevante a razão do início da luta, o que foi diferente no início em comparação com os vizinhos, porque o fim é sempre o mesmo. O país fica dividido, não só por ideologias, mas também por armas, diferentes grupos controlam diferentes regiões e as autoridades centrais tornam-se apenas um lembrete da incapacidade de unir o povo e fazê-lo entender o que é necessário para uma vida normal.
A palavra mágica é “estabilidade”. Isso significa segurança, como o primeiro pré-requisito para construir sobre ela uma sociedade livre, depois as instituições que podem funcionar livremente no controlo do Estado e do Estado de direito, igual para todos. A não identificação com todo o país, independentemente de etnias, religião, ideologia ou visão política, não pode resultar na construção de uma sociedade democrática (claro que com o respeito por todas as diferenças), baseada nos mesmos padrões em todo o mundo. No caso do Grande Médio Oriente, as coisas são diferentes. Sempre houve alguns regimes autoritários, que foram capazes de criar a “estabilidade” segundo os seus próprios termos, incluindo a segurança (se a pessoa não estivesse na oposição ao regime). Em alguns casos, esses regimes tornaram-se uma ameaça para os seus vizinhos (Iraque de Saddam Hussein) e as potências estrangeiras decidiram substituí-los. Noutros casos, a população local começou a opor-se ao regime (Síria, Líbia), mas era demasiado fraca para conseguir mudá-lo. As potências estrangeiras viram aí a sua oportunidade de intervir na esperança de estabelecer governos “amigáveis” de acordo com os seus próprios interesses. O problema era se houvesse mais de uma potência estrangeira a tentar fazer o mesmo, mas com diferentes atores locais (novamente a Síria). No caso de outros (Líbano), as guerras civis duradouras e as diferenças étnicas e religiosas que produziram instabilidade fizeram com que as consequências da pandemia da covid-19 para as economias locais fossem quase o último golpe para empurrar o país para outra catástrofe.
A estabilidade perdeu o seu significado em grande escala. Ele foi totalmente dividido nas diferentes “estabilidades” das regiões com os diferentes provedores. Esses países já não estão unidos e não há hipótese de que o estejam num futuro próximo. Cada estabilidade a nível do país não pode ser estabelecida pela força militar das potências estrangeiras. Elas chegariam como libertadores e aos poucos mudariam o seu papel para ocupantes, antes de finalmente decidirem voltar para casa, apagando qualquer responsabilidade pelas consequências de todo o assunto.
É sabido que se se desmontar qualquer sistema de segurança de um país sem construir um novo, baseado nos poderes locais, que cobriria todo o país, o fracasso está assegurado. É bem possível que toda a ideia de “libertar” outras pessoas fosse errada e inviável desde o início, baseando-se apenas no poder estrangeiro e erroneamente aconselhado pelos políticos locais, tentando viver à sombra da força da grande potência.
O que ficou para trás é óbvio na comunicação social. Esses países estão divididos, incapazes de funcionar como uma entidade, não há segurança. Assim, não há investimentos, não há democracia, há apenas o custo do equipamento militar, dos salários dos soldados e dos seus treinadores estrangeiros.
O conceito está, obviamente, errado.
As diferenças religiosas ou as diferenças no entendimento da religião são apenas uma ferramenta, muito útil, para dividir as sociedades, empurrá-las para pegar em armas e começar a atirar contra as outras pessoas.