Nicole Kidman “Ao sair de Nine Perfect Strangers fiquei mais enriquecida”
Conversa-flash com Nicole Kidman, na Austrália. A atriz falou da sua participação nesta série, mas não se esqueceu de Kubrick nem de filosofar sobre os processos curativos da representação.
Continua a ser a atriz de lista A mais trabalhadora em Hollywood. Nicole Kidman não para, é um furação. E tem ainda tempo para uma entrevista via Zoom de cinco minutos para promover a série do momento, Nine Perfect Strangers. Está na Austrália e pela imagem da janela que vemos está impecavelmente maquilhada e penteada. Ao seu lado está Asher Keddie, atriz australiana que é uma das personagens centrais desta ficção. Estão ambas esfuziantes e bem-dispostas, mal percebem que estou em Portugal dizem arrebitadamente que adoravam estar cá ....
“Aqui, nesta série, a Nicole Kidman diz que é especialista em sofrer e curar-se. Creio que tal é algo que se aplica ao nosso trabalho de ator. O que é comovente nisto de representar é a tentativa de encontrar uma verdade. E é isso que motiva um ator, embora dependa sempre do papel e de quanto investimos mentalmente nele. Em Nine Percect Strangers tivemos um envolvimento psicológico gigante. Quando acabámos de filmar, não foi fácil largar as personagens”, começa por dizer Asher. “Somos atores que estamos numa posição que nos permite examinar esta nossa viagem pela vida , a cabeça humana e a maneira como interagimos. Ser ator é a possibilidade de navegar por diversas vidas. Como atores, temos a possibilidade de ver tudo isso através de prismas muito diferentes. Isso é fantástico, pois possivelmente dá-nos a capacidade de um maior entendimento da nossa existência. Pelo menos comigo, é assim. Esta profissão tem-me permitido explorar tantos temas ao lado de algumas das maiores mentes mundiais. Refiro-me, claro, a todos esses argumentistas e realizadores com os quais trabalhamos! Aliás, até os chamo filósofos do nosso tempo”, prossegue Nicole Kidman, que vai dizendo que depois de todas essas experiências se sente cada vez mais curada.
A dada altura, volta a falar de superação: “Asher, acho que nós, atores, acabamos por nunca sermos capazes de nos curar por completo, não achas?” A colega responde: “Tens razão, mas somos banhados por gratidão depois de um papel numa série como esta, por muito que seja um processo doloroso ou algo do género”. “Senti que ao sair de Nine Perfect Strangers fiquei mais enriquecida, com uma nova visão e com a minha curiosidade expandida. O meu ponto de vista pode ser mudado...”, riposta Nic e logo a seguir dá o exemplo de De Olhos Bem Fechados: “Quando trabalhei com Stanley Kubrick, percebi que ele era capaz de estar sempre a fazer-me mudar a minha opinião sobre este ou aquele assunto. Lembro-me de discutir com ele e depois, passadas umas 12 horas , voltar e admitir que, afinal, não tinha razão. Ele era incrível...”
Já com o cronómetro no vermelho, pergunto a Nicole se agora é mais fácil encontrar os melhores papéis na televisão. A resposta vem com calma: “Não sei se é mais fácil, mas não há dúvida de que agora há uma paisagem na ficção televisiva que permite muitas oportunidades para os atores, mas também para os realizadores e argumentistas. Antes, se os teus filmes fizessem dinheiro, poderias ter uma carreira – agora já não é bem assim. As séries não vivem dos números das bilheteiras e não há a pressão dos prémios ou de colocar o filme num festival... Estas séries permitem descobertas, é um pouco o que se passava antes com o cinema, quando havia tempo para as salas manterem o filme para ser descoberto. Lembro-me de que foi assim que
Bonnie & Clyde foi descoberto. Muitos filmes só eram notados mais tarde. Agora isso mudou, é impossível um filme poder ter tempo para ser descoberto. Enfim, no cinema vivemos a era dos filmes de super-heróis e só ocasionalmente acontece um fenómeno como Parasitas. Felizmente, agora a televisão e as plataformas conseguem fazer com que as pessoas tenham tempo para descobrir o que querem ver. E é muito bom poder ter essa oportunidade.”
“Agora há uma paisagem na ficção televisiva que permite muitas oportunidades para os atores, mas também para os realizadores e argumentistas. Antes, se os teus filmes fizessem dinheiro, poderias ter uma carreira, agora já não é bem assim.”
Nicole Kidman