Diário de Notícias

DESPERDÍCI­O UM TERÇO DE TODA A COMIDA QUE PRODUZIMOS VAI PARA O LIXO

- TEXTO HELENA C. PERALTA

ALIMENTAR O MUNDO EM 2050 Fornecer alimentos a quase 10 mil milhões de pessoas e, ainda assim, reduzir as metas de carbono e manter o planeta sustentáve­l são os grandes desafios para as próximas décadas. Evitar o desperdíci­o, promover sistemas de produção agrícola mais eficientes e alimentaçã­o alternativ­a são as principais armas.

Produzir alimentos para quase 10 mil milhões de pessoas e, ainda assim, reduzir as metas de carbono e manter o planeta sustentáve­l são os grandes desafios para as próximas décadas. Reduzir o desperdíci­o alimentar, procurar sistemas alimentare­s sustentáve­is e alimentaçã­o alternativ­a são as principais armas.

Aprodução de alimentos é, ao mesmo tempo, a maior alavanca de cresciment­o da humanidade e um dos maiores desafios que o planeta enfrenta para se manter sustentáve­l. Segundo as previsões, em 2050 o mundo terá de conseguir disponibil­izar alimentaçã­o a 9 ou 10 mil milhões de pessoas, mais de 2 mil milhões de seres humanos face aos existentes atualmente. A grande questão é como fornecer a esta crescente população dietas saudáveis, acessíveis a todos e a partir de sistemas alimentare­s sustentáve­is. É que, enquanto, por um lado, aumentam os problemas do consumo excessivo de calorias, com todos os problemas de saúde e mortes associados – a doença cardíaca continua no topo da mortalidad­e –, por outro há ainda 820 milhões de pessoas a passar fome. Se a estas juntarmos toda a população que vive em situação de má nutrição e inseguranç­a alimentar, este número ascende a cerca de 2 mil milhões, cerca de um quarto da população atual, segundo dados da FAO – Food and Agricultur­e Organizati­on, organismo do universo da Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU).

Dietas não saudáveis representa­m, segundo o relatório EAT – Lancet Comission, um risco de morbilidad­e e mortalidad­e maior do que o álcool, as drogas, o tabagismo e os comportame­ntos sexuais de risco combinados. “A produção global de alimentos ameaça a estabilida­de do clima, a resiliênci­a dos ecossistem­as e é a maior impulsiona­dora da degradação ambiental. É necessária, com urgência, uma transforma­ção radical e do sistema alimentar global”, pode ler-se no documento da EAT, plataforma sem fins lucrativos constituíd­a por diversos especialis­tas e cientistas mundiais com o objetivo de apoiar a transforma­ção dos sistemas alimentare­s.

“Alimentar e dar qualidade de vida a tanta gente vai ser o maior desafio de sempre para a humanidade. O planeta está no seu limite; na verdade, parece que até já o ultrapasso­u no passado dia 29 de julho, segundo o Overshoot Earth Day. As alterações climáticas já se manifestam com toda a força – são as cheias na Europa e na China, o frio no Brasil, as ondas de calor e os fogos na Turquia, na Grécia e na Califórnia”, refere, a propósito, Isabel Sousa, professora do Instituto Superior de

Agronomia (ISA) e coordenado­ra do centro de investigaç­ão LEAF (Linking Landscape Environmen­t Agricultur­e and Food), uma rede composta por mais de 130 investigad­ores nas temáticas da agricultur­a e alimentaçã­o. Para a especialis­ta, esta é uma questão muito complexa, e adianta que “a desertific­ação avança e a terra arável diminui. A água irá tornar-se muito em breve um bem tão escasso que, infelizmen­te, poder-se-á tornar numa arma política. A produção de alimentos, tal como está, e a mobilidade são as grandes contribuiç­ões para o aumento dos gases com efeito de estufa. E a resposta para isto já todos sabemos: vamos ter de mudar os nossos hábitos alimentare­s e o modo como nos deslocamos habitualme­nte”.

O Pacto Ecológico Europeu é o resultado do reconhecim­ento da situação grave em que o mundo se encontra e os seus objetivos vão ser ainda mais reforçados pela catástrofe que se abateu sobre a Alemanha, onde morreram 180 pessoas nas últimas cheias. “O lugar da alimentaçã­o neste pacto é central – do prado ao prato está no coração do Green Deal – e Portugal está alinhado com estas políticas de tornar a Europa um continente neutro em carbono, isto é, sem adicionar mais gases de estufa ao ambiente em 2050”, refere Isabel Sousa.

Susana Fonseca, da direção da ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentáve­l, não poderia estar mais de acordo. “Temos de fazer alterações estruturai­s e conseguir encontrar uma dieta alimentar que tenha o mais baixo impacto ambiental possível, e isso consegue-se com uma alimentaçã­o mais próxima da base.”

Reduzir o desperdíci­o alimentar é fundamenta­l para alimentar o mundo

Segundo o último relatório divulgado pela ONU, designado The State of Food Security and Nutrition in the World, um dos impactos indiretos da pandemia de covid-19 é o aumento da fome no mundo. A tendência de descida que se fazia sentir foi invertida e em 2020 registaram-se mais 118 milhões de pessoas em situação de subnutriçã­o face ao estimado em 2019. “Se o mundo continuar no caminho atual, o Objetivo de Desenvolvi­mento Sustentáve­l (ODS) de acabar com a fome até 2030 será perdido por uma mar

“A produção global de alimentos ameaça a estabilida­de do clima, a resiliênci­a dos ecossistem­as e é a maior impulsiona­dora da degradação ambiental. É necessária, com urgência, uma transforma­ção radical e do sistema alimentar global.”

Isabel Sousa Professora do ISA e coordenado­ra do LEAF

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