PAULO RANGEL LIMPA CAMINHO PARA A LIDERANÇA DO PSD
O eurodeputado foi ontem ao Alta Definição, da SIC, fazer o seu coming out. Se conquistar o PSD, Portugal terá pela primeira vez, nas próximas legislativas, um candidato a primeiro-ministro assumidamente homossexual.
Apontado cada vez mais para suceder a Rio, eurodeputado revelou a sua orientação sexual num programa de televisão. Se chegar a líder social-democrata, Portugal terá pela primeira vez nas legislativas um candidato a primeiro-ministro assumidamente homossexual
Pondera candidatar-se a líder do PSD? “Não digo desta água não beberei.” E ser primeiro-ministro? “Não enjeito.” O eurodeputado do PSD Paulo Rangel deu ontem mais alguns passos em prol das suas ambições políticas, numa entrevista ao programa “Alta Definição”, da SIC. Entrevista do género intimista – a chamada entrevista de vida –, onde procurou, acima de tudo, retirar pretextos para o desenvolvimento daquilo que o próprio qualificou como uma “campanha negra” que contra si se tem vindo a desenvolver nas últimas semanas.
Rangel desminou o caminho fazendo na entrevista o seu coming out sexual – assumindo publicamente que é homossexual. “Não é problema nenhum, é uma coisa que nunca escondi.”
Contudo, na verdade foi sempre um segredo – conforme aliás assumiu – para os seus pais, ambos já falecidos (o pai em 2014 e a mãe em 2019), porque “temos de proteger um pouco as nossas famílias” e “essas pessoas não têm de ser objeto deste escrutínio”.
De facto, segundo disse, se a sua mãe não tivesse já falecido não estaria agora a, como se diz, sair do armário: “Esta conversa nunca teria se ela fosse viva.”
Paulo Rangel contou na entrevista que foi vivendo a descoberta da sua sexualidade como um “processo natural” e “gradual” que incluiu “descoberta”, “recusa” e também “alguma ignorância”. Depois, aos 32/33 anos, “as coisas pacificaram-se”. E o facto de ser um cristão profundo não foi um obstáculo: “Deus gosta de nós como nós somos”, “não está assim tão interessado no que se passa dentro do quarto de cada um” e “Jesus nunca faria qualquer discriminação”.
Explicitamente, o eurodeputado acondicionou a necessidade de fazer este coming out na necessidade de prevenir futuras e eventuais notícias explorando questões da sua vida privada. “Agora ando aí a ser alvo de umas campanhas negras por causa da minha orientação sexual”, disse – mas sem referir uma capa recente do semanário Tal & Qual onde a manchete era “Eles querem ver Rangel a sair do armário”.
Na tal suposta campanha negra também enquadrou a recente divulgação online de um vídeo – que diz já ter uns cinco ou seis anos – onde a aparece a caminhar embriagado numa rua de Bruxelas. Foi, segundo disse, uma “tentativa de enfraquecimento político” mas quem ao certo o colocou na net não sabe: “Não tenho vocação para detetive privado.”
Uma eventual candidatura de Paulo Rangel à liderança do partido, já no próximo congresso do partido, no início de 2022, está dependente, evidentemente, do resultado do PSD nas eleições autárquicas.
O partido parte para estas eleições com uma enorme desvantagem face ao PS – cerca de 60 presidências de câmaras a menos, num total de 308 – e por isso não será admirar que cresça um pouco. O que falta saber é se será um crescimento “poucochinho” (como um dia António Costa qualificou uma vitória do PS de António José Seguro numas europeias)
ou mais substantivo. E importante será também para Rangel perceber se enfrentará ou não uma recandidatura de Rui Rio à liderança, sabendo-se que Rio detém atualmente um enorme controlo sobre o aparelho partidário. Seja como for, embora eurodeputado, o eurodeputado tem mantido contacto permanente com as estruturas do partido, nomeadamente aceitando vários convites para apresentações de candidaturas autárquicas.
E lá fora?
Como o futuro se desenvolverá não se sabe. “Tenho muitos sonhos mas faço muito poucos planos”, disse ontem Rangel, na entrevista à SIC.
O que já se sabe é que, em Belém, há um observador atento da evolução da situação interna no PSD (e no PS). Marcelo Rebelo de Sousa acha muito provável que o eurodeputado venha a ser o candidato do partido a primeiro-ministro nas legislativas de 2023, enfrentando, pelo lado do PS, Pedro Nuno Santos (para o Presidente da República é altamente improvável que António Costa se recandidate a um terceiro mandato).
O que talvez não contasse é que, confirmando-se este cenário, Portugal terá nessas eleições, pela primeira vez, um homossexual assumido candidatando-se à chefia do Governo.
No espaço europeu isso já não será propriamente uma novidade. O primeiro-ministro do Luxemburgo, Xavier Bettel, é não só gay assumido como casado com outro homem.
Já na Irlanda, o Governo foi chefiado de 2017 a 2020 por Leo Varadkar, que tornou pública a sua orientação sexual numa entrevista em 2015.
Na Bélgica, Elio Di Rupo, ex-primeiro-ministro, assumiu-se em 1996, tendo falado sempre abertamente sobre o tema. Doutorado em Química, assumiu o cargo em 2011, aos 60 anos, e exerceu funções até 2014.
Já pelas Américas, a democrata Tammy Baldwin tornou-se em 2012 a primeira senadora homossexual assumida nos Estados Unidos, ao vencer o republicano Tommy Thomson, ex-secretário de Saúde na Presidência de George W. Bush.
No Peru, em 2014, o ex-ministro da Presidência Carlos Ricardo Bruce assumiu-se gay e “orgulhoso de o ser”. No Brasil, em julho passado, Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, fez o mesmo. Diz-se que, em 2022, poderá ser candidato a Presidente da República, pelo PSDB.