Resultado das autárquicas pode refletir-se na AR? “Não é expectável”
Deputados regressam aos trabalhos a meio gás, devido às autárquicas. Desfecho das eleições locais não deverá repercutir-se nos dossiers parlamentares, a começar pelo OE2022, defendem politólogos.
“É expectável que o PS consiga passar este orçamento. Não é do interesse nem do PCP, nem do BE provocar uma crise. O passado já nos disse alguma coisa sobre isso”, diz António Costa Pinto.
Os deputados retomam esta semana a agenda parlamentar, numa sessão legislativa que começa a meio gás e que, daqui a cerca de semana e meia interrompe novamente os trabalhos para dar espaço à campanha eleitoral para as autárquicas. No regresso, haverá mais duas semanas de sessões plenárias, após o que terá início o processo de discussão do Orçamento do Estado para 2022. Mas, pelo meio, muito pode mudar na política portuguesa.
Que interferência podem ter as eleições autárquicas no hemiciclo de São Bento? Para António Costa Pinto, investigador coordenador no Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa, “não é expectável” que o resultado das eleições locais venha a provocar alterações significativas no quadro parlamentar, no imediato. Não é o mesmo que não ter efeito nenhum: o desfecho das autárquicas pode levar a uma maior polarização no Parlamento, quer à esquerda, quer à direita, mas sem que isso represente qualquer perigo de rutura. “Perante algum declínio autárquico do PCP pode haver uma maior polarização com o Governo, mas, globalmente, não é de prever que ameace o Orçamento”, antecipa o politólogo. Para António Costa Pinto, com mais ou menos braço de ferro à esquerda, o OE2022 acabará por passar com a abstenção do PCP, do Bloco de Esquerda, ou de ambos – “É expectável que o PS consiga passar este orçamento. Não é do interesse nem do PCP, nem do Bloco de Esquerda, provocar uma crise. O passado já nos disse alguma coisa sobre isso”.
Paula do Espírito Santo, investigadora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa, também defende que, qualquer que seja o desfecho das eleições de 26 de setembro, não haverá repercussões sobre o mais importante dossier que se segue. Nem mesmo num quadro de aprofundamento dos resultados de 2017, em que o PCP perdeu dez câmaras, a esmagadora maioria delas para o PS. A investigadora não vê “grande motivo para o PCP mudar muito a sua relação com o Governo” – “O PCP não vai querer deslocar-se para fora deste xadrez político em que vai dando cartas. Não acredito que haja um voltar de costas”.
E à direita? António Costa Pinto acredita que “se o PSD iniciar um período de desafio ao líder até janeiro” (quando haverá eleições internas entre os sociais-democratas) a bancada parlamentar tenderá a refletir esse contexto e a “polarizar” posições com os socialistas. Quanto aos pequenos partidos da direita, dificilmente estas eleições trarão grandes novidades à Iniciativa Liberal. Já para o Chega será “um teste à estrutura nacional” do partido.
“Vamos perceber se o partido vai além de André Ventura ou não”, defende, por seu lado, Paula do Espírito Santo, mas sublinhando que as eleições autárquicas “dão um espaço relativamente limitado às forças políticas mais pequenas”.
Recomeço a meio-gás
Já hoje, a conferência de líderes reúne para marcar os primeiros agendamentos da terceira sessão legislativa, que marca o virar de página para a segunda metade da legislatura. As sessões plenárias são retomadas na quarta-feira da próxima semana, repetindo-se nos dois dias seguintes, mas é previsível que estes plenários iniciais sejam sobretudo dedicados a declarações políticas, projetos de resolução e petições, deixando as matérias de primeira linha para depois das autárquicas - até porque nesta altura há um número considerável de deputados que se apresentam como candidatos às eleições locais.
Para sexta-feira da próxima semana está marcada a eleição de quatro candidatos a juízes do Tribunal Constitucional, uma votação que esteve marcada para julho, mas acabou adiada dado estarem então mais de duas dezenas de deputados em isolamento profilático.
Após a interrupção, na semana anterior às autárquicas, o Parlamento voltará à agenda normal de trabalhos, mas por pouco tempo. Em lista de espera para votação estão temas como a despenalização da morte medicamente assistida que não deverá avançar já –, a Lei de Bases do Clima, a inseminação pós-morte ou a gestação de substituição.
Entre os dossiers que vão ocupar o Parlamento nestes primeiros meses da sessão legislativa conta-se o teletrabalho: há dez projetos de lei na especialidade (onde as propostas são trabalhadas ponto a ponto), versando questões como o direito à desconexão ou o pagamento dos custos associados ao teletrabalho. Também o pacote de medidas contra a corrupção conta mais de duas dezenas de propostas, entre as quais se contam vários projetos de lei sobre enriquecimento ilícito.