Há Algarve além das praias
OAlgarve não cabe todo no binómio de “sol e praia”. Há uma outra face do Algarve que não oferece a singularidade das praias mediterrânicas mas que tem um papel preponderante na oferta turística da região, conferindo-lhe os sabores, os saberes, as paisagens, os perfumes da serra, igualmente únicos.
Ao longo dos anos, a aposta manifesta e essencialmente dirigida àquele binómio, descurando as potencialidades e a complementaridade que a serra traria para o reforço da oferta turística, contribuiu para acentuar fenómenos inerentes à interioridade, incompreensíveis para um contexto em que esta dista pouco mais de duas dezenas de quilómetros daquelas praias, como é o caso do ponto mais alto do Algarve, a Foia, a 902 metros de altitude, no concelho de Monchique.
Monchique é um concelho algarvio cuja sede fica a 80 km do aeroporto internacional de Faro, a 20 km da A 22 –Via do Infante, a 25 km das praias do Sul e da CostaVicentina. A posição geográfica e a orografia atribuem a Monchique uma condição singular que não pode traduzir-se nos efeitos nefastos da problemática de interioridade, mas sim evidenciar a potencialidade decorrente de tal posicionamento estratégico, de onde se avista todo o Algarve e grande parte do Baixo Alentejo.
É, portanto, imperativo sensibilizar todos para este momento crítico em que vivemos, no qual somos convocados a tomar uma de duas decisões: ou se aceita o envelhecimento populacional, o despovoamento e, consequentemente, o abandono do território como uma fatalidade inamovível, ou, em alternativa, se reúnem esforços para suscitar um novo paradigma, através do qual se inverta este declínio.
Atualmente impendem sobre o território tantas regras que condicionam o uso e que, fruto da incapacidade de fiscalização por parte das autarquias, têm um efeito adverso, pois que acabam por ter uma utilização não regulada e desconforme.
O estabelecimento de regras nas operações urbanísticas é da mais elementar razoabilidade, porquanto nelas assentam boas práticas de construção, dotar os espaços de um mínimo de condições de habitabilidade e sobretudo critérios de proteção das pessoas na sua utilização, bem como o respeito por valores culturais e ambientais. Que a ocupação do solo deve ter critério até numa perspetiva da sustentabilidade, da preservação e recuperação da paisagem e da preservação de espécies da flora e fauna daqui também não resulta nenhuma oposição, nem pode resultar. Porém, não podemos descurar que as edificações, particularmente as dispersas, existentes na serra, até meados do século passado não dispunham de áreas que hoje permitam, numa reconstrução ou beneficiação, dotá-las de condições essenciais, como seja uma casa de banho ou uma cozinha e áreas condignas. Não podemos, portanto, permitir conceber que seja possível repovoar ou manter o povoamento nos territórios do interior sem lhes conferirmos um mínimo de habitabilidade nos seus alojamentos. Vale isto dizer que não podemos vedar aos cidadãos que optam por viver na serra ou que a ela ficam confinados que se vejam na circunstância de viver em edificações obsoletas ou sem condições de habitabilidade ou terem que optar por outras soluções e por outras direções.
É crucial indagar como se evita o êxodo de residentes, como se gere um território que ano após ano perde população, e também perceber que quanto menor for a presença no território maior é a vulnerabilidade a incêndios, por exemplo.
O planeamento, o ordenamento e a gestão do território não podem reservar em si um conjunto de constrangimentos que empurra as pessoas para o litoral, mas sim devem constituir verdadeiros instrumentos estratégicos que permitam valorizar o potencial local, fixar pessoas, garantir-lhes condições de vida saudável, e, por conseguinte, o desenvolvimento sustentável.
Monchique é um território rico naquilo que é essencial à vida: ar puro respirável e água, elementos cuja importância se repercute em toda a região, razão pela qual o momento em que vivemos nos convoca a todos, monchiquenses, algarvios e portugueses, para redefinirmos um novo paradigma de gestão territorial.