João Almeida brilha e sobe ao segundo lugar do Giro
VOLTA À ITÁLIA O ciclista português cortou a meta da nona etapa no quinto lugar e está agora a apenas 12 segundos do camisola rosa.
João Almeida, da UAE Emirates, subiu ontem ao segundo lugar da classificação geral da Volta à Itália em bicicleta, que é liderada pelo espanhol Juan Pedro López (Trek-Segafredo). O ciclista português terminou em quinto lugar a nona e difícil etapa, entre Isernia e Blockhaus, na distância de 191 quilómetros e mostrou que está em grande forma, alimentando, por isso, esperanças de conquistar uma das mais importantes provas do ciclismo mundial.
O atleta de A-dos-Francos integrou um grupo de cinco ciclistas que chegaram isolados e ficou, depois, à espera que López chegasse para saber se vestiria ou não a camisola rosa. O espanhol gastou mais 1,46 minutos que as 5:34.44 horas de João Almeida, que ficou então ficou a saber que apenas por 12 segundos não se tornou líder da classificação geral, repetindo o feito de 2020, quando vestiu a camisola rosa durante 15 etapas.
A nona etapa acabou ter como vencedor o australiano Jai Hindley (BORA-hansgrohe), mas o ciclista português cortou a meta com o mesmo tempo, num grupo onde estavam também o francês Romani Bardet (DSM), o equatoriano Richard Carapaz (INEOS) e o espanhol Mikel Landa (Bahrain-Victorious). Mas a verdade é que ficou bem posicionado para lutar pelo Giro, embora as diferenças na classificação geral sejam ainda muito curtas: 14 segundos para o terceiro, Romain Bardet; 15 para Carapaz ; e 20 para o australiano Jai Hindley (Bora-Hansgrohe).
Sofrimento, luta e felicidade
No final da etapa, João Almeida admitiu ter sofrido muito, pois começou o dia a não se sentir bem, mas acabou feliz, com a subida à segunda posição, no topo do Blockhaus. “Não me estava a sentir bem e não sabia se conseguiria acompanhar os da frente. Não sabia se teria pernas. Lutei para não perder muito tempo e acabei por ser feliz”, afirmou o ciclista de 23 anos, admitindo que repetir ou melhorar o quarto lugar do Giro de 2020 “está em cima da mesa”. “Estou feliz porque hoje pude acabar com eles”, sublinhou.
Na abordagem à subida ao
Blockhaus, nos últimos 10 quilómetros da etapa, a INEOS, com Richie Porte à cabeça, liderou o primeiro grupo, até ao ataque de Carapaz, Bardet e Landa, que parecia derrubar João Almeida. Só que, até à chegada, o ciclista português recuperou
o contacto com este grupo, que disputou a vitória na etapa ao sprint, com a celebração do australiano Jai Hindley.
“Foi duro no início, sofri, mas foi um bom final. Senti que não estava com as melhores pernas. Foi o que foi, tive de sofrer, meter um ritmo inteligente e aguentar”, explicou João Almeida, que se mostra determinado para as 12 etapas que restam para o fim do Giro. “Todos temos dias maus, não tive assim tão boas pernas hoje, talvez como os outros, mas penso que continuamos todos na corrida”, rematou o português.
Hoje, o pelotão da 105.ª edição do Giro de Itália vai beneficiar do segundo dia de descanso da corrida, antes de enfrentar os 196 quilómetros da 10.ª etapa, entre Pescara e Jesi, num percurso praticamente plano, apenas com duas contagens de montanha de quarta categoria. *Com LUSA
“Não me estava a sentir bem e não sabia se conseguiria acompanhar os da frente. Não sabia se teria pernas. Lutei para não perder muito tempo e acabei por ser feliz” João Almeida Ciclista português
1987: o estudo e tradução das canções medievais ibéricas para uma antologia da poesia galaico-portuguesa. Formado em Letras pela Universidade da Virgínia, conhece durante a estada no Brasil, e depois em Lisboa, a obra de Pessoa através das edições da Ática, como foi o caso do Livro do Desassossego. Atraído por esta obra, decide traduzi-la na íntegra para o inglês, sendo a biografia que agora lança um resultado direto desse início: “Todo esse trabalho que reunia textos biográficos e inéditos mais não era do que uma antecipação desta biografia”. Que, mais tarde, lhe era solicitada pelo seu agente literário nova-iorquino: “Achei que ia demorar uns três anos a escrever as 160 mil palavras encomendadas”. Esse total, milhares de vezes multiplicado, só chegou aos leitores no ano passado: “Nunca imaginei que me levasse tantos anos.” Diga-se que a prometida biografia de Richard Zenith sobre Fernando Pessoa já era um mito do meio literário português e muitos consideravam que nunca viria a ser publicada.
Aprendizagem da arte biográfica
O principal problema para a escrita foi, explica Zenith, o facto de nunca ter feito uma biografia: “A narrativa exige muito trabalho e como jamais escrevera uma biografia foi necessária uma aprendizagem.” Primeiro, “reunir os factos”, depois “relacionar as várias facetas”, em seguida “revelar quem era Pessoa”, ou seja, “era preciso contar uma história e não o fazer sob a forma de um romance”.
Daí que numa primeira fase tenha tentado escrever na primeira pessoa: “Como uma autobiografia, como se Pessoa estivesse a lembrar-se da sua vida.” Com o andamento, logo concluiu que não seria a melhor maneira ou até possível: “Não fui capaz de avançar dessa forma!”. Só ao encontrar a versão que agora oferece aos leitores é que seguiu em frente: “E assim foi crescendo a biografia, ficando muito além do que imaginava, o que fez com que tivesse sido obrigado a cortar muito do texto final.”
Chegado ao fim, Richard Zenith considera que ficou “a conhecer melhor Fernando Pessoa”. Que tipo de relação foi criando com o biografado foi uma das questões levantadas: “A minha relação transformou-se numa espécie de psicanalista. O livro não é psicanálise, aviso, mas, [tal]como o psicanalista faz, ouvi-o para o tentar compreender.” Foi o suficiente? “Não pretendo ter percebido Pessoa por inteiro, porque nem a mim me percebo. O que tentei foi pôr lá todos os elementos que tinha de modo a que os leitores o percebam. Em poucas palavras: foi uma convivência a dois”, garante.
Ao fim de 1183 páginas ainda há sombras na vida de Pessoa por esclarecer ou fica o retrato inteiro? “Fernando Pessoa será sempre um mistério. Da convivência com ele,
Richard Zenith fez uma primeira apresentação da biografia de Fernando Pessoa na Cinemateca, com o cartaz de um antigo filme, tentei entender como ele se sentiria no dia a dia. Apesar do que se pensa, o poeta era um ser social, a quem não faltavam as tertúlias nos cafés ou sempre um sentido de humor. No entanto, desde criança que era tímido e é na escrita que se revela, e esse é o lugar onde há muito Pessoa”, refere.
Quanto às dificuldades para elaborar esta biografia não deixa de revelar que “foram muitas”. Enuncia: “Principalmente devido ao seu interesse nos assuntos espirituais – no meu caso não me sinto atraído pelo oculto –, mas essa é a praia dele. E nessa zona ainda existem muitos apontamentos inéditos. Não são textos completos e pouco sentido fazem para o leitor, contudo interessam bastante ao investigador. Nessa grande série de apontamentos tentei perceber as razões do seu interesse, no que acreditava ou não. Ele interessava-se pela religião e o que eu queria era ter a sensação do que representavam realmente esses assuntos difíceis. Não é fácil, até porque Pessoa nunca está quieto e passa constantemente de uma coisa para outra.” Uma ideia que está logo explicitada na introdução: “Pessoa foi essencialmente um produto do seu tempo e da sua geografia. Interessado no mundo visível que habitava, Pessoa sentia-se ainda mais atraído pela realidade invisível.”
No que respeita às fontes para esta biografia, Zenith destaca a própria obra: “É a parte mais importante, porque além de ser muito autobiográfica, os seus sentimentos sur
gem. É preciso perceber que ele está sempre a mudar, aquilo que se sabe: é um fingidor. Não fica nenhuma dúvida de que Pessoa usa a sua vida em prol da obra. O espólio também foi importante, desde o que se conhece do seu quotidiano, o conteúdo da correspondência – mesmo das muitas cartas que não envia, e são bastantes –, dos seus encontros com outras pessoas, e das memórias de Durban.”
No caso desta cidade sul-africana, Zenith teve acesso a muitas cartas trocadas com a mãe do poeta: “Tive acesso a cartas inéditas trocadas entre a mãe e o filho. Ela enviava uma carta semanal, das quais nem todas ficaram, e fê-lo durante muitos anos. Nem tudo o que lá está é interessante, mas existem pormenores importantes. E há as que tratam das gripes – ele era muito suscetível a gripes – e foi infetado pela gripe espanhola, não de uma forma fatal, e ultrapassou a doença.”
Existem ainda outras fontes: “Artigos e várias entrevistas então publicadas, bem como depoimentos de quem, não o tendo conhecido diretamente, não deixava de ter informações muito curiosas de conhecidos de ambos.” A que se podem acrescentar muitos outros testemunhos de contemporâneos, como foi o caso de Almada Negreiros, entre outros.
Richard Zenith também esclareceu a ligação do poeta ao tio Cunha: “Já a familiar Manuela Nogueira tinha publicado duas cartas entre eles e entendi melhor a relação diferente que existiu. Interessante é que João Gaspar Simões dava uma ideia de que o tio era analfabeto e descobri que não era assim. Tanto que Pessoa e o tio brincavam a criar personagens.
Quanto a novidades entre esta biografia e a anterior, de 1950, Richard Zenith garante que não faltam: “Contém muitas novas informações sobre a infância e a juventude do poeta – não precisamos de ser freudianos para valorizar essa época da vida – e temos um outro retrato dessa parte da sua vida.” Além do esforço de contextualização, pergunta-se se existem também outras interpretações, sobre a sexualidade, por exemplo. Garante: “Há novas informações sobre isso e muito mais”.
Omês de maio está a ser farto em festivais literários. Desde o mais a sul, no Redondo, ao mais a norte, em Sabrosa, passando pela 10ª edição de Livros a Oeste, na Lourinhã, e o do 5L, de Lisboa – ainda falta o de Bragança, no fim do mês. No último fim de semana foi a vez da 16.ª edição do Literatura em Viagem (LeV ), em Matosinhos, no qual Frederico Lourenço abriu a programação com o relançamento de três livros de ficção publicados há duas décadas num só volume, Pode um desejo imenso. “Um regresso pacífico a livros que tinham sido muito polémicos à data da saída, devido a temáticas gay e camoniana”, referiu. Entre os autores estrangeiros o destaque vai para Benjamin Moser, que teve recentemente a sua biografia sobre Susan Sontag traduzida em língua portuguesa. A fechar esteve Alberto Manguel numa entrevista de vida. Leia abaixo a opinião de quem participou nestes eventos:
“Conversar com Alberto Manguel é sempre uma viagem de descoberta de livros, de autores, de lugares. Manguel não é só um dos maiores bibliófilos do mundo, é também alguém com alma de viajante. Ainda hoje não resiste a embarcar numa aventura sempre com um acutilante sentido de humor. E, porque existem fenómenos que só acontecem aos leitores, há sempre algo de literário e mágico nas histórias que partilha. Se o verdadeiro cidadão do mundo existe, como afirmava Sócrates, esse cidadão é Alberto Manguel. Talvez por isso o centro de história da leitura que veio fundar em Lisboa só se poderia mesmo chamar Espaço Atlântida, um espaço onde todos os leitores vão encontrar o seu lugar. No LeV, e pela primeira vez em Portugal, Alberto Manguel fala da intensa aventura da sua vida, feita de encontros e desencontros literários e não só.
“Dificilmente recordaremos com afeto alguma sessão zoom de um festival literário. Faltarão singularidades e vivências. Por isso eles voltaram em força e variedade. Acompanhei alguns dias dos recentes Latitudes, em Óbidos, FliD, em Sabrosa, 5L, em Lisboa, LeV, em Matosinhos, e Livros a Oeste, na Lourinhã, que celebrou a 10.ª edição em diálogo com o nosso tempo. O mote foi retirado a William Burroughs: A linguagem é um vírus. Na Biblioteca da Lourinhã, questionado sobre a sua poesia, Sérgio Godinho cantou-a para o casal Helena e António Marques, enquanto esperavam que José Carlos Barros apresentasse o romance que lhe valeu o Prémio Leya. A seguir acabaram todos a dizer poemas num bar ao lado. Antes, numa mesa intitulada Temos livros, somos livres, Rui Zink dizia “A literatura é um mapa para o mundo. Mas não está lá tudo explicadinho. Ele é líquido e móvel, e eu uso este mapa para não me assustar perante o que quer que aconteça.” Cá fora, as muitas réplicas de dinossauros espalhadas pela cidade pareciam advertir para a assustadora possibilidade da extinção. Até dos leitores.
“Parece-me importante e muito positivo não esquecer os mais novos nos festivais literários. No festival Palavras aoVento, no Redondo, fiz, com a ilustradora Patrícia Furtado, uma hora do conto no jardim municipal, com uma adesão muito simpática de crianças e adultos – afinal de contas, as histórias para crianças são para todas as idades e os pais também gostam de ouvir. No festival Livros a Oeste, na Lourinhã, estivemos com alunos do 1.º ciclo. Correu muito bem. O nosso livro Camião das Histórias invoca alguns clássicos infantis e em ambos os lugares foi muito bom ver que as crianças conheciam bem essas histórias, participando com interesse nos nossos desafios.”
OOFestival Lisboa 5L conseguiu a proeza de encher salas, num país onde os índices de leitura são baixíssimos. Foi uma surpresa, e um sinal de esperança, ver a sala Bernardo Sassetti do Teatro São Luiz cheia de leitores de todas as idades, desejosos de ouvir autores, como Leïla Slimani e Dulce Maria Cardoso, João Tordo e Hugo Gonçalves, a conversar sobre escrita e literatura. O Festival destacou-se pela diversidade e dinamismo e, para mim, terminou da melhor forma: com o poema A Tabacaria, de Álvaro de Campos, declamado (de improviso) pelo ator Adriano Carvalho, na magnífica livraria Ler Devagar, onde se escutou Pessoa em diferentes línguas.”
“Foi o escritor
A. M. Pires
Cabral que me levou até ao
FLiD – ou o convite para conferenciar sobre o criador do desventurado Feliciano Boaventura. Mal chegada ao xistoso e o orgânico Espaço Miguel Torga, que parecia um íman a atrair azares. De modo que fiquei muito pouco tempo. Do que vi ficaram-me na retina os ‘cromos’ da caderneta de Paulo Araújo, uma exposição que reunia uma coleção de caricaturas de escritores portugueses ligados a Trás-os-Montes e ao Douro, e as tonalidades irónicas das palavras do homenageado Pires Cabral, cuja obra admiro e que tive a sorte e o gosto de conhecer naquele espaço.”