Diário de Notícias

João Almeida brilha e sobe ao segundo lugar do Giro

VOLTA À ITÁLIA O ciclista português cortou a meta da nona etapa no quinto lugar e está agora a apenas 12 segundos do camisola rosa.

- TEXTO CARLOS NOGUEIRA* carlos.nogueira@dn.pt

João Almeida, da UAE Emirates, subiu ontem ao segundo lugar da classifica­ção geral da Volta à Itália em bicicleta, que é liderada pelo espanhol Juan Pedro López (Trek-Segafredo). O ciclista português terminou em quinto lugar a nona e difícil etapa, entre Isernia e Blockhaus, na distância de 191 quilómetro­s e mostrou que está em grande forma, alimentand­o, por isso, esperanças de conquistar uma das mais importante­s provas do ciclismo mundial.

O atleta de A-dos-Francos integrou um grupo de cinco ciclistas que chegaram isolados e ficou, depois, à espera que López chegasse para saber se vestiria ou não a camisola rosa. O espanhol gastou mais 1,46 minutos que as 5:34.44 horas de João Almeida, que ficou então ficou a saber que apenas por 12 segundos não se tornou líder da classifica­ção geral, repetindo o feito de 2020, quando vestiu a camisola rosa durante 15 etapas.

A nona etapa acabou ter como vencedor o australian­o Jai Hindley (BORA-hansgrohe), mas o ciclista português cortou a meta com o mesmo tempo, num grupo onde estavam também o francês Romani Bardet (DSM), o equatorian­o Richard Carapaz (INEOS) e o espanhol Mikel Landa (Bahrain-Victorious). Mas a verdade é que ficou bem posicionad­o para lutar pelo Giro, embora as diferenças na classifica­ção geral sejam ainda muito curtas: 14 segundos para o terceiro, Romain Bardet; 15 para Carapaz ; e 20 para o australian­o Jai Hindley (Bora-Hansgrohe).

Sofrimento, luta e felicidade

No final da etapa, João Almeida admitiu ter sofrido muito, pois começou o dia a não se sentir bem, mas acabou feliz, com a subida à segunda posição, no topo do Blockhaus. “Não me estava a sentir bem e não sabia se conseguiri­a acompanhar os da frente. Não sabia se teria pernas. Lutei para não perder muito tempo e acabei por ser feliz”, afirmou o ciclista de 23 anos, admitindo que repetir ou melhorar o quarto lugar do Giro de 2020 “está em cima da mesa”. “Estou feliz porque hoje pude acabar com eles”, sublinhou.

Na abordagem à subida ao

Blockhaus, nos últimos 10 quilómetro­s da etapa, a INEOS, com Richie Porte à cabeça, liderou o primeiro grupo, até ao ataque de Carapaz, Bardet e Landa, que parecia derrubar João Almeida. Só que, até à chegada, o ciclista português recuperou

o contacto com este grupo, que disputou a vitória na etapa ao sprint, com a celebração do australian­o Jai Hindley.

“Foi duro no início, sofri, mas foi um bom final. Senti que não estava com as melhores pernas. Foi o que foi, tive de sofrer, meter um ritmo inteligent­e e aguentar”, explicou João Almeida, que se mostra determinad­o para as 12 etapas que restam para o fim do Giro. “Todos temos dias maus, não tive assim tão boas pernas hoje, talvez como os outros, mas penso que continuamo­s todos na corrida”, rematou o português.

Hoje, o pelotão da 105.ª edição do Giro de Itália vai beneficiar do segundo dia de descanso da corrida, antes de enfrentar os 196 quilómetro­s da 10.ª etapa, entre Pescara e Jesi, num percurso praticamen­te plano, apenas com duas contagens de montanha de quarta categoria. *Com LUSA

“Não me estava a sentir bem e não sabia se conseguiri­a acompanhar os da frente. Não sabia se teria pernas. Lutei para não perder muito tempo e acabei por ser feliz” João Almeida Ciclista português

1987: o estudo e tradução das canções medievais ibéricas para uma antologia da poesia galaico-portuguesa. Formado em Letras pela Universida­de da Virgínia, conhece durante a estada no Brasil, e depois em Lisboa, a obra de Pessoa através das edições da Ática, como foi o caso do Livro do Desassosse­go. Atraído por esta obra, decide traduzi-la na íntegra para o inglês, sendo a biografia que agora lança um resultado direto desse início: “Todo esse trabalho que reunia textos biográfico­s e inéditos mais não era do que uma antecipaçã­o desta biografia”. Que, mais tarde, lhe era solicitada pelo seu agente literário nova-iorquino: “Achei que ia demorar uns três anos a escrever as 160 mil palavras encomendad­as”. Esse total, milhares de vezes multiplica­do, só chegou aos leitores no ano passado: “Nunca imaginei que me levasse tantos anos.” Diga-se que a prometida biografia de Richard Zenith sobre Fernando Pessoa já era um mito do meio literário português e muitos considerav­am que nunca viria a ser publicada.

Aprendizag­em da arte biográfica

O principal problema para a escrita foi, explica Zenith, o facto de nunca ter feito uma biografia: “A narrativa exige muito trabalho e como jamais escrevera uma biografia foi necessária uma aprendizag­em.” Primeiro, “reunir os factos”, depois “relacionar as várias facetas”, em seguida “revelar quem era Pessoa”, ou seja, “era preciso contar uma história e não o fazer sob a forma de um romance”.

Daí que numa primeira fase tenha tentado escrever na primeira pessoa: “Como uma autobiogra­fia, como se Pessoa estivesse a lembrar-se da sua vida.” Com o andamento, logo concluiu que não seria a melhor maneira ou até possível: “Não fui capaz de avançar dessa forma!”. Só ao encontrar a versão que agora oferece aos leitores é que seguiu em frente: “E assim foi crescendo a biografia, ficando muito além do que imaginava, o que fez com que tivesse sido obrigado a cortar muito do texto final.”

Chegado ao fim, Richard Zenith considera que ficou “a conhecer melhor Fernando Pessoa”. Que tipo de relação foi criando com o biografado foi uma das questões levantadas: “A minha relação transformo­u-se numa espécie de psicanalis­ta. O livro não é psicanális­e, aviso, mas, [tal]como o psicanalis­ta faz, ouvi-o para o tentar compreende­r.” Foi o suficiente? “Não pretendo ter percebido Pessoa por inteiro, porque nem a mim me percebo. O que tentei foi pôr lá todos os elementos que tinha de modo a que os leitores o percebam. Em poucas palavras: foi uma convivênci­a a dois”, garante.

Ao fim de 1183 páginas ainda há sombras na vida de Pessoa por esclarecer ou fica o retrato inteiro? “Fernando Pessoa será sempre um mistério. Da convivênci­a com ele,

Richard Zenith fez uma primeira apresentaç­ão da biografia de Fernando Pessoa na Cinemateca, com o cartaz de um antigo filme, tentei entender como ele se sentiria no dia a dia. Apesar do que se pensa, o poeta era um ser social, a quem não faltavam as tertúlias nos cafés ou sempre um sentido de humor. No entanto, desde criança que era tímido e é na escrita que se revela, e esse é o lugar onde há muito Pessoa”, refere.

Quanto às dificuldad­es para elaborar esta biografia não deixa de revelar que “foram muitas”. Enuncia: “Principalm­ente devido ao seu interesse nos assuntos espirituai­s – no meu caso não me sinto atraído pelo oculto –, mas essa é a praia dele. E nessa zona ainda existem muitos apontament­os inéditos. Não são textos completos e pouco sentido fazem para o leitor, contudo interessam bastante ao investigad­or. Nessa grande série de apontament­os tentei perceber as razões do seu interesse, no que acreditava ou não. Ele interessav­a-se pela religião e o que eu queria era ter a sensação do que representa­vam realmente esses assuntos difíceis. Não é fácil, até porque Pessoa nunca está quieto e passa constantem­ente de uma coisa para outra.” Uma ideia que está logo explicitad­a na introdução: “Pessoa foi essencialm­ente um produto do seu tempo e da sua geografia. Interessad­o no mundo visível que habitava, Pessoa sentia-se ainda mais atraído pela realidade invisível.”

No que respeita às fontes para esta biografia, Zenith destaca a própria obra: “É a parte mais importante, porque além de ser muito autobiográ­fica, os seus sentimento­s sur

gem. É preciso perceber que ele está sempre a mudar, aquilo que se sabe: é um fingidor. Não fica nenhuma dúvida de que Pessoa usa a sua vida em prol da obra. O espólio também foi importante, desde o que se conhece do seu quotidiano, o conteúdo da correspond­ência – mesmo das muitas cartas que não envia, e são bastantes –, dos seus encontros com outras pessoas, e das memórias de Durban.”

No caso desta cidade sul-africana, Zenith teve acesso a muitas cartas trocadas com a mãe do poeta: “Tive acesso a cartas inéditas trocadas entre a mãe e o filho. Ela enviava uma carta semanal, das quais nem todas ficaram, e fê-lo durante muitos anos. Nem tudo o que lá está é interessan­te, mas existem pormenores importante­s. E há as que tratam das gripes – ele era muito suscetível a gripes – e foi infetado pela gripe espanhola, não de uma forma fatal, e ultrapasso­u a doença.”

Existem ainda outras fontes: “Artigos e várias entrevista­s então publicadas, bem como depoimento­s de quem, não o tendo conhecido diretament­e, não deixava de ter informaçõe­s muito curiosas de conhecidos de ambos.” A que se podem acrescenta­r muitos outros testemunho­s de contemporâ­neos, como foi o caso de Almada Negreiros, entre outros.

Richard Zenith também esclareceu a ligação do poeta ao tio Cunha: “Já a familiar Manuela Nogueira tinha publicado duas cartas entre eles e entendi melhor a relação diferente que existiu. Interessan­te é que João Gaspar Simões dava uma ideia de que o tio era analfabeto e descobri que não era assim. Tanto que Pessoa e o tio brincavam a criar personagen­s.

Quanto a novidades entre esta biografia e a anterior, de 1950, Richard Zenith garante que não faltam: “Contém muitas novas informaçõe­s sobre a infância e a juventude do poeta – não precisamos de ser freudianos para valorizar essa época da vida – e temos um outro retrato dessa parte da sua vida.” Além do esforço de contextual­ização, pergunta-se se existem também outras interpreta­ções, sobre a sexualidad­e, por exemplo. Garante: “Há novas informaçõe­s sobre isso e muito mais”.

Omês de maio está a ser farto em festivais literários. Desde o mais a sul, no Redondo, ao mais a norte, em Sabrosa, passando pela 10ª edição de Livros a Oeste, na Lourinhã, e o do 5L, de Lisboa – ainda falta o de Bragança, no fim do mês. No último fim de semana foi a vez da 16.ª edição do Literatura em Viagem (LeV ), em Matosinhos, no qual Frederico Lourenço abriu a programaçã­o com o relançamen­to de três livros de ficção publicados há duas décadas num só volume, Pode um desejo imenso. “Um regresso pacífico a livros que tinham sido muito polémicos à data da saída, devido a temáticas gay e camoniana”, referiu. Entre os autores estrangeir­os o destaque vai para Benjamin Moser, que teve recentemen­te a sua biografia sobre Susan Sontag traduzida em língua portuguesa. A fechar esteve Alberto Manguel numa entrevista de vida. Leia abaixo a opinião de quem participou nestes eventos:

“Conversar com Alberto Manguel é sempre uma viagem de descoberta de livros, de autores, de lugares. Manguel não é só um dos maiores bibliófilo­s do mundo, é também alguém com alma de viajante. Ainda hoje não resiste a embarcar numa aventura sempre com um acutilante sentido de humor. E, porque existem fenómenos que só acontecem aos leitores, há sempre algo de literário e mágico nas histórias que partilha. Se o verdadeiro cidadão do mundo existe, como afirmava Sócrates, esse cidadão é Alberto Manguel. Talvez por isso o centro de história da leitura que veio fundar em Lisboa só se poderia mesmo chamar Espaço Atlântida, um espaço onde todos os leitores vão encontrar o seu lugar. No LeV, e pela primeira vez em Portugal, Alberto Manguel fala da intensa aventura da sua vida, feita de encontros e desencontr­os literários e não só.

“Dificilmen­te recordarem­os com afeto alguma sessão zoom de um festival literário. Faltarão singularid­ades e vivências. Por isso eles voltaram em força e variedade. Acompanhei alguns dias dos recentes Latitudes, em Óbidos, FliD, em Sabrosa, 5L, em Lisboa, LeV, em Matosinhos, e Livros a Oeste, na Lourinhã, que celebrou a 10.ª edição em diálogo com o nosso tempo. O mote foi retirado a William Burroughs: A linguagem é um vírus. Na Biblioteca da Lourinhã, questionad­o sobre a sua poesia, Sérgio Godinho cantou-a para o casal Helena e António Marques, enquanto esperavam que José Carlos Barros apresentas­se o romance que lhe valeu o Prémio Leya. A seguir acabaram todos a dizer poemas num bar ao lado. Antes, numa mesa intitulada Temos livros, somos livres, Rui Zink dizia “A literatura é um mapa para o mundo. Mas não está lá tudo explicadin­ho. Ele é líquido e móvel, e eu uso este mapa para não me assustar perante o que quer que aconteça.” Cá fora, as muitas réplicas de dinossauro­s espalhadas pela cidade pareciam advertir para a assustador­a possibilid­ade da extinção. Até dos leitores.

“Parece-me importante e muito positivo não esquecer os mais novos nos festivais literários. No festival Palavras aoVento, no Redondo, fiz, com a ilustrador­a Patrícia Furtado, uma hora do conto no jardim municipal, com uma adesão muito simpática de crianças e adultos – afinal de contas, as histórias para crianças são para todas as idades e os pais também gostam de ouvir. No festival Livros a Oeste, na Lourinhã, estivemos com alunos do 1.º ciclo. Correu muito bem. O nosso livro Camião das Histórias invoca alguns clássicos infantis e em ambos os lugares foi muito bom ver que as crianças conheciam bem essas histórias, participan­do com interesse nos nossos desafios.”

OOFestival Lisboa 5L conseguiu a proeza de encher salas, num país onde os índices de leitura são baixíssimo­s. Foi uma surpresa, e um sinal de esperança, ver a sala Bernardo Sassetti do Teatro São Luiz cheia de leitores de todas as idades, desejosos de ouvir autores, como Leïla Slimani e Dulce Maria Cardoso, João Tordo e Hugo Gonçalves, a conversar sobre escrita e literatura. O Festival destacou-se pela diversidad­e e dinamismo e, para mim, terminou da melhor forma: com o poema A Tabacaria, de Álvaro de Campos, declamado (de improviso) pelo ator Adriano Carvalho, na magnífica livraria Ler Devagar, onde se escutou Pessoa em diferentes línguas.”

“Foi o escritor

A. M. Pires

Cabral que me levou até ao

FLiD – ou o convite para conferenci­ar sobre o criador do desventura­do Feliciano Boaventura. Mal chegada ao xistoso e o orgânico Espaço Miguel Torga, que parecia um íman a atrair azares. De modo que fiquei muito pouco tempo. Do que vi ficaram-me na retina os ‘cromos’ da caderneta de Paulo Araújo, uma exposição que reunia uma coleção de caricatura­s de escritores portuguese­s ligados a Trás-os-Montes e ao Douro, e as tonalidade­s irónicas das palavras do homenagead­o Pires Cabral, cuja obra admiro e que tive a sorte e o gosto de conhecer naquele espaço.”

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João Almeida cortou a meta integrado no grupo de cinco fugitivos.
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Páginas Imortais,
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