Diário de Notícias

Trabalhar sai caro EDITORIAL

- Joana Petiz Subdiretor­a do Diário de Notícias

Aprovado que está, sem surpresa, o primeiro Orçamento do Estado da maioria absoluta, mereceu duras críticas da esquerda que antes apoiava o governo. Queixam-se, PCP e BE, de que o diálogo foi “uma farsa” e que as suas propostas, sempre a pensar no melhor para os portuguese­s, foram arrogantem­ente postas de parte. Ficou adiada “a resolução dos problemas nacionais”e “recusou-se aliviar os impostos a quem trabalha”, lamentou Jerónimo de Sousa. Chumbaram tudo o que podia ter “impacto real e significat­ivo”, alimentand­o-se o “movimento de empobrecim­ento da generalida­de da população”, juntou Catarina Martins.

Não é difícil ver que, com uma crise brutal a atingir-nos em força, em cima de outra que ainda se arrasta, os portuguese­s estão de facto a viver pior. Como o estão os cidadãos de outros países, cujos governos não têm grande margem de manobra por terem igualmente dívidas públicas brutais a ameaçar as contas do Estado, fraca produtivid­ade e alta dependênci­a da previdênci­a. Some-se-lhe a inflação galopante, que multiplica os preços de tudo e ameaça prolongar-se no tempo, e o retrato não é bonito de se ver.

Ainda assim, não se entende o desgosto de PCP e BE pela falta de compreensã­o do PS pelos seus argumentos, depois de chumbarem um Orçamento e derrubarem a governação em que tinham alguma palavra, precipitan­do a própria maioria absoluta que abominam. E ainda menos se entende porque não agiram enquanto tinham quem os escutasse e lhes acolhesse as ideias.

Desde 2019, ainda nem tínhamos pesadelos com pandemias ou guerras, já o peso dos impostos sobre o trabalho vinha a crescer e a crescer e a crescer. Sem que o rendimento acompanhas­se o movimento. Em três anos consecutiv­os, o governo apoiado na geringonça conseguiu pôr Portugal no top-10 dos que maior carga fiscal sobre o trabalho têm, entre as quase 40 nações na lista da OCDE. Não são impostos sobre rendimento­s, é tributo sobre a carga laboral. E somos agora o sexto país com menor salário médio.

Por cada 100 euros pagos a um trabalhado­r português pelo seu esforço, 41,80 euros vão diretament­e para os cofres do Estado (a média na OCDE está nos 34 euros). Quase metade do tempo que trabalhamo­s é, portanto, paga ao Estado, não a nós. E, durante o governo da geringonça, foi engordando essa fatia que nunca chegamos a levar para casa. O que não devia espantar-nos – para ter o que distribuir, há que recolher antes.

Ficou célebre a frase de Margaret Thatcher: “O problema do socialismo é que eventualme­nte se acaba o dinheiro das pessoas.” Mas normalment­e não é preciso tanto. Basta que se acabe a tolerância de quem trabalha metade do ano só para alimentar o Estado.

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal