“Não conseguimos adivinhar o género de toda a gente pela sua aparência, mas também não devemos, porque não é um jogo. Para muitas pessoas, os pronomes são sempre os mesmos ao longo do tempo, para ‘outres’ mudam.”
lino e o feminino. Por isso, no início, pode ser difícil a adaptação para uma linguagem mais inclusiva e neutra.
Esta linguagem é consensual nas redes sociais, no ativismo e na comunidade LGBTI+, ou seja, daqueles que têm estado à procura de soluções. “Fora dessa bolha é mais difícil, porque nós temos um depósito linguístico muito tradicional e muito conservador. Não faz mudanças na linguagem muito facilmente. Entretanto, enquanto é só uma coisa não-oficializada, ainda está muito nas comunidades que a usam”, disse ao DN Daniela Filipe Bento, elemento da direção da ILGA Portugal e coordenadora do GRIT (Grupo de Reflexão e Intervenção Trans).
Daniela vê a linguagem como algo orgânico. “A língua é das pessoas e deve ser uma coisa orgânica. O que temos são instâncias superiores que tomam decisões sobre a língua e estas são mais conservadoras”, acrescentou.
A língua evolui de várias formas, seja pela alteração de sons ou pela introdução de palavras novas, que vai acontecendo em função de novos conceitos e realidades.
Ao longo dos tempos houve também uma adaptação da língua portuguesa em relação ao feminino das profissões, devido às mulheres não exercerem, até então, certos cargos na sociedade. “Quando começaram a aparecer mulheres em determinadas funções, os termos femininos não eram aceites. Hoje em dia já não é assim”, afirmou Margarita Correia, coordenadora do Portal de Língua Portuguesa e colaboradora do DN.
No entanto, a língua portuguesa está ainda a adaptar-se a encontrar as melhores combinações linguísticas. “Tenho a sensação de que, aqui, ainda estamos a ver o início. Temos de fazer muito mais pressão para que as coisas mudem. Ainda é muito difícil as pessoas entenderem qual é a importância do discurso neutro”, refere a representante da ILGA.
Porquê utilizar linguagem neutra?
A primeira razão é o respeito pelo outro. Ao nomear algo, esse algo passa a existir, trazendo esta realidade para a esfera comum. Ao fazermos o contrário e não incluirmos o outro na nossa linguagem do dia a dia, ajudamos a invalidar essa existência.
Segundo Carlos Costa, do Coletivo Humanitário, muitos podem sentir-se disfóricos, ou seja, descontentes com o aspeto físico e social, que traz também problemas a nível de saúde mental, quando não se utilizam os pronomes corretos.
“O conceito de disforia de género é importante, pois contempla não só o sentido de que o problema não é a identidade da pessoa, mas sim o sofrimento e a angústia que podem sentir quando existem incongruências entre o género com que somos registados à nascença e o género que experienciamos”, explicou o psicólogo.
Por outro lado, quando são utilizados os pronomes corretos as pessoas sentem euforia, validação e sentem-se reconhecidas.