Ministro acusado de mentir: como a final da Champions entrou na campanha em França
Gerald Dramanin, responsável pela pasta do Interior, está sob fogo depois de ter garantido que o caos no Stade de France foi provocado pela venda em massa de bilhetes falsos. Oposição pede a sua demissão.
Oministro do Interior francês, Gerald Dramanin, estava ontem sob fogo, tendo sido acusado de mentir, depois de ter atribuído o caos no sábado em Paris, na final da Liga dos Campeões, entre o Liverpool e o Real Madrid, à venda em massa de bilhetes fraudulentos.
Em plena campanha para as legislativas dos próximos dias 12 e 19, a questão depressa passou do desporto para a política. A líder da extrema-direita, Marine Le Pen sugeriu que Dramanin devia demitir-se depois de ter defendido a polícia francesas e culpado a contrafação de bilhetes pelos confrontos de sábado que mancharam a maior noite do futebol europeu. “Os factos são muito graves e a mentira do ministro é extremamente grave”, garantiu Le Pen, recém-derrotada por Emmanuel Macron nas presidenciais do mês passado, no canal de televisão France 2. “Em qualquer outra democracia, perante tal fiasco, perante o caos que aconteceu diante de 400 milhões de telespetadores, e que deu uma terrível imagem de França, o ministro devia pensar em demitir-se”, afirmou a líder da União Nacional.
Darmanin culpou uma “fraude organizada, massiva e de escala industrial com bilhetes falsos” pelo caos e garantiu que 30 mil a 40 mil adeptos do Liverpool chegaram ao estádio “sem bilhetes ou com bilhetes falsos”.
O governante afirmou ainda que 70% dos bilhetes foram identificados como fraudulentos no primeiro ponto de controlo no exterior do Stade de France.
Fontes da UEFA e a Federação Francesa de Futebol disseram à AFP na terça-feira que apenas foram detetados 2800 bilhetes falsos nas entradas no estádio, sugerindo que os problemas se prenderam mais com a gestão do fluxo de pessoas no exterior.
Darmanin, de 39 anos, rejeitou as críticas – considerando-as como “bastante baixas e inapropriadas” – apesar de as imagens mostrarem alguns agentes da polícia a disparar gás lacrimogéneo e gás pimenta que afetaram crianças e adeptos com deficiências.
Alguns dos adeptos que assistiram ao jogo queixaram-se que a polícia estava a provocar bloqueios no acesso ao estádio e a manter as portas fechadas, o que levou a que o início da partida fosse adiado 36 minutos.
Estas imagens causaram novas tensões entre França e o Reino Unido e tornaram-se numa dor de cabeça para as autoridades francesas a poucos dias das legislativas.
Números falsos?
O presidente Emmanuel Macron, que os media garantem estar chateado com o seu ministro do Interior, apelou ao governo para mostrar “transparência total”, durante o Conselho de Ministros de ontem. Já a porta-voz do governo Olivia Gregoire admitiu: “Dito de forma simples, podíamos ter feito melhor e gerido melhor as coisas? Sim.”
Natural de Valenciennes, no
de França, Darmanin foi agora reconduzido no cargo de ministro do Interior, depois da reeleição de Emmanuel Macron nas presidenciais de abril
Defensor acérrimo da polícia francesa, alvo constante de críticas pelas suas táticas mais muscu
ladas, Darmanin chegou a afirmar que “quando oiço a expressão ‘violência policial’, pessoalmente até sufoco”. Esta declaração, proferida em julho de 2020, surgiu no meio de um debate sobre o recurso ao golpe do mata-leão pelos agentes da polícia, que tinha sido relacionado com as mortes de dois homens de origem africana.
Ontem, o jornal Libération, de esquerda, fez uma capa em que Darmanin surge com um nariz de Pinóquio. E no editorial, intitulado “Mentira”, a publicação escreveu que a final da Champions “arrisca-se a ficar nos anais da república muito depois de ter sido esquecida pelos adeptos de futebol”.
Audição
Para o deputado de esquerda Manuel Bompard, a “explicação dada por Darmanin... é uma explicação que não faz sentido”. Em declarações à rádio FranceInfo, acrescenNorte tou: “Quando cometemos um erro – e pode acontecer o melhor a fazer é reconhecer o erro, não inventar números falsos para tentar escondê-lo”.
Darmanin e a ministra do Desporto, Amelie Oudea-Castera, foram ontem ouvidos no Senado. O ministro reconheceu que “as coisas poderiam ter sido melhor organizadas”. Mas este episódio no Stade de France veio manchar a imagem de França – anfitriã em 2024 tanto do Mundial de Râguebi como dos Jogos Olímpicos.
No Liverpool, o diretor executivo Billy Hogan garantiu que o clube inglês recebeu mais de 5000 queixas de adeptos nas 24 horas que se seguiram ao caos em Paris. “Todos vimos as imagens de vídeo, as fotografias, e já li numerosos relatos de experiências horríveis à saída do estádio, crimes a serem cometidos, como roubos. Ninguém deveria ter de passar por aquilo que passaram os nossos adeptos antes e depois do jogo”, observou. O dirigente defendeu que esses incidentes devem ser investigados, no inquérito independente às falhas de segurança na final da Champions, cuja abertura foi anunciada pela UEFA na segunda-feira e que será liderado por Tiago Brandão Rodrigues, ex-ministro da Educação de Portugal.
O Libération fez uma capa em que Darmanin surge com nariz de pinóquio. E no editorial, intitulado “Mentira”, escreveu que a final da Champions “arrisca-se a ficar nos anais da república muito depois de ter sido esquecida pelos adeptos de futebol”.