UE pede à Argélia que recue na suspensão dos tratados com Espanha
Decisão argelina surgiu em retaliação pelo apoio de Madrid ao plano de autonomia de Marrocos para o Sara Ocidental.
AUnião Europeia apelou ontem à Argélia para que recue na decisão de suspender o Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e Cooperação com Espanha, assinado em 2002, pedido diálogo para resolver o diferendo entre ambos. A decisão argelina surge como retaliação ao facto de o governo espanhol ter reconhecido publicamente o plano de autonomia de Marrocos para o Sara Ocidental, considerado um “território não autónomo” pelas Nações Unidas e cuja soberania é motivo de disputa há décadas entre Rabat e a independentista Frente Polisário (que tem o apoio de Argel).
O governo espanhol lembrou ontem que a Argélia suspendeu o tratado, não o cancelou, dizendo-se confiante de que será possível ultrapassar rapidamente o problema. Ainda assim, prometeu uma respostas “firme” para defender os interesses comerciais espanhóis. O chefe da diplomacia espanhol, José Manuel Albares, lembrou que ainda a 24 de abril o presidente argelino, Abdelmadijd Tebboune, garantiu o fornecimento de gás a Espanha, com o governo confiante de que os contratos privados com as energéticas espanholas não serão afetados pela atual crise.
Os partidos, que querem ouvir Albares no Parlamento sobre este tema, lamentaram a mudança de posição de Espanha sobre o Sara Ocidental em plena crise energética. O país depende da Argélia para as importações de gás natural. Para já a consequência imediata foi o congelamento, por parte dos bancos argelinos, das operações de comércio externo com Espanha.
O líder da oposição espanhola, Alberto Núñez Feijóo, apelou ao governo argelino para que “obrigue” o povo espanhol “a pagar” os efeitos “da política externa improvisada” do governo de coligação liderado por Pedro Sánchez. A posição até então de Espanha em relação a este tema era de neutralidade. As declarações do líder do Partido Popular foram consideradas pelos socialistas como “agressivas e incendiárias”, uma vez que “debilitam a imagem de Espanha”.
O PP foi até mais longe, com o vice-presidente González Pons a escrever no Twitter que “é urgente que Sánchez esclareça se as informações privadas roubadas do seu telemóvel oficial condicionaram o seu comportamento errático” neste caso. Uma referência ao facto de o telemóvel do primeiro-ministro ter sido alvo do programa de espionagem Pegasus em plena crise diplomática com Marrocos, que já terá usado o programa israelita no passado e é suspeito de estar por detrás do ataque a Sánchez.
Ex-colónia espanhola
Marrocos controla 80% do Sara Ocidental, estando os restantes 20% nas mãos da Frente Polisário – que combateu uma guerra de 15 anos com Rabat depois da retirada dos espanhóis da ex-colónia em 1975 e quer um referendo sobre a independência. Os marroquinos ofereceram apenas autonomia limitada, plano que o governo espanhol apoiou em março.
O objetivo era resolver um diferendo diplomático com o governo marroquino – desencadeado pela visita a Espanha do líder da Frente Polisário, Brahim Ghali, para receber tratamento contra a covid-19 – que teve impactos ao nível da imigração ilegal. As autoridades argelinas consideram que com a sua decisão, o executivo espanhol “deu o seu apoio total a uma fórmula ilegal e ilegítima” que é defendida “pela potência ocupante”.