DOCUMENTÁRIO
Em sintonia com uma certa atualidade, The Janes já está disponível na HBO Max. A história do coletivo feminino que, entre o final dos anos 1960 e início dos 70, atuou ilegalmente ajudando milhares de mulheres americanas a abortar nas melhores condições po
L “iga para este número e pergunta pela Jane.” Foi assim, em regime de passa-palavra, com pequenos anúncios e panfletos espalhados por Chicago (ou até mesmo por recomendação médica), que muitas jovens mulheres conseguiram “resolver” uma gravidez indesejada em plena era do movimento dos direitos civis nos Estados Unidos, quando o aborto era considerado um crime em praticamente todo o país. The Jane Collective, ou na designação oficial The Abortion Counseling Service of Women’s Liberation, nasceu desse espírito que havia no ar – um espírito de luta e ação. Eram os tempos da Guerra do Vietname e de Martin Luther King, tempos dominados por vozes masculinas, mas que permitiram a um grupo de mulheres levar a sua missão avante sem que o perigo de serem apanhadas em atos ilegais as demovesse: os homens tinham os olhos postos nas suas próprias causas e, durante uma boa temporada, não prestaram atenção ao que elas andavam a fazer...
The Janes, o documentário de Tia Lessin e Emma Pildes, produzido e lançado agora pela HBO, coloca-nos no cerne desse contexto, recorrendo a imagens de arquivo do ambiente nas ruas nas décadas de 1960/70, mas sobretudo confiando a sua energia aos relatos de vários membros da rede clandestina.
Estamos a falar de verdadeiras heroínas cujos serviços se constituíram como a melhor alternativa à máfia. Entenda-se: era a esta organização criminosa que a maior parte das mulheres desesperadas recorriam para fazer aborto, muitas vezes não sobrevivendo devido aos procedimentos descuidados. The Janes começa inclusive com a descrição da experiência de uma dessas mulheres, que pagou uma exorbitância para que alguns homens ligados à máfia tratassem do assunto no quarto de um motel isolado, onde se encontrava outra jovem desvalida, ambas deixadas a sangrar por sua conta. A mesma mulher volta a aparecer mais à frente no documentário para testemunhar a diferença de um aborto providenciado pelo coletivo Jane – de repente, descobriu um mundo onde as mulheres se preocupam umas com as outras. A sensação foi, no mínimo, milagrosa.
A força de relatos como este é ainda maior numa altura em que a conquista da lei do aborto, de 1973, está sob séria ameaça de uma decisão do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, com o risco de se vol