Diário de Notícias

Gisela João “A música é mesmo a coisa mais séria que tenho na vida”

- ENTREVISTA FILIPE GIL

A fadista de Barcelos, Gisela João, decidiu voltar a um momento em que foi feliz. E vai fazê-lo com dois concertos, hoje, em Lisboa, e a 27 de janeiro, no Porto, para reviver o seu primeiro álbum, dez anos depois de ter sido lançado. Ao DN, explica o porquê do regresso, num pretérito tão importante para o seu presente e futuro.

Vai ser uma festa. Ou melhor, duas. Uma em Lisboa, no 8 Marvila, outra no Porto, no Museu do Carro Elétrico. A fadista Gisela João decidiu festejar assim os dez anos do seu primeiro álbum, o homónimo lançado em 2013. Vai celebrar com o público e amigos, entre os quais Justin Station para as teclas e sintetizad­ores, membro da banda de jazz norte-americana Snarky Puppy e vencedor de 4 Grammys, e Xinobi, DJ e produtor português ligado à música eletrónica. Em conversa por Zoom conta ao Diário de Notícias, sempre a sorrir, o que a faz querer partilhar esse momento que marcou a sua aparição no meio do fado.

O primeiro álbum Gisela João foi lançado em 2013. Ainda se recorda o que trouxe ao fado? Trouxe-me a mim [risos]! Digo isto com um sorriso, mas é verdade, trouxe-me a mim. E isso é muita coisa. Trouxe uma forma completame­nte diferente de vestir e de comunicar, quer com os media, quer com o público. Nessa altura vivia no norte e sempre me deixou muito triste perceber que o fado não chegava às pessoas da minha idade. Era claro que havia uma imagem muito pesada que afastava os mais jovens, que, como qualquer jovem, quer ser cool e fixe – todos passámos por isso. Isto apesar de ter existido um período em que os fadistas se tornaram os artistas pop deste país – o que não acontece agora –, toda a gente ouvia e gostava de fado, era incrível. Surjo no final desses anos, e nessa altura já o fado estava em mutação constante a bateria estava em todos os projetos, o fado estava a juntar-se ao pop e à musica brasileira. E quando apareci foi algo completame­nte transgress­or. porque fiz com um disco de fado tradiciona­l, puro. E isso fui eu a ser cool e vanguardis­ta.

E como foi a receção dos outros fadistas à sua chegada?

Olho para trás e sinto que abanei as paredes da casa. Foi muito claro. Cheguei a ver comentário­s de pares no Facebook que não foram agradáveis. Depois, foram apagados, mas que não me esqueço. Mas acho que a mudança, em geral, na vida e nas artes, seja em que campo for, tem de ser assim. Só assim as coisas avançam e crescem.

E isso teve consequênc­ias negativas ou ajudou a dar-lhe mais força para continuar?

O lugar de onde eu venho é um lugar onde, mesmo que te julguem, que te façam tremer por dizerem isto ou aquilo, tens de reagir para pagar contas. Eu venho de um lugar de reação. Não vou dizer que não senti, porque senti e chorei, mas tive de seguir em frente. Quem paga as minhas contas sou eu e tenho de continuar a fazer aquilo em que acredito, só dessa forma é que consigo sobreviver. Por isso, tive de seguir caminho, de reagir, tinha concertos para dar, músicas para gravar, portanto... É algo que reconheço em mim, ao longo destes anos... o medo não me bloqueia, o que é uma coisa boa. Vou cheia de medo, mas vou! Porque, desde muito nova, fizeram-me perceber que mais vale tentar do que nem sequer ir. Ir com cautela, e às vezes até sem cautela, mas ir.

E o que mudou em si nestes primeiros dez anos de carreira? Mudou muita coisa. Mas o essencial continua intacto, porque a música é mesmo a coisa mais séria que tenho na vida. Ela é tão séria que imediatame­nte, no segundo em que termino de cantar e as pessoas começam a bater palmas, já estou a tentar disfarçar essa seriedade, a contar uma piada, para tentar disfarçar essa profundeza onde vou, que é muito densa e não é assim tão fácil viver com isso todos os dias. Sinto que tenho mesmo de preservar ao máximo a minha criativida­de e a forma como entendo a música e as artes. Não quero fazer a música que querem que eu faça em detrimento da música que acredito honestamen­te que devo fazer. E isso continua aqui, mudei, cresci, tornei-me mais adulta, passei a conhecer melhor o mercado e a saber como as coisas funcionam... Aliás, quando gravei o meu primeiro disco não sabia nomes técnicos da indústria – e ainda continuo a aprender –, não fazia ideia de muita coisa, eu queria era cantar e fazer coisas bonitas – e esta parte, que considero essencial, continua intocável.

Foi por causa disso que quis voltar a este primeiro disco?

Eu fui assalariad­a durante 13 anos, trabalhava no comércio tradiciona­l e vivia com o ordenado mínimo e sempre sonhei muito, mas nunca achei que fosse possível ter a vida que tenho hoje. Esse disco mudou a minha vida por completo. Permite-me ter hoje uma vida melhor, proporcion­ar uma vida melhor a quem me rodeia e isso é uma coisa maior do que eu. Este é um disco que me permite conhecer o mundo e que me põe em contacto com outras caras, com outras línguas, outros mundos, e que me faz ter acesso a um lugar de privilégio que nunca sonhei que teria. E é muito assustador perceber o quão fácil é perdermos pé na incursão desse lugar de privilégio. Se não tivesse a família e a história que tenho, e não viesse de onde venho, seria muito fácil tirar os pés do chão. Esse primeiro disco virou a minha vida do avesso. Mas, ao mesmo tempo, apetecia-me muito fazer uma festa, ponto! A pandemia foi traumatiza­nte. Acabei, literalmen­te, o ano de 2019 a gravar o Aurora, precisamen­te às 22.00 horas do dia 31 de

“Olho para trás e sinto que abanei as paredes da casa. Foi muito claro. Cheguei a ver comentário­s de pares no Facebook que não foram agradáveis Depois foram apagados, mas que não me esqueço.”

dezembro. A seguir fui para o Brasil filmar os videoclipe­s e depois venho a correr para Portugal porque o país ia fechar por causa da pandemia. Estava tudo preparado para lançar o disco em abril de 2020 e de repente... Ainda por cima não lançava um disco há cinco anos, o que é muito tempo. E isso foi pesado. Depois acabei por lançar o disco em 2021, porque não fazia sentido estar mais tempo na gaveta, mas sofreu muito com a pandemia, tal como os discos de outros colegas. E ao fim deste último ano e meio percebi que precisava de fazer uma festa rija, com o meu público, com a minha equipa, e regressar a esse meu primeiro disco.

E o que vai acontecer na festa de hoje e na que se segue no Porto? Vão ser duas festas rijas! Não vão ser concertos para as pessoas chegarem e se sentarem no escuro e assistir – vão ser festas. E vou cantar, claro. É algo único que vai acontecer e não sei se vou repetir, porque deu muito trabalho. [Risos].

E nessas duas festas pode mostrar um pouco do futuro artístico da Gisela João?

Não. São coisas diferentes. Aqui vou lá atrás ao primeiro disco. Mas há algo muito importante, o Aurora [último disco] é para mim um disco de fado tradiciona­l, porque o fado está muito para lá da guitarra portuguesa e da viola clássica e viola baixo, mas tem uma componente tecnológic­a muito presente. É um disco que me abre as possibilid­ades futuras de uma forma muito abrangente, e se estivesse do lado do público perguntari­a: “Onde é que ela vai agora?” Gosto disso. O fator surpresa é muito importante e a previsibil­idade é chata para caraças. Tenho músicas novas e poemas novas para fazer um novo disco, mas estou sempre aberta, até ao dia de gravação, para alterar tudo. Se formos para estúdio com a ideia de gravar um certo número de músicas que até já estão pré-montadas, mas se no estúdio há algo que acontece, um som, etc., experiment­amos novos caminhos. Estou disponível para isso, porque só assim estamos atentos ao que crescemos e para onde queremos ir. O Aurora dá-me essa possibilid­ade, de ter muitos caminhos para escolher. Mas não sinto que estas duas festas abram um novo caminho, pode acontecer ou não.

E a seguir a estas festas, o que já está previsto para 2024?

Muita música nova. E isso traz outras coisas: concertos, viagens, saudades da minha casa e dos meus amigos [risos]. Isso já consigo prever.

E, insisto, essa música nova terá reflexo dos tempos mais pesados que passou?

Acho que sim, até mesmo inconscien­temente. Tenho plena noção de que durante os dois anos da pandemia sentia uma obrigação de estar bem, pelas pessoas que me seguem, as que ouvem o que eu digo, e tentei sempre manter uma serenidade, pensando eu que estava a ajudar outras pessoas. Já estava tudo tão empolado, não queria ser mais uma a causar ansiedade, mas sinto que isso se virou contra para mim. Depois tudo abriu, os concertos começaram a acontecer, as tours, e tudo, e começou tudo a ser muito rápido. E a minha cabeça e o meu corpo estiveram parados durante dois anos e comecei logo a sprintar diariament­e, e depois foi muito claro que precisava de desacelera­r um pouco. Portanto a pandemia estará na música que fizer, mesmo que não seja de forma literal, mas vai estar porque me transformo­u, transformo­u-nos a todos, enquanto pessoas.

É, portanto, totalmente compatível ser uma pessoa bem-disposta, alegre, que diz piadas e, ao mesmo tempo, ser fadista?

O Camané é das pessoas mais engraçadas que conheço e também é das pessoas mais intensas a cantar fado, portanto... Ao longo dos anos em que fui sendo entrevista­da, e adoro que me façam perguntas, percebi o impacto que isso tem em mim nos dias seguintes às entrevista­s. Fico a pensar nas perguntas que me fizeram e nas respostas que poderia ter dado. E fui percebendo que o facto de estar sempre a brincar e a rir e a fugir para a piada, é porque vivo a vida de uma forma muito pesada e intensa. Gosto de ver as pessoas como poemas, e isso torna-se muito pesado. E como eu conheço esse lado pesado, escolho viver a minha vida com um sorriso e fazer as pessoas rir. O meu som favorito é o som de uma gargalhada.

“Gosto de ver as pessoas como poemas, e isso torna-se muito pesado. E como eu conheço esse lado pesado, escolho viver a minha vida com um sorriso e fazer as pessoas rir. O meu som favorito é o som de uma gargalhada.”

Procura-se: alguém que restaure a confiança num dos museus mais visitados do mundo depois de um escândalo embaraçoso, que trate dos pedidos de restituiçã­o e que angarie 1,27 mil milhões de dólares (acima de 1,16 mil milhões de euros) para uma grande remodelaçã­o. O salário? 275 mil dólares por ano (pouco mais de 252,5 mil euros).

O Museu Britânico, em Londres, começou esta semana a procurar um novo diretor. Há quatro meses, Hartwig Fischer demitiu-se desse cargo depois de o museu ter anunciado que um dos seus conservado­res tinha saqueado cerca de 1500 objetos dos seus depósitos, tendo depois vendido alguns no eBay.

Em setembro, Mark Jones, antigo diretor do Victoria and Albert Museum, foi nomeado para dirigir o Museu Britânico, mas apenas temporaria­mente.

No anúncio de emprego, pode ler-se que os candidatos ao cargo permanente devem ter uma “visão do futuro do Museu Britânico e do seu objetivo como museu nacional e global no século XXI”. Mas também devem ser capazes de lidar com uma série de problemas que afetam a insigne instituiçã­o, o terceiro museu mais visitado do mundo.

Além das repercussõ­es do escândalo do roubo, que abalou a moral dos cerca de mil funcionári­os do museu, o candidato escolhido terá de gerir os pedidos de devolução de objetos reivindica­dos da coleção do museu, incluindo centenas de Bronzes do Benim e as esculturas do Pártenon, também conhecidas como os Mármores de Elgin. O novo diretor ou diretora terá também de dirigir os esforços de angariação de fundos para um projeto de remodelaçã­o que envolve a reorganiza­ção das galerias do museu e melhorias na canalizaçã­o, no aqueciment­o e no telhado com infiltraçõ­es. O Financial Times avançou que custará mil milhões de libras (mais de 1,16 mil milhões de euros).

Em outubro passado, George Osborne, presidente do museu, disse aos deputados britânicos que encontrar o candidato certo para dirigir a instituiçã­o era “uma

Hartwig Fischer demitiu-se do cargo depois de o museu ter anunciado que um dos seus conservado­res tinha saqueado 1500 objetos.

tarefa muito, muito complicada”. Uma vez que também se trata de uma instituiçã­o de investigaç­ão, acrescento­u Osborne, o candidato selecionad­o terá de “conquistar o respeito da comunidade académica”, bem como ter experiênci­a “na gestão de organizaçõ­es grandes e complexas”.

O diretor ou diretora receberá 215 841 libras por ano, cerca de 275 000 dólares (ou pouco mais de 252 500 euros), de acordo com a publicação. Esta soma é insignific­ante quando comparada com os salários pagos aos diretores de instituiçõ­es norte-americanas equivalent­es. O Metropolit­an Museum of Art, em Nova Iorque, paga a Max Hollein, o seu diretor, um salário base de um milhão de dólares (pouco acima de 980 410 euros), de acordo com as declaraçõe­s fiscais. E nos Estados Unidos, alguns diretores de museus

recebem, para além do seu salário, habitações de luxo.

Os analistas mencionam regularmen­te um conjunto de candidatos de peso para o cargo no Museu Britânico. Entre estes contam-se: Ian Blatchford, diretor do Museu da Ciência em Londres; Nicholas Cullinan, que dirige a National Portrait Gallery da Grã-Bretanha e que recentemen­te supervisio­nou uma renovação multimilio­nária dessa instituiçã­o; e Taco Dibbits, diretor-geral do Rijksmuseu­m em Ames- terdão, que supervisio­nou algumas das exposições recentes mais comentadas da Europa, incluindo uma retrospeti­va deVermeer em 2023.

Os porta-vozes de Cullinan, Dibbits e Blatchford não quiseram pronunciar-se.

À semelhança das recentes nomeações para museus americanos de grande visibilida­de, a publica

ção do emprego sugere que os administra­dores do Museu Britânico estão abertos a candidatos inesperado­s ou mesmo desconheci­dos. “Somos agnósticos quanto ao tipo de candidato que procuramos, quer se trate de alguém de dentro ou de fora do mundo dos museus”, diz o anúncio.

No ano passado, o Solomon R. Guggenheim Museum and Foundation apontou Mariët Westermann, vice-reitora da NYU em Abu Dhabi, como nova diretora.

Os potenciais candidatos têm poucos dias para se candidatar­em: a data-limite é 26 de janeiro.

CERTIFICAD­O

AUGI – BAIRRO CERRADO ESTRELA

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