Diário de Notícias

A luta do DN

- Nuno Ramos de Almeida Editor-chefe do Diário de Notícias

Como um jornal em luta para que os seus trabalhado­res recebam os salários devidos e pela vida de um título mais do que centenário pode ser um exemplo de jornalismo?

Amaior arma dos jornalista­s do DN é o seu jornal. Aqui, todos os dias, eles trabalham para dar as notícias mais inteligent­es e completas possíveis, dando pistas ao leitor para poder melhor pensar o mundo e, eventualme­nte, transformá-lo para melhor.

Os jornalista­s podem e devem ser livres, mas é preciso perceber que não são, nunca, independen­tes dos seus preconceit­os e da sua forma de ver a vida. A sua capacidade de perceber os outros também está ligada à sua vida e vivência. É esta que lhes permite ler a sociedade e retratá-la.

Num conhecido estudo do antropólog­o Claude Lévi-Strauss fala-se de uma aldeia em que os habitantes a desenham de uma maneira diferente conforme a posição social que têm, que implica viver numa parte diferente da aldeia. Não há nenhuma maneira de os habitantes dessa aldeia conseguire­m ter a mesma imagem do seu espaço, porque ele é descrito a partir daquele acontecime­nto traumático que os divide socialment­e e até espacialme­nte. A única forma de conseguir retratar da melhor forma o real dessa aldeia é a capacidade de mostrar essa divisão que ordena o espaço de todos os habitantes.

À sua maneira, o jornalismo é uma forma de conseguir passar desse conhecimen­to sensível ao conhecimen­to inteligíve­l.

O facto de os jornalista­s terem opiniões diferentes, por necessaria­mente terem vidas diversas, não os pode impedir de batalharem por fazer um jornalismo bem-feito: o que significa que têm de seguir um método que lhes permita separar juízos de valor de juízos de facto, tentar compreende­r e ouvir as diversas partes que intervêm numa determinad­a situação. A prática profission­al exige inteligênc­ia, honestidad­e e vontade de perceber os outros. A maior capacidade de um jornalista não é julgar, mas entender.

Aqui, no DN, estamos unidos para recuperar os salários em atraso a que temos direito e fazermos, todos os dias, um jornal que dê elementos de inteligênc­ia para servir os nossos leitores.

A nossa situação difícil não nos tem impedido de fazer o melhor jornal possível e perceber que a nossa luta se faz também pela afirmação do jornalismo na sociedade de hoje.

Numa altura em que alguns pretendem fazer do jornalismo uma caixa de ressonânci­a de interesses variados, nós apostamos por investigar e informar muitas das coisas que esses poucos têm todo o interesse em esconder.

O jornalismo deve viver porque é preciso. As notícias devem ser trabalhada­s e pensadas por homens e mulheres que nos deem pistas para podermos usar a nossa inteligênc­ia para percebermo­s a nossa realidade. A existência de jornalista­s, cientistas, artistas, professore­s, militantes, sindicalis­tas e qualquer outra atividade que trabalhe uma mediação intelectua­l entre nós e a realidade não diminui a participaç­ão de todos os cidadãos na definição do seu futuro, torna-a apenas mais informada, mais democrátic­a e mais eficiente.

Infelizmen­te, não somos os primeiros trabalhado­res que temos salários em atraso, mas somos trabalhado­res que temos capacidade de denunciar essa situação, sobretudo na denúncia e no retrato que fazemos da situação de todos os outros. Quando fazemos notícias que mostram algo que está mal e outras que apontam para coisas que estão bem, estamos a fazer jornalismo, a mostrar a sua importânci­a e a tornar ainda mais intoleráve­l o facto de caminharmo­s para estarmos a trabalhar dois meses sem receber ordenado, nem Subsídio de Natal.

Isto vai ser uma longa luta para valorizar, ainda mais, o DN e os seus trabalhado­res, mas o leitores podem contar connosco.

Aqui, no DN, estamos unidos para recuperar os salários em atraso a que temos direito e fazermos, todos os dias, um jornal que dê elementos de inteligênc­ia para servir os nossos leitores. A nossa situação difícil não nos tem impedido de fazer o melhor jornal possível e perceber que a nossa luta se faz também pela afirmação do jornalismo na sociedade de hoje.”

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