As matrículas, o pré-escolar e o acesso ao 1º ano de escolaridade: corrigir uma injustiça
Existe hoje, nos grandes centros urbanos, um grave fenómeno de injustiça no acesso ao 1º ano de escolaridade na rede pública de ensino. É um problema que urge corrigir e que é decorrente, paradoxalmente, da aplicação do próprio despacho normativo que define os critérios de matrícula e normas a observar na distribuição das crianças e dos alunos (DR n.º 10-B/20211). O que acontece é que a aplicação dos critérios que, neste normativo, definem as prioridades na matrícula na educação pré-escolar, geram depois uma enorme perversidade no momento de aplicar os critérios que definem, no mesmo normativo, as prioridades no acesso ao 1º ano de escolaridade.
Na educação pré-escolar, as prioridades de matrícula são definidas com base num critério único: a idade da criança. Entram em primeiro lugar as crianças mais velhas e, em último lugar, se existirem vagas disponíveis, as mais novas. Desta forma, todas as crianças se vinculam a um determinado agrupamento de escolas unicamente com base no critério idade, podendo ou não residir na área de influência do estabelecimento escolar. Quando terminam a educação pré-escolar, essas crianças têm acesso prioritário ao 1º ano de escolaridade no mesmo agrupamento de escolas, pois é isso que determinam, e bem, as prioridades na matrícula no Ensino Básico.
O problema surge quando as crianças que residem na área de influência das escolas desse agrupamento, por vezes no mesmo bairro ou até do outro lado da rua, mas que frequentaram o pré-escolar numa IPSS, veem o seu pedido de matrícula no 1º ano de escolaridade negado por inexistência de vagas. Ora, o que acontece é que as vagas existentes são ocupadas pelas crianças que transitam automaticamente do pré-escolar, muitas delas sem residência na área de influência das escolas. Compreensivelmente, esta situação gera sentimentos de revolta e injustiça nas famílias, cujos educandos teriam certamente vaga na escola da sua área de residência, não estivessem os lugares ocupados por crianças que se vincularam ao agrupamento pelo critério idade, aquando da admissão no pré-escolar.
Este é um problema bem conhecido de um grupo muito restrito de municípios urbanos que, tendo participado no Programa Aproximar Educação, entre 2015 e 2018, mantêm competências delegadas de gestão do processo de matrículas na rede pública de educação e ensino. Porque estão mais perto das escolas e das famílias, com quem dialogam diretamente, identificam esta injustiça no processo de matrículas que o Ministério da Educação ignora, apenas e tão só por estar distante e não ter relação direta com a comunidade.
Estará em curso, neste primeiro trimestre de 2024, a preparação de mais um calendário de matrículas e respetiva renovação para o ano escolar de 2024/2025. Este é, portanto, o momento adequado para produzir uma pequena alteração àquele despacho normativo e, com isso, eliminar a perversidade que o mesmo vem provocando e que afeta a organização das vidas de muitas famílias. A solução é simples: tornar cumulativos, nas prioridades de acesso ao pré-escolar, o critério idade e a residência comprovada na área de influência do jardim de infância. Não é prejudicado o critério idade e é feita justiça a milhares de famílias.