Uma sensacional compra da Regina
Hoje, há 50 anos, a página 4 do Diário de Notícias continuava a ser uma das mais interessantes do total de 32 que compunham o jornal de então. Das mais interessantes porque era das poucas onde se podia perceber um pouco o país. Em 27 de janeiro de 1974, quando o regime ainda não sabia que só iria durar mais 88 dias, o DN encharcava os leitores de informação internacional.
Na página 4, com um poderoso antetítulo, Sangue no asfalto, noticiava-se mais um “violento” choque frontal entre dois automóveis que circulavam em sentidos opostos na Estrada Marginal – e no mesmo sítio de sempre, em Caxias. Ninguém morreu mas cinco pessoas ficaram feridas, quatro das quais em estado grave – e todas identificadas pelo nome e idade na notícia do DN.
Foi necessário que passassem décadas para finalmente alguém se lembrar de construir um separador entre as faixas de sentido oposto, tornando os choques frontais uma impossibilidade e acabando-se de vez com a possibilidade de alguém voltar a usar sobre aquele pedaço de estrada o antetítulo Sangue no asfalto.
Na mesma página, porém, a notícia mais interessante tinha a ver com a fábrica de chocolates Regina, que produzia então o famoso “Coma com pão” – uma tablete que supostamente se deveria comer dentro de uma carcaça.
Ilustrada com uma fotografia aborrecida – quatro pessoas sentadas a uma mesa – a notícia revelava algo que hoje só podemos ver como motivo de galhofa, mas que na altura era sensacional: “A fábrica de chocolates Regina adquire um computador.”
O texto dizia que o contrato para aquisição de tal prodigioso equipamento tinha sido firmado entre a empresa portuguesa e a NCR – The National Cash Register Company. E acrescentava, dispensando o uso de vírgulas: “O computador NCR Century destina-se a aplicações de tipo comercial nomeadamente facturação estatística controlo de cobranças contas correntes contabilidade geral salários e numa segunda fase à mecanização do planeamento e controlo de fabrico.”
Apesar das dificuldades provocadas pela concorrência feroz que se iniciou com o mercado livre da UE, os chocolates Regina sobreviveram. Foi decisiva a notoriedade da marca. E a vontade de empresários competentes.