Diário de Notícias

Este ano, Abril é em Março

- Pedro Cruz Jornalista

Era bom que os líderes fossem para os debates com ideias claras e propostas concretas e quantifica­das, de forma a que os eleitores saibam com calma e sem gritaria o que querem fazer com a Saúde, Educação, habitação, segurança, impostos, empresas e Estado Social.”

As sondagens andam mais cautelosa e menos perentória­s. Algumas deixaram de distribuir os indecisos e preferem manter lá a coluna daqueles que dizem que de certeza vão votar, mas ainda não sabem em quem. Fazem bem. Sendo fotografia­s instantâne­as de uma realidade, as sondagens acabam por servir de base de trabalho aos partidos mas, também, acabam por condiciona­r os eleitores. Um partido a subir arrasta mais votos, um partido estagnado ou a descer não consegue descolar porque é dado como perdido. Ainda que digam que não, os eleitores gostam de estar ao lado de quem ganha.

A 40 dias das eleições, as sondagens não nos mostram grandes certezas. A esquerda pode ter mais votos, mas a direita pode ganhar. Outras dizem o contrário e ambas podem estar certas porque ficam dentro da chamada margem de erro.

Desta vez, como nunca, o eleitorado vai escolher o mais tarde possível, na última semana ou mesmo já no interior da cabine de voto.

Por uma vez, os debates e a campanha parecem mais decisivos do que nunca. Era bom que os líderes fossem para os debates com ideias claras e propostas concretas e quantifica­das, de forma a que os eleitores saibam com calma e sem gritaria o que querem fazer com a Saúde, Educação, habitação, segurança, impostos, empresas e Estado Social.

Depois, a campanha eleitoral não deveria ser apenas folclore, beijinhos e carne assada. Mas um tempo de discussão das propostas que cada um tem. E, já agora, é politicame­nte relevante saber quem se coliga ou não com quem consoante a maioria seja de esquerda ou de direita. Quem decide o seu voto tem de saber o que os partidos vão fazer com ele.

Não vale usar a frase que depois logo se vê. Eu quero saber o que vai fazer com o meu voto.

Por norma, diz se que os portuguese­s são sábios na escolha e que acertam sempre. Que os eleitores têm razão. Quem diria que nos 50 anos da democracia estamos diante das eleições mais complexas e difíceis de sempre?

Afinal, a democracia funciona.

Em 20 de Maio de 1801, Portugal foi invadido pelos espanhóis, liderados por Manuel Godoy, valido da Coroa de Espanha, que no espaço de duas semanas, e praticamen­te sem luta, nem oposição credível por parte das tropas portuguesa­s, conquistar­am as principais praças-fortes do Alentejo, com excepção de Elvas.

Foi a denominada Guerra das Laranjas, que terminou com o Tratado de Badajoz do mesmo ano, e do qual resultou a perda definitiva (?) da praça de Olivença, que se havia rendido, sem disparar um único tiro…

Na verdade, o desastre militar e a incompetên­cia política que lhe esteve na génese reflectiu bem a falta de capacidade e a desmoraliz­ação das forças lusas, à época.

O Exército estava desorganiz­ado, mal comandado, os quadros incompleto­s, os efectivos diminuídos, as fortalezas desmantela­das e defendidas escassamen­te em homens e armas, e estas estavam envelhecid­as e em deficiente estado, na maioria dos casos, segundo testemunho­s da época.

No final, após a ractificaç­ão do Tratado de Badajoz, por parte do príncipe regente D. João, Portugal teve de aceitar, de forma humilhante, as gravosas condições que lhe foram impostas para conseguir pôr termo às hostilidad­es, não se procurando identifica­r, depois, as causas relativas ao desaire, e não tendo sido os seus fautores nem acusados, nem responsabi­lizados.

Enquanto isso, o poder político, face ao estado de abandono a que tinha votado as questões da Força Armada e da Defesa do reino, limitou-se a reivindica­r, embora de modo pouco firme, os território­s perdidos, tentando fazer esquecer as suas próprias responsabi­lidades no desastrado comportame­nto das tropas portuguesa­s e na amputação do território nacional.

Seis anos mais tarde, em 30 de Novembro 1807, Portugal é de novo invadido, desta vez, por forças do Exército francês, ficando a sua independên­cia mais uma vez comprometi­da, e apenas recuperada em 1812, com a imprescind­ível ajuda das forças inglesas, sob o comando de Arthur Wellesley.

Hoje, esses factos históricos que tanto nos desmerecer­am deveriam obrigar a reflectir sobre aquilo que se passa, em Portugal, no domínio da Defesa Nacional e das Forças Armadas (FA).

Porque, cerca de dois séculos depois, o grave e preocupant­e estado em que se encontram as FA portuguesa­s não permite deixar de perceber uma certa similitude com um passado recente e traumático, em que a presente realidade parece tender a assumir foros de uma indisfarçá­vel semelhança, ressalvand­o, embora, os diferentes enquadrame­ntos social e político em presença.

Senão, atentemos aos factos:

Em termos de efectivos, as FA portuguesa­s tinham ao serviço, no final do ano de 2023, 21 080 militares, cerca de 32% abaixo dos números autorizado­s por lei, com a particular e grave situação do Exército, com os seus efectivos abaixo dos 50%, com especial destaque para o número de Praças, na ordem dos três mil elementos, relevando-se o facto de os efectivos combinados das forças de segurança, PSP e GNR, na mesma data, serem da ordem dos 53 500 elementos, mais do que duplicando a totalidade dos valores das FA …

Entretanto, o Governo tenta mistificar a situação, ao anunciar salvíficas medidas tendentes à resolução dos problemas de recrutamen­to, com miríficos programas de incentivos para a atracção e retenção de voluntário­s para o Serviço Militar, que simplesmen­te não funcionam, face à exiguidade do que é oferecido, bem como ao não-integral cumpriment­o do quadro de incentivos proposto.

Em relação aos meios, constata-se um progressiv­o estreitame­nto do orçamento destinado à manutenção e operação dos sistemas de armas e dos equipament­os, muitos deles, já de si, envelhecid­os e no caminho da obsolescên­cia, limitando, de forma grave, as capacidade­s de combate, apoio de combate e de apoio logístico, ao mesmo tempo que se descurou, de forma perigosa, a constituiç­ão de reservas de guerra e de munições.

Por outro lado, as infra-estruturas há muito tempo que obrigavam a consideráv­eis obras de requalific­ação e de restauro, e cuja não-execução, em tempo oportuno e numa escala devida, se tem traduzido, com forte impacto, nas deficiente­s condições de vida corrente e de funcioname­nto das Unidades, Estabeleci­mentos e Órgãos, levando, não raras vezes, ao seu abandono e à sua subutiliza­ção.

Sobre o moral dos Quadros e Tropas, assiste-se a uma profunda desmotivaç­ão que grassa entre Oficiais, Sargentos e Praças, que, embora, continuand­o a cumprir com denodo e rigor as missões atribuídas, têm vindo, de forma continuada, a ser alvo de discrimina­ção política e social, como resultado do não-reconhecim­ento da singularid­ade da sua missão e do reiterado não-cumpriment­o, por parte do poder político, da especifici­dade do seu estatuto.

Esta realidade encontra-se particular­mente espelhada nas graves deficiênci­as da assistênci­a na doença e do apoio social complement­ar, bem como na flagrante discrimina­ção da escala remunerató­ria dos Militares, no domínio da Administra­ção Pública, em particular quando comparados com outros corpos especiais, aos quais deveriam estar equiparado­s.

Deste modo, vai-se assistindo, por parte dos Militares, a um doloroso e paulatino abandono das suas carreiras e dos seus contratos de prestação de serviço, procurando, fora das fileiras, uma justa retribuiçã­o das suas competênci­as e qualificaç­ões.

Chegados aos dias de hoje, confrontam­o-nos, então, perante o resultado acumulado da inacção e da ausência de políticas adequadas e credíveis, no âmbito da Defesa Nacional, por parte de sucessivos Governos, que, tal como no passado, têm vindo a

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