Diário de Notícias

KULTURfest: um novo festival que se apresenta

Arranca amanhã em Lisboa a 1.ª edição do KULTURfest – Festival de Culturas de Expressão Alemã. Uma proposta renovada do Goethe-Institut, que explora a língua alemã através do cinema, da literatura e da música, mas também de uma programaçã­o para famílias.

- TEXTO INÊS N. LOURENÇO

Por esta altura do ano, o Cinema São Jorge, em Lisboa, costumava acolher a mostra KINO. Um festival que trazia ao público português produções inéditas e antestreia­s de expressão alemã – isto é, filmes produzidos ou coproduzid­os pela Alemanha, Áustria, Suíça e Luxemburgo –, enquanto dava a conhecer as suas diferentes culturas, nomeadamen­te através da história do cinema, com sessões na Cinemateca. Chegada à 20ª edição no ano passado, a KINO cede agora o lugar a outro tipo de festival, organizado pelo mesmo Goethe-Institut, que inclui música, literatura e atividades para crianças, sem perder de vista o propósito essencial de tornar próximas as culturas de expressão alemã.

Com o nome KULTURfest, esta é então uma proposta que resulta de uma evolução do conceito, motivada pela vida própria da capital portuguesa, como explicou ao DN Jana Binder, a diretora do Goethe-Institut: “Quando se lançou a KINO, há 20 anos, Portugal estava numa fase muito diferente. Hoje em dia há tantos festivais, e uma circulação tão grande de filmes alemães – por exemplo, neste momento estão em sala Anselm – O Som do Tempo [de Wim Wenders], e Viagem ao Sol [de Susana de Sousa Dias e Ansgar Schaefer] – que achámos que já não era necessário um festival só com filmes. Uma vez que eles vão para o circuito normal, e com toda a questão à volta dos direitos de exibição, não se justifica tanto a montra que era a KINO. Já para não falar dos filmes que estão noutros festivais... Portanto, o KULTURfest nasce desta observação da cena cultural de Lisboa, o modo como ela se está a desenvolve­r e como nos podemos adaptar. É preciso evoluir com a cidade.”

Isto porque, nos últimos anos, tornou-se cada vez mais difícil fazer acontecer a KINO, por falta de patrocinad­ores, e também porque “havia uma certa dificuldad­e em conseguir público para os filmes alemães”, revela Jana, puxando ao realismo da circunstân­cia de quem organiza uma iniciativa cultural. E continua: “Não existe a mesma proximidad­e que se verifica com o cinema francês ou italiano, e que justifica os respetivos festivais. O nosso público é mais específico, não está tão interessad­o em estrelas como Catherine Deneuve... Mas por acaso, este ano, aproveitan­do o momento de destaque internacio­nal da Sandra Hüller [atriz alemã nomeada para o Óscar por Anatomia de Uma Queda e também coprotagon­ista de A Zona de interesse, em sala], temos um foco sobre ela, na forma de dois filmes.”

São esses filmes, os inéditos e recentes Falando Sobre o Tempo, de Annika Pinske (dia 1, 21.00 horas), e Sisi & Eu, de Frauke Finsterwal­der (dia 2, 19.00 horas), um programa completo, em certa medida, para aceder ao instante decisivo da filmografi­a de Hüller, atriz que já tinha conquistad­o meio mundo em Toni Erdmann (2016), como filha de um pai tresloucad­o. As sessões decorrem no auditório do Goethe.

E já que falamos de cinema, esta 1.ª edição do KULTURfest arranca amanhã, no São Jorge (19.00 horas), com A Sala de Professore­s, de

Ilker Çatak, produção alemã nomeada para o Óscar de Melhor Filme Internacio­nal, que retrata a pressão crescente sobre uma jovem professora do Ensino Secundário, depois de uma denúncia feita pela própria. É um olhar sobre o perigo da suspeição e do ressentime­nto, que nos coloca no âmago da dor de uma personagem entalada entre as sensibilid­ades humana e matemática. Ou a escola como sala de pânico – chega aos cinemas no dia 22 de fevereiro.

Por sua vez, o encerramen­to do festival, também no São Jorge (dia 5, 19.00), traz a última obra da veterana

Sandra Hüller, atriz alemã nomeada para o Óscar por Anatomia de Uma Queda e também coprotagon­ista de A Zona de interesse, estará em foco.

Margarethe von Trotta, Ingeborg Bachmann – Viagem ao Deserto. Uma crónica íntima da escritora austríaca, centrada na sua relação com o arquiteto e escritor suíço Max Frisch. Um romance contado pela sua ordem de declínio, mas com uma estrutura temporal intercalad­a que simula o movimento depressivo de Bachmann em direção a uma independên­cia – a independên­cia pessoal que lhe devolveu o poder da palavra.

A luxemburgu­esa Vicky Krieps dá aqui corpo e alma a uma figura puramente literária.

Para além do cinema, há então a música e dança (uma derivação do JiGG, festival de jazz que costumava acontecer nos jardins do Goethe), com concertos, uma performanc­e e uma festa; a literatura, que motiva conversas e uma exposição em torno de Franz Kafka (a partir de dia 6, a Cinemateca acolhe também um pequeno ciclo dedicado ao escritor); e a língua alemã, para os mais novos, será explorada em iniciativa­s como uma oficina de teatro, “mini aulas de alemão”, e até filmes juvenis, como a animação Fritzi eo drama Os Comuns, ambos notáveis produções exibidas na KINO.

Organizado em parceria com a Associação Il Sorpasso, o KULTURfest – Festival de Culturas de Expressão Alemã segue depois para outras cidades portuguesa­s, de entre as quais já estão confirmada­s Leiria (6 e 7 de fevereiro), Porto (de 8 a 10), Lagos (14 e 15) e Funchal (de 22 a 25).

Na versão lisboeta, o palco principal é o Goethe-Institut, que durante o fim de semana mantém a sua biblioteca aberta, promovendo ainda uma viagem pela Alemanha, em modo de realidade virtual, e inaugurand­o um novo restaurant­e no jardim: Wundergart­en.

Em suma, um espaço que se reafirma como ponto de encontro cultural não-exclusivo aos estudantes de alemão. Nas palavras da diretora: “O KULTURfest, para nós, tem um sentido de “portas abertas”, porque a verdade é que o Goethe já não é tão procurado como há uns anos. E nós queremos desmistifi­car, queremos convidar as pessoas a entrarem: somos uma casa aberta, os nossos jardins são espaço público! Não interessa nada se falam alemão. Queremos comunicar com uma nova geração através da cultura.”

Para além de cinema, há música, dança, concertos e literatura, que motiva conversas e uma exposição em torno de Franz Kafka.

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Vicky Krieps como Ingeborg Bachmann, no filme de encerramen­to do KULTURfest.

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