Diário de Notícias

O caso do assassino que o juiz desculpou

- TEXTO MANUEL CATARINO

Omeritíssi­mo corregedor de Viseu, magistrado com jurisdição sobre os outros juízes da comarca, era um juiz bondoso, compreensi­vo e justo – um juiz à antiga, mais antigo até que o espírito da doutrina penal do seu tempo.

O senhor corregedor, enrolado na dignidade da sua beca preta, firme na defesa da ordem e da disciplina, não condenou como um assassino o marido que matou a mulher: despachou-o com benevolênc­ia, em nome da moral e dos bons costumes, com a bagatela de dois anos de cadeia.

O caso mereceu notícia na edição do DN de hoje há 50 anos. O julgamento do resineiro de 30 anos, acusado de ter assassinad­o a mulher, de 20, decorreu ligeiro e apressado. Que o réu tinha cometido o crime – ninguém duvidava. Ele próprio o confessara. O que o tribunal queria saber era se havia testemunho­s em abono do marido assassino.

A mulher abandonara o lar, no lugar de Vilar do Monte, e fugira na companhia de homem que os autos identifica­m como um “saltimbanc­o”. Deixara o marido, segundo a acusação, e dois filhos menores. Terá andado de terra em terra com o saltimbanc­o. Mas cansou-se da vida ao deus dará, Até que regressou desiludida ao lugar de Vilar do Monte – onde o marido a assassinou.

Na primeira parte do julgamento, foram apreciados os depoimento­s de 20 testemunha­s. Oito eram da acusação e, mesmo essas, nada puderam declarar em desabono do bom comportame­nto do réu – homem trabalhado­r, exemplar chefe de família, esposo amantíssim­o, pai extremoso.

O juiz-corregedor da Comarca de Viseu deu por encerrada a audiência, satisfeito com o que ouviu das testemunha­s, e retirou-se para lavrar a sentença – que seria lida, naquela mesma sala do tribunal, no dia seguinte.

A notícia do DN destaca o seguinte passo da decisão do corregedor em referência ao réu: “Porque se justifica perfeitame­nte a reação violenta do réu contra a mulher adúltera, que abandonou o lar, o marido e dois filhos de tenra idade para seguir o saltimbanc­o, e uma vez provadas as acusações que lhe foram imputadas, o tribunal decidiu considerar o réu como autor material do crime de homicídio voluntário condenando-o na pena de dois anos de prisão.”

 ?? ?? CRISE O Governo decidiu aumentar o preço dos combustíve­is, pela segunda vez em dois meses, em virtude da carestia do petróleo imposto pelos países produtores. O anúncio da nova tabela, que entraria em vigor no dia seguinte, levou a uma corrida às bombas.
CRISE O Governo decidiu aumentar o preço dos combustíve­is, pela segunda vez em dois meses, em virtude da carestia do petróleo imposto pelos países produtores. O anúncio da nova tabela, que entraria em vigor no dia seguinte, levou a uma corrida às bombas.

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