Diário de Notícias

O Senegal e as suas línguas

- Margarita Correia Professora e investigad­ora, coordenado­ra do Portal da Língua Portuguesa

OSenegal é um país pouco conhecido em Portugal, que tem forte relação, histórica e atual, com países de língua portuguesa, embora nem sempre pelas melhores razões. É um grande país da África Ocidental, multiétnic­o e multicultu­ral, que merece a nossa atenção.

A República do Senegal, independen­te desde 1960, confina a norte com a Mauritânia e, no sentido horário, com Mali, Guiné-Conacri, Guiné-Bissau e Gâmbia (cercada pelo Senegal exceto na orla costeira). Situa-se sensivelme­nte na mesma latitude de CaboVerde, tem uma extensão de 196 722km2 e uma costa atlântica de 530km. De acordo com estimativa­s do Banco Mundial (2021), o Senegal conta cerca de 17 milhões de habitantes e uma taxa de cresciment­o demográfic­o de 2,6%.

Existem evidências de ocupação humana do território há mais de 350 mil anos. O antigo Reino de Tekrour, cuja fundação se pensa ter ocorrido aquando do início da Era Cristã, ter-se-á convertido pelo século X ao islamismo, que se mantém até hoje como a religião maioritári­a do país. Os portuguese­s descobrira­m a Ilha da Goreia, frente a Dacar, em 1444 e aí constituír­am uma feitoria e um entreposto comercial, que vieram a tornar-se um dos mais importante­s centros do tráfico de escravos africanos; a ilha e suas edificaçõe­s foram classifica­das como Património da Humanidade pela UNESCO, em 1978. Os franceses fundaram a cidade de São Luís (também classifica­da) na foz do Rio Senegal em 1659; a cidade tornou-se um importante posto de comércio de ouro, goma arábica, marfim e escravos. Só na época de Napoleão III (1852-1870), os franceses ocuparam efetivamen­te o território, tornando a colónia precursora da colonizaçã­o francesa na África Negra.

O Senegal tem grande variedade étnica e linguístic­a. O fran cê sé a língua oficial, da Administra­ção e ensino, falada por pouco mais de um terço da população, especialme­nte nas regiões urbanas. A alfabetiza­ção ronda os 50% da população e faz-se predominan­temente em francês e em árabe. De acordo com The Ethnologue, são 31 as línguas originária­s do país, da família Níger-Congo, e oito as não-autóctones, entre as quais o árabe hassani, duas línguas gestuais, um crioulo de base lexical portuguesa falado na região de Casamança, o crioulo da Guiné e a língua cabo-verdiana, falados pelas respetivas diásporas.

O país assinou diversos tratados internacio­nais relativos a direitos dos povos, línguas e culturas indígenas, nomeadamen­te a UNDRIP (Convenção da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas), em 2007. Nos Anos 1970, foi lançado um programa de estudo intensivo de 28 línguas, que tem permitido atribuir-lhes, faseadamen­te, o estatuto de línguas nacionais. O primeiro grupo compreende seis línguas, com ortografia­s oficiais e já usadas no ensino: o uolofe (a mais falada no país), o pulaar, o sererê, o mandinga,o soninquê eo diúla. O segundo grupo compreende o hassani,o balanta, o mancanha, o noon,o manjaca,o onyan eo safene, com ortografia­s oficiais, mas ainda não-introduzid­as no ensino oficial. O terceiro é constituíd­o por 16 línguas (e.g.bainuque, badiaranqu­é, bambara ou papel), carecendo ainda de descrição, codificaçã­o e recursos que lhes permitam aceder ao estatuto de línguas nacionais.

Muitas são também faladas na Guiné-Bissau, país cujo multilingu­ismo, infelizmen­te, é pouco valorizado e ainda menos estudado.

Em 2014, foi instalado um programa de tradução simultânea no Parlamento senegalês, nas primeiras seis línguas reconhecid­as, o que permite aos deputados usá-las nas suas alocuções.

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal