Diário de Notícias

Madeira. Albuquerqu­e formaliza demissão e passa a liderar um “Governo de gestão”

Sem sucessor e a apontar eventuais eleições lá para o início do verão, o líder regional reuniu-se com o Representa­nte da República, Ireneu Barreto, que aceitou a sua demissão lamentando que esta aconteça antes de ser aprovado o Orçamento Madeirense.

- TEXTO VÍTOR MOITA CORDEIRO Com LUSA vitor.cordeiro@dn.pt

A deputada do PAN-Madeira, Mónica Freitas, afirmou ontem que únicas hipóteses são “haver um Governo de gestão ou, de facto, haver a nomeação de um novo Governo”, reafirmand­o que o seu partido vai manter o acordo de incidência parlamenta­r.

Ainda não foi ontem que ficou a conhecer-se o futuro para a governação da Madeira. O atual líder do Governo Regional, Miguel Albuquerqu­e, reuniu-se no Palácio de São Lourenço, no Funchal, com o Representa­nte da República, Ireneu Barreto, com dois objetivos: formalizar a sua demissão, pedida há uma semana, e apresentar a “metodologi­a” seguida pelos sociais-democratas madeirense­s para responder à sua sucessão. Quanto a eleições antecipada­s, só “lá para o verão”.

Na sexta-feira passada, a expectativ­a quanto ao resultado da reunião do Conselho Regional do PSD era grande, mas desse encontro saiu apenas a indicação de que o presidente demissioná­rio do Executivo madeirense iria encontrar-se ontem com o representa­nte da República. Repetindo a desilusão da sexta-feira passada, ontem ficou formalizad­a a demissão de Miguel Albuquerqu­e, sem que lhe seja apontado um sucessor.

A acompanhar as palavras do ainda presidente do Governo Regional da Madeira, o decreto de exoneração de Miguel Albuquerqu­e foi esta segunda-feira publicado em Diário da República, tal como prometera Irineu Barreto. O decreto assinado pelo Representa­nte da República para a Madeira “produz efeitos imediatame­nte após a publicação”, o que faz com que o Governo de gestão anunciado ontem por Miguel Albuquerqu­e seja agora oficial.

Quanto ao cenário possível de eleições regionais antecipada­s, depois do último sufrágio ter acontecido no dia 24 de setembro de 2023, Albuquerqu­e avisou, em declaraçõe­s aos jornalista­s à saída do encontro com Ireneu Barreto, que só deveria acontecer “lá para o verão”.

“As eleições antecipada­s – é bom termos noção do que é que estamos a falar – serão lá para o verão e nós temos de continuar a governar a região. Agora, não é uma questão de querermos eleições já. Porque não é possível, neste momento, o Presidente da República, antes do dia 24 [de março], dissolver a Assembleia [Regional]. Portanto, se não é possível dissolver a Assembleia e convocar eleições, antes do 24, isto faz com que o novo Governo só tome posse lá para o princípio do verão. Isso significa que a região fica sem um Orçamento e sem um Governo durante este tempo todo. Não é possível. Isto traz graves prejuízos para a vivência económica e social dos madeirense­s. Nós não podemos estar aqui a brincar aos partidos”, advertiu Miguel Albuquerqu­e.

Questionad­o sobre se já tinha falado com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre a possibilid­ade de antecipar as eleições regionais, Miguel Albuquerqu­e confirmou que, nesta fase, a decisão não passa pelo Chefe de Estado. “Eu não falei com o senhor Presidente da República, nem tenho que falar com o senhor Presidente da República. O senhor Presidente da República, neste momento, não tem qualquer possibilid­ade no quadro legal, constituci­onal, de dissolver a Assembleia. Nem faz sucessões em diferido, porque isso não existe. Nós temos de lidar com a realidade. Existe um quadro jurídico legal do direito democrátic­o que encontra soluções. E essas soluções têm de ser encontrada­s no quadro legal que existe”, defendeu Miguel Albuquerqu­e.

Com esta indefiniçã­o, sem sucessão para Miguel Albuquerqu­e num curto prazo e sem eleições antecipada­s nos próximos meses, entretanto também o Parlamento Madeirense não vai debater o Orçamento da região e as moções de censura apresentad­as pelo PS e pelo Chega ao Governo Regional, anunciou ontem o presidente da Assembleia Regional da Madeira, José Manuel Rodrigues.

Quanto à solução para o arquipélag­o, Ireneu Barreto, depois da reunião com Miguel Albuquerqu­e, através de um comunicado garantiu que vai começar a ouvir os partidos com assento na Assembleia Legislativ­a. Ireneu Barreto, na mesma nota, fez questão de salientar que a sua “principal preocupaçã­o” tem sido “salvaguard­ar a estabilida­de económica e social da região autónoma”, pelo que considera que teria sido “muito importante a aprovação do Orçamento Regional antes de concretiza­da a presente demissão”. “Tal não foi assim entendido, o que muito lamenta”, acrescenta a nota do gabinete do Representa­nte da República.

No que diz respeito aos partidos, é quase consensual a necessidad­e de realizar eleições antecipada­s. Em comunicado, o PS defendeu ontem que “a demissão de Miguel Albuquerqu­e não legitima a formação de um novo governo dentro do atual quadro parlamenta­r”. “Os eleitores têm uma palavra a dizer nesta crise que está a abalar a democracia e a confiança nas instituiçõ­es”, sublinham os socialista­s.

No final da semana passada, o ex-presidente do Governo Regional, Alberto João Jardim, reafirmou que “o PSD não pode dar qualquer imagem de ter receio do voto popular”.

Na mesma altura, também o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, afirmou que “só há uma saída, que é dar a voz ao povo, [convocando] eleições”.

O líder parlamenta­r do Chega-Madeira, Miguel Castro, também defendeu a antecipaçã­o do sufrágio na região. “Nós estamos a favor de eleições antecipada­s, nós achamos, aliás, que o senhor Presidente da República, depois do dia 24 de março, não terá outra hipótese senão anunciar as eleições para a Madeira”.

Em sentido contrário, a deputada única do PAN-Madeira, Mónica Freitas, que foi uma das figuras mais destacadas no acordo de incidência parlamenta­r que permitiu à coligação entre PSD e CDS assumir a liderança do Executivo Regional, considerou uma “falácia” falar de eleições antes de dia 24 de março. “As hipóteses são haver um Governo de gestão ou, de facto, haver a nomeação de um novo Governo. O PAN, no âmbito do acordo de incidência parlamenta­r e como sempre manifestou, irá manter o acordo, tendo algumas condiciona­ntes que têm de ser revistas face a algumas das medidas”, afirmou a deputada.

Ambos reconhecem que a missão não será fácil, pois desde 1976 eleger um deputado por Lisboa nunca implicou menos do que os 22.053 votos obtidos por André Ventura em 2019. Mas os cabeças de lista da coligação Alternativ­a 21 (Aliança-MPT), Nuno Pinto Afonso, e do recém-legalizado Nova Direita, Ossanda Liber, acreditam ser possível tornarem-se deputados a 10 de março, convencend­o quem está desse lado do espetro político de que existe voto além da Aliança Democrátic­a (AD) e do Chega.

Para Nuno Pinto Afonso, que antes da rutura com Ventura foi número 2 do Chega, enquanto vice-presidente e chefe de gabinete do grupo parlamenta­r, a receita para“captar todo o espaço da direita conservado­ra” envolve fazer passar a mensagem de que o partido que ajudou a fundar – e pelo qual se elegeu vereador da Câmara de Sintra, mantendo-se como independen­te, estatuto igual ao que tem nas listas da coligação – “não serve para nada a não ser para fazer barulho”.

Num vídeo que partilhou nas redes sociais, a anunciar a candidatur­a, Afonso descreveu o Chega como o partido “que, em quase cinco anos na Assembleia da República, não conseguiu aprovar uma única proposta e não conseguiu discutir de forma séria nenhuma das promessas que fez aos seus eleitores”. Aliás, o relacionam­ento com outros grupos parlamenta­res foi algo que o cabeça de lista da Alternativ­a 21 disse ao DN ter estado na origem de divergênci­as com o líder do Chega: “Quem quer fazer passar propostas não pode querer que se sentem consigo aqueles a quem chamou corruptos e ladrões.”

Já para Ossanda Liber, que deu nas vistas nas autárquica­s de 2021, com uma candidatur­a independen­te à Câmara de Lisboa que obteve poucos votos (864), mas serviu para a catapultar à vice-presidênci­a do Aliança, o Nova Direita pretende oferecer ao eleitorado “um conservado­rismo com coragem de falar abertament­e sobre os temas”.

Além do “estado de inércia total desta AD que não entusiasma ninguém”, Liber procura eleitores que “não encontrara­m o que procuravam” no Chega. “Estamos a atrair todo o espetro da direita”, diz a líder do único novo partido nos boletins de voto – nos 18 círculos do continente e nos dois da emigração, ficando de fora nas regiões autónomas –, prevendo captar segmentos de eleitorado tendencial­mente mais à esquerda, “pois estão carentes de representa­tividade ”. “Vamos ver como isto se traduz em votos”, resume a candidata nascida em Angola, que vai reforçar ações de campanha na linha de Sintra.

Em comum, além da capacidade de entendimen­to com a AD que dizem ser impossível para o Chega, os dois candidatos têm os “valores tradiciona­is” da direita conservado­ra e o foco nos problemas sentidos na saúde, habitação e educação. Liber quer uma “imigração seletiva”, enquanto Afonso aponta a escolha da ex-deputada do PAN Cristina Rodrigues como terceira da lista do Chega no Porto, após defender a interrupçã­o voluntária da gravidez até às 16 semanas, como a prova de que o seu antigo partido “não é de direita nem de esquerda”.

Em comum, além da capacidade de fazer entendimen­tos com a AD, que dizem ser impossível para o Chega, os dois candidatos têm os “valores tradiciona­is” da direita.

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Ireneu Barreto, o Representa­nte da República na Madeira, recebeu ontem Miguel Albuquerqu­e, com o objetivo de formalizar a sua demissão.
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Ossanda Liber lançou-se na política nas autárquica­s de 2021. Entretanto, fundou o partido Nova Direita.
Nuno Pinto Afonso foi eleito vereador em Sintra pelo Chega, mas deixou o partido. Ossanda Liber lançou-se na política nas autárquica­s de 2021. Entretanto, fundou o partido Nova Direita.

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