Vendas dos supermercados crescem 12% para 13 551 milhões de euros
Consumidores gastaram mais 1,4 mil milhões de euros em 2023 face ao ano anterior, com os laticínios e congelados a subirem 14% e os produtos de mercearia 13%. As marcas da distribuição cresceram quase ao dobro do mercado. As chamadas marcas brancas têm já
As vendas do retalho alimentar cresceram, no ano passado, 11,7% para um total de 13 551 milhões de euros. Foram mais 1418 milhões do que em 2022, com praticamente todas as categorias de produtos a cresceram a dois dígitos, com exceção das bebidas alcoólicas, cuja variação em valor foi de 5%, e dos artigos de higiene para o lar, que valorizaram 6%. Laticínios, congelados e bebidas não-alcoólicas cresceram 14% em valor e os produtos de mercearia 13%.
Os dados são dos Scantrends da Nielsen IQ e mostram que, na estratificação das vendas em valor, 41% dos gastos das famílias nos súper e hipermercados foram em artigos de mercearia, correspondendo a quase 5556 milhões de euros, mais 642 milhões do que no ano anterior. Já os laticínios absorveram 17,5% das faturas, ou seja, a 2371 milhões de euros, mais 284 milhões do que em 2022. Por fim, os congelados foram responsáveis por 7,7% dos gastos, totalizando 1043 milhões de euros. Em 2022, estes produtos corresponderam a 7,5% da fatura total, ou seja, a 910 milhões.
Quanto às bebidas alcoólicas, e apesar de um aumento de 5% em valor, face ao ano anterior, o peso destes artigos na fatura global baixou dos 10,4% em 2022 para 9,7% em 2023. Significa isto que, perante o agravamento dos preços das bebidas alcoólicas, as famílias reduziram as suas compras deste tipo de produtos, gastando 1314 milhões, pouco acima dos 1262 milhões de 2022.
Os artigos de higiene pessoal e as bebidas não-alcoólicas mantiveram, grosso modo, o seu peso nos gastos totais das famílias, com 9,9% e 7%, respetivamente, mas, no caso dos artigos de higiene para o lar, cuja variação em valor face ao período homólogo foi de 10%, o seu peso diminui de 7,7% para 7,3%.
Destaque, ainda, para o peso das marcas da distribuição, as chamadas marcas brancas, na fatura total: era de 40,2% em 2022, passou a 44% em 2023. E no caso da alimentação, essa procura por produtos mais económicos foi ainda mais notória, com a quota das marcas da distribuição a crescerem mais de três a cinco pontos percentuais na mercearia, laticínios e congelados, atingindo quotas de 50,7%, 46,3% e 62,2%, respetivamente.
Não admira, por isso, que, num ano em que as vendas totais dos super e hipermercados aumentaram 11,7%, o aumento das marcas brancas foi de 22,3% contra os 4,5% das marcas de fabricante.
Pedro Pimentel, diretor-geral da Centromarca, a Associação Portuguesa de Empresas de Produtos de Marca, reconhece que 2023 foi um ano difícil. “Foi um ano claramente de perda, em que a marca própria ganhou quatro a cinco pontos percentuais de quota global, e conseguiu ir buscar às marcas de fabricantes um valor muito próximo dos mil milhões de euros”, diz. No entanto, reconhece que, com o evoluir da inflação, e por efeito também do IVA Zero, o consumidor “tornou-se menos ansioso” e passou a viver “mais adaptado ao contexto”. O “desacelerar” do crescimento das marcas de distribuição ao longo do ano “deixa alguma expectativa” quanto a 2024 e “alguma perspetiva” de que possa ser um ano “um bocadinho mais positivo”.
Já o diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição considera que os dados dos Scantrends da Nielsen mostram uma “cada vez menor fidelização” às várias insígnias, numa procura dos “melhores preços e promoções”, o que se traduz numa “procura crescente” pelas marcas próprias, resultado do menor poder de compra dos consumidores. Sem querer ainda fazer um balanço completo do ano, “numa altura em que ainda faltam muitos dados”, Gonçalo Lobo Xavier assume que “não foi um ano extraordinário” na medida em que, apesar das vendas terem aumentado, a “rendibilidade das empresas não cresceu”.
Sobre 2024, a APED destaca os aumentos de matérias-primas como o cacau ou os cereais, a instabilidade no Mar Vermelho, o prolongamento da guerra na Ucrânia e os protestos dos agricultores na Europa, para lembrar que “há um grau de incerteza muito grande e que provoca distorções no mercado, a que é preciso estarmos atentos”.
Recorde-se que o IVA Zero – medida negociada pelo Governo com a produção e o retalho alimentar como forma de mitigar os efeitos do disparar da inflação no arranque de 2023 – entrou em vigor a 18 de abril, num cabaz de 46 categorias de produtos alimentares, entre hortícolas, frutas, cereais, leguminosas, carne, peixe, ovos, laticínios e gorduras. Uma medida inicialmente pensada para seis meses, que foi depois alargada até ao final do ano e que acabou, oficialmente, a 4 de janeiro, quando foram repostos todos os preços nos escaparates já com a inclusão dos 6% de IVA respetivo (só o óleo vegetal é taxado a 13%).
Um mês depois da reposição do imposto sobre o valor acrescentado sobre estas 46 categorias de produtos, que, num hipermercado, podia representar mais de 12 mil produtos distintos, a convicção generalizada é que os preços voltaram a subir. A 9 de janeiro, a Deco Proteste avançava que, em quatro dias, 14 produtos já haviam subido acima dos 6% referentes ao IVA, com especial destaque para o iogurte líquido (+25,98%), óleo alimentar (+15,96%), atum posta em azeite (+10,53%) e pão de forma sem côdea (+9,79%). Já a Lusa apontava ontem para um aumento de quase sete euros com o fim do IVA zero, considerando que o cabaz passou de 174,13 euros a 19 de dezembro para 180,9 euros atualmente. Um aumento de 3,89%, abaixo dos 6% da reposição do IVA.
As famílias portuguesas ocupam, num grupo de 18 países analisados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o terceiro lugar das que mais recorreram às poupanças para fazer frente ao agravamento do custo de vida, uma condição imposta, sobretudo, pelo aumento abrupto das taxas de juro desde meados de 2022, e pela dependência do crédito bancário e indexação dos contratos a taxas variáveis, aliado aos níveis de rendimento disponível bastante mais baixos quando comparados com a maioria dos seus pares ditos “ricos”.
De acordo com o estudo intercalar sobre as perspetivas económicas (Outlook) do grupo dos países mais desenvolvidos (a OCDE, justamente, atualmente composta por 38 nações), as famílias portuguesas aparecem em terceiro lugar do grupo analisado (atrás das norte-americanas e das italianas) como as que mais usam as “poupanças em excesso” acumuladas durante a fase prévia de juros muito baixos, que durou seis anos até meados de 2022 (altura em que o BCE começou a subir taxas).
No caso de Portugal, a OCDE calcula que as famílias tenham consumido o equivalente a cerca de 1,5% do seu rendimento disponível em poupanças para aguentar o embate do aperto dos juros.
Em Itália, o segundo caso mais apertado, esse movimento vale mais de 2% do rendimento disponível. Nos Estados Unidos, o primeiro do ranking, o consumo das poupanças excessivas acumuladas ao longo de dois anos (até ao terceiro trimestre de 2023), está em quase 4%.
De acordo com a OCDE, o banco central norte-americano (Reserva Federal ) pode ter margem para começar a descer taxas de juro já no primeiro trimestre. O BCE começa a aliviar os juros mais tarde, mas provavelmente ainda antes do verão, projetam os economistas da organização sediada em Paris.
Seja como for, com os juros em máximos e mesmo que comecem a descer devagar (é esse o cenário da OCDE até ao final de 2024), as famílias devem ter de continuar a recorrer a poupanças para aguentar o embate da subida em flecha dos custos da dívida bancária.
Na Zona Euro, em média, o recurso às poupanças não aparece. Houve até um reforço (poupanças excessivas subiram) na ordem de 1,5% do rendimento disponível das famílias. Em Espanha aconteceu o mesmo, com um aumento da capacidade aforradora de 3,5%. França regista o melhor reforço dos 18 países, ligeiramente superior a 5% do rendimento familiar agregado.
Crescimento débil
No mesmo estudo a OCDE revê, com algum significado, as previsões de crescimento da Zona Euro e das duas maiores economias (Alemanha e França). A área da moeda única caminha agora para um crescimento débil, mais perto da estagnação, de 0,6% (revisão em baixa de 0,3 pontos percentuais). Os EUA beneficiam de uma revisão em alta de seis décimas, para um crescimento de 2,1% este ano. A inflação continua a ser revista em baixa, mas ainda não estará nos desejados 2%, como está no programa dos bancos centrais (BCE e Fed). A média projetada para a Zona Euro é de 2,6%; nos EUA, 2,2%.
Em termos de crescimento económico, a OCDE nota que “os resultados foram mais fracos em muitas outras economias avançadas, em particular na Europa, refletindo a importância do financiamento por parte dos bancos e a continuação dos efeitos adversos do choque dos preços dos produtos energéticos”.
“O crescimento também abrandou nos países em que as taxas de juro subiram e se refletiram rapidamente em taxas de juro mais altas”, observa a OCDE. É o caso de Portugal, onde a prevalência de contratos indexados a taxas de juros variáveis é muito alta, rondando quase 80% do total.
Famílias portuguesas aparecem em terceiro lugar entre 18 países como as que mais usam as poupanças acumuladas durante a fase de juros muito baixos, que durou seis anos até meados de 2022.