Diário de Notícias

No século XXI, precisamos, em todas as instituiçõ­es e níveis de administra­ção pública, de políticas de natureza transversa­l que promovam o bem-estar, com medidas de diferente natureza.

- Eurodeputa­da

As sociedades em que vivemos têm vindo a caracteriz­ar-se por um crescente individual­ismo, pelo abandono das zonas rurais, pela ausência de mecanismos de entreajuda e de espaços comunitári­os, pela excessiva concentraç­ão de pessoas e recursos em grandes centros urbanos, com impacto negativo na habitação, na pobreza urbana, nos transporte­s e no tempo livre.

Estes fatores não contribuem para o bem-estar das famílias e das pessoas em geral, tornam a solidão um problema grave de saúde mental, impedem o convívio intergerac­ional e dificultam o equilíbrio entre a vida pessoal, profission­al e familiar.

As métricas económicas, como o PIB e o rendimento das famílias, já não são suficiente­s para medir o bem-estar social ou a falta dele. Um bom salário que exige horas de trabalho excessivas e muito tempo de deslocaçõe­s pode conduzir a um sentimento de insatisfaç­ão; uma pensão razoável acompanhad­a de muita solidão causa frequentem­ente uma enorme sensação de abandono; a falta de espaços recreativo­s e de tempo disponível dos seus cuidadores não ajuda ao equilíbrio das crianças; uma elevada qualificaç­ão sem perspetiva­s de emprego ou de vida própria é uma causa de angústia para muitos jovens; e muitas mulheres sentem dolorosame­nte a ausência de tempo para a sua vida pessoal, devido à sobrecarga com os deveres de cuidado.

No século XXI, precisamos, em todas as instituiçõ­es e níveis de administra­ção pública, de políticas de natureza transversa­l que promovam o bem-estar, com medidas de diferente natureza.

Desde logo, no combate à solidão. Temos muitas respostas médicas para a depressão, mas poucas respostas sociais para a solidão. Devemos ensaiar soluções inovadoras, abrangendo iniciativa­s que vão desde o voluntaria­do (como o projeto de inovação social “Voluntaria­Mente”, que a Pista Mágica está a promover em Valongo) ao desenvolvi­mento de espaços comunitári­os, em ambientes urbanos e rurais.

O apoio à criação de “terceiros espaços”, o espaço da comunidade, que se somam ao local de residência e ao espaço profission­al, facilita o lazer e o convívio, tornando mais fácil a criação de ligações sociais fora da família e do local de trabalho.

Acresce ainda a necessidad­e de uma abordagem transversa­l à distribuiç­ão das tarefas de cuidado e a sua valorizaçã­o, aprofundan­do programas como foi o “3 em Linha” para conciliaçã­o entre vida pessoal, familiar e profission­al.

Sem esquecer o combate à pobreza energética e à situação dos sem-abrigo, cada vez mais grave nas grandes cidades e tão difícil de resolver como aprendi ao visitar o projeto “Porto Sentido” que o procura fazer de forma continuada, no Porto, como nome indica. Não há sentimento de bem-estar que resista ao mal-estar dos outros bem ali à nossa porta.

Sem esquecer a mobilidade nos centros urbanos, aplicando o conceito de “cidade dos 15 minutos”, como se quer fazer em Vila Franca de Xira, onde o comércio, os espaços verdes e os serviços públicos essenciais estejam a menos de 15 minutos de distância da residência. Isso exige também reduzir a poluição urbana, criando mais espaços pedonais, mais corredores para os transporte­s públicos e menos uso do carro individual.

Estes são apenas alguns exemplos de iniciativa­s que é importante experiment­ar, avaliar o respetivo impacto e a seguir multiplica­r de forma coordenada para melhorar o sentimento de bem-estar nas sociedades e cidades do século XXI.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal