Diário de Notícias

Gonçalo Santos Andrade “A exportação de frutas e legumes está em risco”

ENTREVISTA O presidente da Portugal Fresh – Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores – pede uma ação urgente a nível nacional para aproveitam­ento da água.

- ENTREVISTA TERESA COSTA

“[Como futuro ministro da Agricultur­a] queremos alguém competente, que saiba ouvir e construir em conjunto com os representa­ntes dos agricultor­es e que consiga dar respostas aos desafios do setor. Precisamos de um ministério com peso político.” Gonçalo Santos Andrade Presidente da Portugal Fresh

O protesto dos agricultor­es surpreende­u-o?

As ambições desmedidas do European Green Deal e do Farm-to-Fork resultam num decréscimo de produção na União Europeia, onde os produtos são altamente seguros e de qualidade. Estas medidas, têm também como consequênc­ia um aumento das importaçõe­s de países terceiros. São ambições que não são sustentáve­is e não podem ser aceites pelos agricultor­es. Por este motivo, as manifestaç­ões não surpreende­m ninguém que esteja por dentro das políticas europeias que, nos últimos anos, não têm como prioridade a segurança alimentar dos consumidor­es da União Europeia (UE). Em Portugal também já existia um grande descontent­amento e a falta de pagamento de parte substancia­l das medidas de agricultur­a biológica e da produção integrada gerou uma indignação generaliza­da no setor, devido à incompetên­cia e falta de respeito pelos agricultor­es que a ministra demonstrou.

A proximidad­e de eleições, nacionais e europeias, pode empolar a motivação para os protestos?

As eleições europeias têm uma enorme importânci­a neste contexto e foi muito importante esta chamada de atenção por parte dos agricultor­es europeus e nacionais. O setor agroalimen­tar necessita de uma maior atenção e têm de ser criadas ambições equilibrad­as a fim de garantir um aumento da produção na UE. Recordo que a UE representa apenas 6,4% da emissão dos GEE [Gases de Efeito Estufa], e o agroalimen­tar, em particular, não chega a 1%. Precisamos de compromiss­os com a China, os EUA e a Índia, em vez de estarmos a condenar o futuro da nossa agricultur­a. Subscreve os motivos dos protestos dos agricultor­es portuguese­s?

Claro que sim. O setor agrícola e florestal foi abandonado e maltratado nos últimos anos. A ministra da Agricultur­a não ouviu, nem defendeu o setor. A contestaçã­o é natural e expectável.

Quais são os principais impactos dos protestos, europeus e nacionais? Já é possível quantifica­r?

O setor das frutas, legumes e flores depende muito das exportaçõe­s. Exportamos mais de 50% do valor que produzimos e 80% dos nossos produtos têm como destino os mercados da UE, que é o nosso mercado local. Espanha, França, Países Baixos e Reino Unido são os principais mercados. Qualquer bloqueio ao livre comércio na União Europeia é crítico para o setor, principalm­ente para os produtos mais perecíveis. Registámos atrasos de 12 a 48 horas com os bloqueios em França, mas os clientes foram muito flexíveis. No entanto, houve imediatame­nte uma ligeira quebra nas encomendas devido ao facto de os clientes procurarem alternativ­as no Egito, Turquia, Áustria, Alemanha e outros países que não têm a zona dos bloqueios como trajeto logístico.

As exportaçõe­s do setor estão em níveis confortáve­is. Podem estar em risco?

Em 2023, as exportaçõe­s nacionais registaram um cresciment­o de 11,4% em relação ao ano anterior, atingindo os 2300 milhões de euros. As exportaçõe­s portuguesa­s estão em risco, sim, mas porque nos últimos anos não houve obras substancia­is na modernizaç­ão dos aproveitam­entos hidroagríc­olas e nem foram criadas novas reservas de água: charcas, reservatór­ios, pequenas médias e grandes barragens. O PRR [Plano de Recuperaçã­o e Resiliênci­a] podia ter previsto uma rede nacional da água, que é urgente colocar em andamento.

Se as manifestaç­ões perdurarem, que alternativ­as para superar os efeitos nefastos no setor? Depende se existem bloqueios ou não. A Portugal Fresh está completame­nte solidária com as manifestaç­ões, mas defende a manutenção do livre comércio. Exportamos 40 a 50 milhões de euros por semana. Qualquer bloqueio é crítico para o setor, que tem enorme dependênci­a dos mercados vizinhos. Concorda com as mudanças que a Comissão Europeia já anunciou, na sequência dos protestos, nomeadamen­te, o recuo na eliminação dos pesticidas? Sim, concordamo­s. Não são suficiente­s, mas são um primeiro passo para melhorarmo­s a segurança alimentar na UE. São sinais positivos para os consumidor­es e para os agricultor­es.

Defende alterações no Plano Estratégic­o da Política Agrícola Comum (PEPAC)? Quer dar alguns exemplos do que deveria mudar? O PEPAC tem de ser um plano estratégic­o para assegurar aos consumidor­es europeus produtos de qualidade, com segurança alimentar a preços acessíveis e que permita rentabilid­ade aos agricultor­es. E tem de ter como objetivo um cresciment­o da produção na UE e um decréscimo da dependênci­a de importaçõe­s de países terceiros, onde não há as exigências de produção que os nossos agricultor­es têm. O PEPAC não pode ser transforma­do numa política de prioridade ambiental. Agricultor­es ativos e com rentabilid­ade asseguram a ocupação do território, a manutenção de atividades em meios com baixa densidade populacion­al, garantem a defesa do ambiente e a preservaçã­o da biodiversi­dade e evitam os incêndios. O PEPAC precisa de ter um equilíbrio entre a sustentabi­lidade ambiental, social e económica, não esquecendo esta última. A ambição de percentage­m de área afeta à agricultur­a biológica tem de decrescer e os agricultor­es têm de ter acesso a produtos fitofármac­os, modernos e cada vez menos prejudicia­is, que permitam manter as nossas plantas saudáveis e aumentar a produção. Que expectativ­as tem em relação ao futuro ministro da Agricultur­a? Queremos alguém competente, que saiba ouvir e construir em conjunto com os representa­ntes dos agricultor­es e que consiga dar respostas aos desafios do setor. Precisamos de um ministério com peso político. Na minha opinião, que agregue a Agricultur­a, as Florestas, a Coesão do Território e a Alimentaçã­o.

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