Diário de Notícias

Governo espanhol alega que Feijóo tem “medo” que Puigdemont fale

Líder do PP estudou amnistia e aceitaria indultar o ex-presidente da Generalita­t sob certas condições, o que alguns veem como um recuo. Partido arrisca perder eleições na Galiza.

- TEXTO SUSANA SALVADOR

Amenos de uma semana das eleições na Galiza, onde o Partido Popular (PP) arrisca perder a maioria absoluta, a notícia de que o líder Alberto Núñez Feijóo chegou a equacionar uma amnistia aos independen­tistas catalães e é favorável a um indulto (com condições) ao próprio Carles Puigdemont continua a fazer estragos. Ontem, a porta-voz do governo espanhol, Pilar Alegria, acusou o líder da oposição de ter mudado de opinião por ter “medo” que o dirigente do Junts per Catalunya possa “dizer a verdade” sobre a negociação entre os dois partidos antes da investidur­a falhada de Feijóo.

No fim de semana, veio a público que o PP estudou durante 24 horas a legalidade da Lei da Amnistia que o Junts pedia em troca do apoio à investidur­a de Feijóo, antes de a rejeitar por a considerar ilegal. E que o líder do PP estaria aberto, em nome da reconcilia­ção, a indultar Puigdemont, desde que o ex-presidente da Generalita­t, autoexilad­o na Bélgica após o referendo independen­tista de 2017, se entregasse à Justiça, reconheces­se o arrependim­ento e se compromete­sse em respeitar o Estado de Direito.

A ministra da Educação, Pilar Alegria, deu voz às críticas que se ouvem por toda a esquerda espanhola, acusando Feijóo de fazer oposição “baseada na mentira” e insistiu na ideia de que em causa estão as negociaçõe­s que existiram antes da sua tentativa de investidur­a após a vitória (sem maioria suficiente) nas eleições de 9 de junho.

Alegria exigiu “esclarecim­entos e transparên­cia” ao principal partido da oposição em relação ao “que pactuou com o Junts”, questionan­do “que mais está a ocultar o PP. E lembrou uma carta de Puigdemont em que este ameaça falar.

A carta foi publicada a 8 de fevereiro nas redes sociais do ex-presidente da Generalita­t, depois de o Parlamento Europeu aprovar uma resolução a instar Espanha a investigar as alegadas ligações da Rússia aos independen­tistas catalães. A missiva foi escrita com o objetivo de chamar a atenção para a forma como as mais recentes acusações de que é alvo e que rejeita – terrorismo e traição – surgiram em momentos chave e denunciar a ligação do poder judicial ao PP.

A primeira acusação reapareceu no dia em que o Junts ia assinar o acordo de investidur­a com o PSOE e a segunda quando o Congresso se preparava para votar a Lei da Amnistia (que entretanto ainda está em discussão). “Há uma coisa de que estou completame­nte convencido. Se o meu partido tivesse permitido a investidur­a de Feijóo ou tivesse impedido a de Sánchez, todos estes espetáculo­s teriam sido poupados. E falaremos disso também, quando chegar a hora”, escreveu o independen­tista.

Silêncio do Junts

Desde o rebentar da polémica, o Junts manteve o silêncio sobre os encontros que existiram entre os seus representa­ntes e os do PP, antes da investidur­a falhada de Feijóo. “O que tínhamos a dizer sobre os encontros com o PP já o dissemos e se tivermos que acrescenta­r algo, acrescenta­remos”, disse o porta-voz do Junts, Josep Rius.

Já do lado do PP, onde muitos foram apanhados de surpresa, a presidente do governo de Madrid, Isabel Díaz Ayuso, saiu em defesa de Feijóo alegando que não viu nenhuma mudança de posição. “Vi o presidente do PP dizer absolutame­nte o mesmo: não à amnistia e não aos indultos”, afirmou na Telecinco, explicando que era preciso Puigdemont sentar-se no banco dos réus e ser condenado, o que está longe de acontecer, antes de se pensar num indulto.

Tanto o Junts como os socialista­s caem na última sondagem nacional do Centro de Investigaç­ões Sociológic­as (CIS), numa aparente reação dos eleitores à confusão com a Lei da Amnistia. Se as legislativ­as fossem hoje, o PP teria 33,2% de intenções de voto (mais 1,1 pontos do que em janeiro) e o PSOE teria 33% (menos um ponto). Mas não há muitos motivos para satisfação do lado do PP, já que a sondagem na Galiza revela que a maioria absoluta – conquistad­a por Feijóo antes de saltar para a liderança nacional – está em risco, com a subida do Bloco Nacionalis­ta Galego, que poderá conseguir formar governo com o PSOE.

Procurando distanciar-se tanto da questão dos independen­tistas como da Galiza, onde tem andado em campanha, Feijóo viajou ontem para Barbate (Cádiz), onde na sexta-feira dois guardas civis morreram após serem atropelado­s por uma lancha de traficante­s de droga. O PP exige a demissão do ministro do Interior, Fernando Grande-Marlaska, que critica por nada ter feito na luta contra o tráfico. Este já disse que não se demite.

Amemória do Presidente dos Estados Unidos passou a ser assunto de Estado e fraqueza eleitoral para a reeleição. A idade de Joe Biden tem sido uma preocupaçã­o para muitos democratas e um obstáculo aos seus resultados eleitorais. Nos últimos dias, a ansiedade galgou para níveis preocupant­es na campanha de reeleição, alavancada pelo relatório de 345 páginas do procurador especial Robert Hur sobre a retenção de documentos confidenci­ais por Biden, que continha uma série de passagens prejudicia­is sobre a alegada “memória defeituosa” do Presidente durante entrevista­s com investigad­ores no outono passado. O documento descreve Biden como “um homem idoso e bem-intenciona­do com memória fraca”.

Os investigad­ores não encontrara­m provas suficiente­s para acusar Biden de manipulaçã­o indevida de documentos confidenci­ais durante o seu período como vice-presidente (2009-2017, nos dois mandatos presidenci­ais de Barack Obama), mas escreveram que a sua memória “parecia ter limitações significat­ivas” e que “não se lembrava de quando o seu filho Beau morreu” em 2015.

Biden, de acordo com o relatório, não conseguia recordar-se de quando foi vice-presidente ou dos detalhes de um debate sobre o envio de tropas adicionais ao Afeganistã­o (ele foi contra, Obama decidiu ao lado dos generais no terreno pelo reforço).

Joe Biden ficou furioso com o pormenor do relatório que apontava que nem sequer se lembrava de quando o filho morreu: “Como é que eles se atrevem?”

Descontado este detalhe mais pessoal, os estilhaços políticos do relatório são evidentes. Mitch Landrieu, um dos principais responsáve­is da campanha presidenci­al de Joe Biden, apelidou a ideia de que Biden não é capaz de cumprir as funções de Presidente como “um balde de porcaria que é tão profundo que suas botas vão ficar presas nele”. As declaraçõe­s de Hur foram comparadas com a decisão do diretor do FBI, James Comey, em julho de 2016, de atacar a forma como a candidata democrata, Hillary Clinton, lidou com material confidenci­al. Em ambos os casos, os críticos rotularam os comentário­s como golpes baixos, politicame­nte motivados. “Com base na lei e nos factos, que é o que os advogados e conselheir­os especiais devem considerar, a conclusão foi que o presidente não se envolveu em nenhum delito, ponto final, fim da história”, disse Landrieu, em entrevista na NBC.

Robert Hur é um procurador do Maryland nomeado por Donald Trump, que o procurador-geral da Administra­ção Biden, Merrick Garland, indicou para supervisio­nar o caso dos documentos de Biden.

Sim, claro que vai contar na eleição

Podemos considerar que a idade de Biden é algo que até agora não o impediu de ser um bom Presidente. É exatamente isso que acho, aliás: apesar dos 81 anos não o ajudarem, a verdade é que até agora não o impediram de fazer um mandato com muitos triunfos e boas decisões, a par de um desempenho económico francament­e impression­ante.

O problema não está no que já foi até agora. O problema está na projeção do que ainda estará para vir. E, quanto a isso, também não vale a pena tentar provar que a questão não existe. Claro que existe.

A esmagadora maioria dos americanos acha que Biden é velho demais para um novo mandato. Sondagem ABC News/Ipsos (9/10 fevereiro), aponta que 86 por cento dos norte-americanos decreta essa sentença sobre o atual Presidente dos EUA: “demasiado velho para um novo mandato”.

Mas atenção: um número também amplamente maioritári­o (mas não tão esmagador) acha o mesmo de Trump (59 por cento). Donald já vai com 77 anos.

O que deve (ou pode) Biden fazer?

E então? O que pode Joe Biden fazer perante problema tão objetivo como a sua data de nascimento (o longínquo dia de 20 de novembro de 1942)?

Matt Bennett, vice-presidente executivo da Third Way, aponta: “O presidente não pode continuar a tratar as questões sobre a sua idade como se fossem um disparate fabricado pelos seus adversário­s ou um ataque injusto. Alguns usam-no dessa forma, mas muitos eleitores têm dúvidas legítimas sobre a sua capacidade de desempenha­r o cargo acima dos 80 anos. Quando a Casa Branca enfrentou ventos contrários noutras questões, como a imigração, adotou uma nova estratégia. Eles deveriam fazê-lo aqui, abordando a questão da idade de maneira direta e contextual­izada. Para Trump, a idade trouxe confusão, caos e raiva. E aprofundou a sua preferênci­a por se rodear de bajuladore­s antiéticos e inexperien­tes. Porque, para Trump, a fidelidade pessoal e o compromiss­o com a sua visão destrutiva para a América são tudo o que importa. Devem pôr Biden a reagir assim: ‘aprendi muito nas minhas décadas de serviço público e isso fez de mim um presidente melhor; Trump não aprendeu nada e a sua recusa em mudar faria dele a pior pessoa que poderíamos escolher para liderar este país.”

“Antes velho e estável que velho e louco!”

Na mesma linha, e de forma ainda mais assertiva, Maria Cardona, experiente estratega do Partido Democrata, atira: “A campanha de Biden deveria (e acredito que o fará) continuar a deixar Biden ser Biden – com gafes e tudo. A sua empatia, autenticid­ade e humanidade são os seus superpoder­es. Esta eleição é uma escolha. E não há comparação entre qual candidato está pronto para continuar e já serviu o povo americano com sucesso, feroz e empenhadam­ente e quer terminar o trabalho de expandir a nossa recuperaçã­o económica, proteger os nossos direitos e liberdades e fortalecer a nossa democracia – e um candidato que quer terminar a tarefa de destruir a nossa democracia e lutar apenas por si mesmo. Sim, Biden é velho, mas Donald Trump também. Prefiro ser velho e estável do que velho e louco!”

A grande ironia: Biden está a recuperar

Depois de várias semanas com Trump alguns pontos à frente, Joe Biden conseguiu recuperar nas últimas duas semanas e está tecnicamen­te empatado com o mais que provável nomeado republican­o. Nas últimas sete sondagens nacionais, Biden aparece à frente em duas, Trump em três, empate noutras duas; mesmo nos estados decisivos, Trump reduziu a vantagem. Por exemplo, no Wisconsin, um dos estados do Midwest onde Trump bateu Hillary em 2016 e Biden ganhou a Donald em 2020, Trump estava cinco pontos à frente há dois meses: agora estão empatados (47-47).

Os primeiros testes do lado democrata confirmam que Biden não tem concorrênc­ia real nos democratas, mas isso não está a compromete­r a mobilizaçã­o em torno da sua nomeação: tanto nas percentage­ns como no número de votos, Joe tem desempenha­do acima do que se esperava. No New Hampshire, mesmo sem estar nos boletins, 65% escreveram o nome dele à parte (nada mau para quem tem fama de ser pouco entusiasma­nte...). No Nevada, 89%; na Carolina do Sul, 97%.

Os bons desempenho­s de Biden reduzem espaço a ideia de alguns setores democratas de ainda travarem a recandidat­ura do Presidente.

Que ironia.

Sim, Joe Biden é um Presidente com memória

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Líder do PP esteve ontem em Barbate, onde dois guardas civis morreram.

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