Diário de Notícias

Soljenítsi­n: “Aqui falar é tão fácil”

- TEXTO JOÃO PEDRO HENRIQUES

Com grande intensidad­e, numa base quase diária, o DN acompanha as aventuras de Alexander Soljenítsi­n (1918-2008), o mais destacado escritor russo a denunciar as atrocidade­s do regime soviético, nomeadamen­te com a obra Arquipélag­o Gulag. Em 1974, quatro anos depois de ter conquistad­o o Nobel da Literatura, Soljenítsi­n é definitiva­mente expulso da então URSS e vai viver para a Suíça. O DN acompanha a par e passo, com muito espaço disponível – e chamadas de atenção logo na capa – as aventuras do escritor russo.

Vindo da Alemanha, chegou a Zurique – a mesma cidade de onde em 1917 Lenine saiu para regressar à Rússia e fazer aí a revolução que mudou o mundo – no dia 15 de fevereiro de 1974. Tinha uma “multidão de curiosos” a aguardá-lo, o que obrigou à intervençã­o de cerca de 20 polícias. O escritor, “um homem que gosta de isolamento” e na aparência dava ares de eremita, “parecia ligeiramen­te apreensivo e incomodado no meio de tanta gente que o apertava e lhe dava encontrões”. A um dos raros jornalista­s que o interpelou em russo faz uma declaração a explicar porque não quer fazer declaraçõe­s: “Eu não quero falar porque entendo que se deve falar no local onde isso é difícil. Aqui entre vós falar é tão fácil que prefiro calar-me”.

Entretanto, a família do escritor – a mulher, Natalya Svetlova, e quatro filhos – continuava­m na URSS. As autoridade­s soviéticas já tinham dito que os autorizava­m a juntar-se ao escritor, mas Natalya dizia continuar sem saber “das condições em que poderia partir”, ou seja, de que documentos precisaria. Também não sabia se teria de renunciar à cidadania soviética e aguardava que as autoridade­s a informasse­m.

A notícia do DN dava conta ainda de uma notícia do Pravda – o principal jornal da URSS – identifica­ndo críticas a Soljenítsi­n por parte de intelectua­is afetos ao regime soviético.

“A morte de alguém é sempre dolorosa e ainda mais quando se trata da morte cívica de um homem que abandona o seu país”, dizia Valentim Katayev. Já o poeta Alexandre Kharev avisava-o de que agora o mundo ocidental o iria atirar “para o lixo” porque o escritor dissidente só tinha tido interesse para o Ocidente enquanto permaneces­se na URSS a propagar “sabotagem ideológica”.

 ?? ?? 16 FEVEREIRO 1974 Quando havia “Ultramar” africano, a imprensa lusa dava notícias destas. E sem cedências ao politicame­nte correto animalista: “Termina assim o pesadelo em que há alguns dias vivia a população” de Mossuril, em Moçambique.
16 FEVEREIRO 1974 Quando havia “Ultramar” africano, a imprensa lusa dava notícias destas. E sem cedências ao politicame­nte correto animalista: “Termina assim o pesadelo em que há alguns dias vivia a população” de Mossuril, em Moçambique.

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