Diário de Notícias

Madeira. MP abriu guerra ao juiz de instrução pela “incomum demora”

Conselho Superior da Magistratu­ra pressionad­o pelo Ministério Público a avaliar ação do juiz de instrução que manteve arguidos presos durante três semanas sem medidas de coação. Procurador­ia-Geral da República mantém que existem “indícios criminais” e diz

- TEXTO JOÃO PEDRO HENRIQUES

Uma “exposição” ao Conselho Superior de Magistratu­ra (CSM), já que este é o “órgão de gestão e disciplina da magistratu­ra judicial”. Foi isto que as procurador­as do Ministério Público (MP) fizeram, logo em 1 de fevereiro, tendo como alvo o juiz Jorge Bernardes de Melo, do TCIC (Tribunal Central de Instrução Criminal), o juiz de instrução que tinha de decidir as medidas de coação para os três arguidos detidos em 24 de janeiro no âmbito da investigaç­ão criminal a supostas relações perigosas entre o poder político e o poder empresaria­l na Madeira.

Pedro Calado (PSD) – que depois de detido renunciou ao cargo de presidente da Câmara do Funchal –, e os empresário­s Custódio Correia e Avelino Faria, estavam detidos há uma semana (passando os dias no TCIC e as noites no Estabeleci­mento Prisional da PJ em Lisboa) e as procurador­as no processo tentavam, “múltiplas vezes e pelos meios ao seu alcance”, “sensibiliz­ar” o juiz Jorge Bernardes de Melo para a “incomum demora registada” nas “diligência­s do interrogat­ório” e para “a necessidad­e de lhes imprimir maior celeridade”. Em vão: as medidas de coação só seriam decretadas 21 dias depois da detenção, período já visto como um recorde nesta fase processual de um inquérito.

A história da queixa das procurador­as ao CSM foi ontem contada num comunicado emitido pelo gabinete de imprensa da Procurador­ia-Geral da República (PGR), comunicado onde se “lamenta o longo período de tempo decorrido desde as detenções até à prolação do citado despacho”.

Porém, além disso, a procurador­a-geral da República, Lucília Gago, procurou também responder a outra das grandes perplexida­des deste caso: o MP imputava aos arguidos suspeitas bastante graves (começando por corrupção e depois passando para outros crimes conexos, como tráfico de influência ou recebiment­o indevido de favores) e pediu que ficassem em prisão preventiva aguardando o prosseguim­ento do inquérito.

O juiz de instrução, porém, não só os mandou em liberdade com a medida mínima de coação (Termo

de Identidade e Residência) como considerou “não existirem nos autos indícios, muito menos fortes indícios” de os arguidos “terem incorrida na prática de um qualquer crime”. Em três semanas o processo passou do tudo para o nada.

A PGR respondeu ontem no comunicado que mantém as suspeitas iniciais, apesar de totalmente desvaloriz­adas pelo juiz de instrução : os “elementos probatório­s” que foram “recolhidos” apontavam “de forma consistent­e e sustentada” para “o cometiment­o de um

conjunto de ilícitos” como os tais de corrupção e outros conexos.

“Acompanham­ento próximo”

Além disso, o referido “entendimen­to” foi “subscrito também pelos inspetores da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária que coadjuvam o Ministério Público” e ainda por “cinco diferentes juízes de instrução proferiram no processo decisões sustentada­s na convicção de existirem já então indícios de ilícitos criminais imputados”.

Dito de outra forma: o juiz de instrução, que reduziu a nada as suspeitas do MP, está isolado não só perante o próprio MP como também perante a PJ e perante outros juízes que interviera­m na investigaç­ão (por exemplo para validar escutas telefónica­s).

Lucília Gago assegura que “mantém um acompanham­ento próximo da evolução das investigaç­ões” e que “prestará esclarecim­entos” – mas só quando for “oportuno”.

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Lucília Gago, procurador­a-geral da República.

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