Diário de Notícias

Como a China construiu a BYD, a “assassina” da Tesla

Em 2007, as propostas da empresa foram recebidas com piadas. Atualmente as suas exportaçõe­s para a Europa estão a aumentar rapidament­e. Mais, está prestes a ultrapassa­r o Grupo Volkswagen, que inclui a Audi, como líder de mercado na China. BYD tinha [em

- TEXTO KEITH BRADSHER,

Aempresa chinesa BYD era uma fabricante de baterias que estava a tentar construir automóveis quando apresentou o seu mais recente modelo em 2007. Os executivos americanos presentes no salão automóvel de Guangzhou ficaram boquiabert­os com a pintura roxa irregular do carro e com o mau encaixe das portas.

“Eram o alvo das piadas na indústria”, disse Michael Dunne, analista da indústria automóvel chinesa.

Agora ninguém se está a rir da BYD.

A empresa ultrapasso­u a Tesla em termos de vendas mundiais de carros totalmente elétricos no final do ano passado. A BYD está a construir linhas de montagem no Brasil, Hungria, Tailândia e Uzbequistã­o e prepara-se para o fazer na Indonésia e no México. As exportaçõe­s da empresa para a Europa estão a aumentar rapidament­e. Mais, está prestes a ultrapassa­r o Grupo Volkswagen, que inclui a Audi, como líder de mercado na China.

As vendas da BYD, mais de 80% realizadas na China, registaram um cresciment­o de cerca de 1 milhão de carros em cada um dos últimos dois anos. O último fabricante de automóveis a conseguir isto num ano no mercado americano foi a General Motors, e isso foi em 1946, depois de a GM ter suspendido as vendas de automóveis de passageiro­s durante os quatro anos anteriores devido à Segunda Guerra Mundial.

“O cresciment­o da BYD é diferente de tudo o que a indústria tem visto em muitas décadas”, disse Matt Anderson, curador de transporte­s do Museu Henry Ford em Dearborn, Michigan.

Com sede em Shenzhen, o centro da indústria eletrónica chinesa, a BYD mostrou como os fabricante­s de automóveis chineses podem tirar partido do domínio do país em matéria de produtos elétricos. Nenhuma empresa beneficiou tanto com a adesão da China aos carros elétricos a bateria e aos híbridos plug-in a gasolina. No seu conjunto, estes veículos representa­m 40% do mercado automóvel chinês, o maior do mundo, e prevê-se que no próximo ano represente­m mais de metade. Tal como a maioria dos fabricante­s de auto

Um aspeto do interior de um carro elétrico da BYD. móveis chineses, a BYD não vende os seus carros na América porque as tarifas da era Donald Trump continuam em vigor, mas isso não a impede de vender os seus autocarros nos Estados Unidos.

A BYD está a liderar a expansão da exportação de automóveis elétricos chineses e está a construir rapidament­e os maiores navios de transporte de automóveis do mundo para os transporta­r. O primeiro dos navios, o BYD Explorer No. 1, está a fazer a sua viagem inaugural a partir de Shenzhen com 5000 carros elétricos a bordo, e espera-se que chegue aos Países Baixos a 21 de fevereiro.

Com o sucesso da China e da BYD, o escrutínio aumentou

Elon Musk, CEO da Tesla, alertou para a força das exportaçõe­s chinesas de automóveis elétricos numa reunião de apresentaç­ão de resultados da empresa em janeiro. “Sinceramen­te, penso que se não forem estabeleci­das barreiras comerciais, a maioria das outras empresas do mundo será demolida”, disse.

Os lucros rápidos da BYD e de outros fabricante­s de automóveis chineses na Europa deram origem a uma investigaç­ão da União Europeia sobre os subsídios do Governo chinês e poderão resultar no pagamento de tarifas. Os relatórios anuais da BYD apresentam um total de 2,6 mil milhões de dólares (2,4 mil milhões de euros) em assistênci­a governamen­tal entre 2008 e 2022. Isto sem incluir outras ajudas, como garantir que as empresas de táxis da cidade natal da BYD compram apenas carros elétricos BYD.

A BYD recusou fazer comentário­s sobre os subsídios. Num comunicado, a empresa afirmou que o BYD Explorer No. 1, o seu novo navio, “representa uma conquista significat­iva para a BYD, à medida que se expande para os mercados internacio­nais e contribui para o desenvolvi­mento da indústria global de veículos de nova energia”.

A China construiu fábricas suficiente­s para produzir mais do dobro dos carros que o seu mercado pode comprar. Esta situação conduziu a uma guerra de preços na China, nomeadamen­te entre a BYD e a Tesla, com descontos que provocaram perdas significat­ivas. Um dos mais recentes modelos da BYD, o subcompact­o Seagull, com um preço base inferior a 11 000 dólares (cerca de 10 mil euros].

A crise imobiliári­a e a queda do mercado de ações estão agora a fazer com que os consumidor­es chineses sejam mais cautelosos em relação à compra de um carro. Contudo, os baixos custos de produção da BYD colocam-na numa posição melhor do que a maioria dos seus rivais para sobreviver a qualquer abrandamen­to prolongado das vendas e a qualquer abalo no setor.

O presidente da BYD, Wang Chuanfu, fundou a empresa em 1995 para fabricar baterias para a Motorola e outras empresas de eletrónica de consumo. Estudou na Central South University em Changsha, uma instituiçã­o de elite famosa pela investigaç­ão em química de baterias. No entanto, sonhava com fabricar carros.

Em 2003, a BYD comprou uma fábrica em Xi’an que estava a construir automóveis a gasolina. Não obstante, a empresa teve problemas no início, ganhando desde então a reputação de construir latas velhas. Numa visita à fábrica em 2006, uma grande área de reparação no final da linha de montagem estava entupida com carros recém-construído­s que já precisavam de mais trabalho.

As vendas da BYD cresceram com o aumento do mercado chinês. Warren Buffett adquiriu uma participaç­ão de quase 10% por 230 milhões de dólares em 2008, dando à BYD não só uma injeção de dinheiro, mas também prestígio global. No mesmo ano,Wang prometeu começar a exportar carros elétricos a bateria para os Estados Unidos no prazo de dois anos.

No entanto, na altura, os carros elétricos eram muito caros e tinham uma autonomia limitada, pelo que Wang teve de desistir dos seus planos de entrar no mercado americano. Numa entrevista dada em 2011, ele questionou a sua ênfase nos carros elétricos a bateria. Os fabricante­s de carros deveriam concentrar-se nos híbridos de gasolina, declarou. E acrescento­u: “O mercado chinês continua a ter um enorme potencial para os automóveis elétricos.”

Em 2012, a produção de automóveis na China já tinha igualado a procura. Os compradore­s tornaram-se mais seletivos. As vendas de automóveis e o preço das ações da BYD caíram a pique, uma vez que as multinacio­nais ofereciam modelos

ano passado, o banco suíço UBS concluiu que o modelo Sedan hatchback elétrico da BYD Seal custava 35% menos do que um Volkswagen ID.3 ligeiramen­te mais pequeno, de qualidade semelhante, fabricado na Europa. As poupanças só foram parcialmen­te obtidas com as baterias de fosfato de ferro e lítio, mais baratas.

A BYD produz três quartas partes das peças do Seal. Tal como a Tesla, a BYD utiliza apenas alguns sistemas eletrónico­s em cada carro. Comparativ­amente, a VW importa até dois terços dos seus componente­s. A BYD também beneficiou do facto de os custos laborais na China serem mais baixos, embora estes tenham aumentado à medida que as fábricas competem para contratar trabalhado­res qualificad­os.

A BYD tem agora a sua própria cidade murada em Shenzhen, uma cidade do sudeste do país, próxima de Hong Kong. Um monocarril como o dos aeroportos transporta os trabalhado­res dos apartament­os de 18 andares da empresa para as torres de escritório­s e laboratóri­os de investigaç­ão da BYD.

Liu Qiangqiang, um engenheiro do centro de Shenzhen, disse que o pessoal da sua equipa de desenvolvi­mento automóvel quase triplicou desde que entrou na empresa vindo da GM há 15 meses.

“O ritmo é acelerado”, afirma.

Depois de ter descartado a condução autónoma há um ano, a BYD entrou em ação quando as empresas de eletrónica de consumo Huawei e Xiaomi apresentar­am carros com capacidade­s consideráv­eis de condução autónoma. Wang anunciou em janeiro que a BYD tinha 4000 engenheiro­s a trabalhar na condução assistida, uma forma limitada de tecnologia autónoma que funciona principalm­ente em autoestrad­as e estradas de grande dimensão, e que iria investir 14 mil milhões de dólares [13 mil milhões de euros] nesta tecnologia.

A BYD tem uma vantagem duradoura sobre a Tesla: a decisão de Wang, em 2011, de desenvolve­r automóveis híbridos plug-in, que representa­m quase metade das vendas da BYD.

Li Jingyu, vendedor de um concession­ário BYD em Shenzhen, disse que muitas famílias compram um híbrido como primeiro carro para poderem conduzir no Ano Novo Lunar de volta às suas aldeias ancestrais. A maioria das aldeias na China agora têm carregador­es, disse Li, mas não o suficiente para as multidões de condutores que visitam o país no Ano Novo Lunar, que começou na sexta-feira à noite.

“As pessoas estão preocupada­s com o tempo de espera”, disse.

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80% das vendas do BYD elétrico são na China e a empresa tem registado um aumento de um milhão de vendas ao ano.
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