Nenhum dos grandes bancos baixa comissões aos clientes em 2024
Instituições não se comprometem com descidas nos preçários, levando Deco a denunciar “falta de consciência social”, num contexto de juros altos e perda de rendimentos das famílias. Associação critica supervisor, dizendo esperar uma atitude mais interventi
Receitas de comissionamento totalizaram, pelo menos, 2,17 mil milhões de euros, em 2023.
Atabela de preços relativa às comissões de manutenção de conta, anuidade do cartão de débito e transferências bancárias mantém-se até agora inalterada nos principais bancos a operar no país, havendo apenas uma exceção, de acordo com um levantamento efetuado pela Deco Proteste para o DN/Dinheiro Vivo. Enquanto os preçários do BPI, Caixa Geral de Depósitos (CGD), Millennium BCP, Montepio e Santander não sofreram variações até janeiro de 2024, face ao igual mês do ano anterior, o do Novobanco subiu.
No entanto, embora não se tenham verificado aumentos na maioria das instituições, a organização para a defesa do consumidor considera incompreensíveis os valores que se continuam a cobrar em pleno tempo de altas taxas de juro, acusando mesmo a banca nacional de ter “falta de consciência social”.
Justificando-se com a necessidade de aproximar os valores por si cobrados aos do mercado, o banco presidido por Mark Bourke agravou a comissão mensal da sua principal conta à ordem em 27%, para os clientes sem acesso às bonificações, e 29%, para os que delas beneficiam. Contudo, nota Nuno Rico, especialista em assuntos financeiros da Deco Proteste, apesar de não existir, de momento, conhecimento de futuras alterações de preçário nas restantes instituições bancárias, “não será de excluir que as mesmas possam vir a ser anunciadas nos próximos meses, à semelhança do que já aconteceu no passado”.
No início deste mês, a CGD anunciou que não irá aumentar o custo dos seus serviços, à luz do que já tinha feito no ano passado, “com o intuito de ajudar as famílias portuguesas a manter o orçamento num contexto de elevada inflação”. Embora a decisão de não passar para os clientes a subida acumulada dos preços de 12,1% (registada em 2022-23) tenha um impacto direto nas receitas encaixadas por esta via, o banco público diz-se consciente da poupança que a mesma representará para os consumidores no acesso aos serviços bancários.
Por forma a perspetivar modificações futuras, o DN/DV contactou os demais bancos: se, por um lado, o BCP optou por não comentar “a sua política comercial”, o BPI admitiu o ajuste periódico do preçário “para refletir os custos de serviços e operações”, recordando, contudo, que ,“apesar do contexto inflacionário, não houve alterações relevantes” até ao dia de hoje – ainda assim, a instituição pertencente ao grupo espanhol CaixaBank não fechou totalmente a porta, dizendo não fazer “antecipações sobre hipotéticas alterações”. O Santander e o Montepio não responderam até ao fecho desta edição.
Ainda que não se confirmem mais oscilações nas tabelas de comissões ao longo de 2024, o mesmo economista alerta que não se pode “deixar de apontar que nos últimos tempos, mais do que aumentos nominais nos valores das comissões, temos vindo a assistir a outras formas indiretas de agravamento de custos para o consumidor, nomeadamente através de reduções de isenções ou dificultando o acesso às formas de bonificação das comissões”. As referidas alterações no preçário anunciadas pelo Novobanco, acrescenta, “são um exemplo desta prática, além do próprio aumento no valor das comissões”.
Em 2022, as receitas de comissionamento conjuntas dos seis grandes bancos ascenderam aos 2,55 mil milhões de euros, na sequência de uma subida significativa dos juros. Já no ano passado, totalizaram, pelo menos, 2,17 mil milhões, não contabilizando o quarto trimestre da Caixa Geral de Depósitos e do BCP, uma vez que ainda não tornaram públicas as contas do exercício. Facto é que os números já conhecidos revelam uma quase duplicação da margem financeira em algumas das instituições – e se, por um lado, esta variação é justificada pelo comportamento das taxas de juro nos mercados, “o mesmo já não se pode dizer no que respeita aos resultados relativos à cobrança de comissões aos clientes bancários”.
Nos tempos das taxas de juro baixas, as reduzidas margens eram o argumento apresentado pelos bancos para justificar os constantes aumentos das comissões, mas, agora, “é incompreensível que os valores cobrados aos clientes expressem uma redução residual, aumentando inclusive em alguns casos, apesar das várias proibições e limitações introduzidas pela legislação durante o ano passado”, critica Nuno Rico.
Assim, considera o especialista da Deco Proteste, num cenário em que as prestações do crédito à habitação subiram cerca de 80%, face há dois anos, a atitude da banca nacional, além de ser “um excelente exemplo de alguma ausência de consciência social, tantas vezes por si apregoada”, revela que, perante a ausência de autorregulação, “só tem sido possível controlar alguns dos encargos suportados pelos clientes” por via legislativa.
Já em relação ao supervisor, o Banco de Portugal, acrescenta, seria de esperar uma atitude mais interventiva nesta matéria: “A relativa passividade demonstrada ao longo do tempo permitiu que, por exemplo, durante vários anos se cobrassem comissões, como a do processamento das prestações de crédito, que não encontrava enquadramento no estabelecido na Lei n.º 66/2015, no que respeita à justificação da sua existência.”