Calçado está de volta à Micam com as malas dos apoios vazias
A transição entre quadros comunitários está a atrasar os pagamentos dos projetos conjuntos de internacionalização. De 2023 ainda só foi executado 70% do plano de promoção.
Anova ronda de presença das empresas exportadoras em feiras internacionais arrancou em janeiro, quando muitas delas ainda não receberam os apoios comunitários referentes aos certames de setembro de 2023. É o que acontece com os 68 expositores de calçado e componentes que esta semana estão em Milão a participar na Micam, Mipel e Lineapelle, as três feiras por excelência desta fileira. A associação do setor, a APICCAPS, garante que o problema está nesta fase de transição em que o novo quadro comunitário de apoio ainda não arrancou em pleno. Do gabinete do Compete 2030 vem a garantia de que “todos os pedidos [de pagamento] que foram submetidos foram analisados e pagos”.
Em causa estão os projetos conjuntos de internacionalização cujo 1.º aviso do mecanismo extraordinário de antecipação de verbas do Portugal2030 fechou a 31 de janeiro de 2023. As primeiras aprovações surgiram apenas em junho e os pagamentos, em setembro, ainda não tinham começado a ser feitos. O secretário de Estado da Economia, que visitou então a feira, prometeu que os pagamentos seriam feitos “nas próximas semanas” e anunciou mais 150 milhões de euros em novos apoios, 90 milhões para a internacionalização e 60 milhões para formação.
Seis meses depois, diz a APICCAPS que já recebeu o adiantamento do projeto que submeteu em dezembro de 2022, e que contemplava investimentos totais de 10 milhões de euros para a promoção internacional do calçado, suportados em cerca de 50% pelos fundos comunitários. O adiantamento, na ordem dos 10%, já foi pago, “faltam os pedidos de pagamentos regulares que devem estar para sair”, diz João Maia, diretor-geral da associação. E acrescenta: “Efetivamente, há aqui algum atraso, mas não é nada de transcendente em relação ao que habitualmente vivemos”. A participação numa feira pode implicar custos que vão dos 10 mil aos 30 ou 40 mil euros.
A APICCAPS apresentou, entretanto, já uma nova candidatura ao Compete 2030 para as ações de promoção este ano, no valor de sete milhões de euros, mas que aguarda aprovação.
“Não executámos na totalidade os 10 milhões do projeto de 2023, que terminava a 31 de dezembro, pelo que solicitámos a sua prorrogação para janeiro e fevereiro, o que dá confiança às empresas, nesta participação nas feiras agora, que irão receber o dinheiro, porque a candidatura está aprovada. O importante, aqui, é que se comece a criar um horizonte regular para que os projetos sejam aprovados a tempo de as empresas tomarem as suas decisões de investimento em feiras para o semestre seguinte”, diz, sustentando tratar-se de uma questão de confiança que dê capacidade de decisão às empresas.
Candidaturas à formação estão a decorrer
Da parte do gabinete do Compete 2030, a informação avançada é que, dos 27 projetos conjuntos de internacionalização aprovados ao abrigo do 1.º aviso do mecanismo extraordinário de antecipação de verbas do Portugal2030, com incentivo total de 45,5 milhões de euros, dos quais 44,3 milhões financiados pelo Compete – o restante fica a cargo dos programas Lisboa-2030 e Algarve2030 –, já foram pagos 2,7 milhões de euros a 10 entidades. Mais, “todos os pedidos [de pagamento] que foram submetidos foram analisados e pagos”, diz fonte oficial, sem especificar os setores em causa.
Quanto ao 2.º aviso, que fechou no final de janeiro de 2024, e que contava com uma dotação total de 18 milhões, foram submetidos 14 projetos conjuntos de internacionalização, que envolvem mais de 700 empresas e com um valor de investimento elegível em candidatura de 36,8 milhões de euros.
Quanto aos novos apoios anunciados pelo secretário de Estado da Economia, Pedro Cilínio, em setembro, quando visitou as empresas de calçado em Milão, no âmbito da formação para as indústrias estratégicas, indica o gabinete do Compete 2030 que estão abertos, desde 2023, dois avisos – formação empresarial clusters, individuais e conjuntos – e que têm uma dotação de 20 milhões de euros. Aos apoios às operações individuais foram já submetidos 121 projetos, com um total de investimento elegível de 32,5 milhões de euros. Para as operações conjuntas não há ainda candidaturas. O prazo para submissão de projetos termina a 29 de fevereiro.
Promoção ainda longe do “desejável”
Mesmo assim, o setor do calçado não conseguiu cumprir o plano de promoção a que se tinha comprometido em 2023. Dos 10 milhões de investimento previstos, só cerca de 70% terão sido executados. Os três milhões que faltam estão a ser usados até ao final de fevereiro. E, por isso, o projetoconj unto de internacionalização submetido pela APICCAPS para 2024, e que aguarda aprovação, prevê um investimento de sete milhões de euros. Mas o objetivo do setor é realizar, este ano, 53 iniciativas no estrangeiro, que comparam com as 38 realizadas em 2023 e as 28 feitas em 2022.
“Apesar de se começar a assistir a um reforço da atividade promocional das empresa, e basta ver que temos hoje 35 expositores de calçado na Micam, contra os 33 que tivemos em setembro, mas acreditamos que ainda não estamos a fazer o suficiente. Temos de reforçar a atividade promocional para que o setor possa aproveitar as oportunidades que existem”, defende o diretor de Comunicação da APICCAPS.
O ano de 2023 foi de retração das exportações, que caíram 8,2% para 1839 milhões de euros, sendo que o atraso nos pagamentos dos fundos europeus complica a atividade das empresas, que se confrontam com muitas dificuldades de Tesouraria. “Ser-se empresário neste setor é muito difícil. As empresas estão hoje a produzir calçado que só irão entregar em agosto, mas já tiveram de avançar com a compra das matérias-primas e de suportar todos os gastos associados à atividade produtiva. E, na melhora das hipóteses, irão receber o pagamento dessa encomenda lá para novembro, dez meses depois, ou mais. É um hiato de muito tempo”, diz Paulo Gonçalves.
MUNICÍPIO DO SEIXAL