Diário de Notícias

“Espero que o Diogo nos continue a impression­ar. Já mostrou que tem nível internacio­nal”

Alexandre Yokochi, o homem que detinha os melhores resultados na Natação Portuguesa, está rendido ao Bicampeão Mundial. Espera que o mediatismo de Diogo Ribeiro ajude a captar mais jovens e pede mais infraestru­turas.

- TEXTO ANDRÉ CRUZ MARTINS

Équase uma passagem de testemunho. Alexandre Yokochi foi durante décadas a maior referência de Portugal na Natação, Vice-campeão Europeu em 1985 em Sofia e 7.º classifica­do nos 200 metros bruços nos Jogos Olímpicos de Los Angeles 1984. Hoje, com 59 anos, a residir nos EUA, é com enorme satisfação que vê despontar o jovem Diogo Ribeiro, que em poucos dias se sagrou Campeão Mundial nos 50 e 100 metros mariposa nos Mundiais do Qatar e colocou Portugal no mapa da modalidade.

“Se fiquei surpreendi­do? Nada, nada! Qualquer atleta tenta sempre suplantar os resultados anteriores e, nas condições certas, brilhar ao mais alto nível em grandes provas. Como ainda é jovem, terá oportunida­de de continuar a melhorar os resultados durante vários anos”, referiu ao DN, a partir da cidade de Waco, no estado do Texas, país onde vive há mais de 30 anos e onde é professor e investigad­or universitá­rio na área da Energia.

Alexandre Yokochi acredita que Diogo vai voltar a estar em grande plano no verão, nos Jogos Olímpicos de Paris. “Estará focado nessa competição, que será a principal de 2024, e espero que ele nos continue a impression­ar, pois já demonstrou, de forma clara, que tem nível internacio­nal”, destacou, nada incomodado com o facto de ter deixado de ser o detentor dos melhores resultados internacio­nais da história da Natação Portuguesa, “pois, enquanto Nação, é do interesse de todos que haja progresso sobre o passado”.

Quando assistiu pela televisão às fantástica­s atuações de Diogo Ribeiro, em Doha, Yokochi não deixou de estabelece­r pontos de contacto com os feitos que obteve enquanto jovem, mas com diferenças significat­ivas. “Na minha época, não havia problemas com o sucesso e com a atenção do resto da sociedade, podia-se facilmente ignorar essas questões. Agora, com as redes sociais, aparenteme­nte haverá mais pressões, mas na verdade não sei, pois continuo a não usar essas redes sociais. O meu conselho é que o Diogo continue a confiar nas pessoas com mais história que o apoiaram até agora e que ignore os ‘amigos’ que irão aparecer de repente… E que use este episódio para o ajudar a desenvolve­r-se num homem completo”, diz.

Mais condições para a Natação

Diogo Ribeiro trabalha no Centro de Alto Rendimento do Jamor, com o treinador Albertinho, o homem que moldou César Cielo e Thiago Pereira, atletas Medalhados Olímpicos pelo Brasil. Uma realidade bem diferente da de Yokochi.

“Na minha era: treinávamo­s seis horas por dia, entre a manhã e a tarde, fazíamos cross-training, geralmente na piscina do estádio do Benfica, e no verão podíamos utilizar a piscina dos Olivais, por ser de 50 metros. Com um número variável de colegas de equipa, em média uns 20, que se dividiam em duas pistas – o nosso problema era a coordenaçã­o entre o horário escolar e os estudos. Eu tinha aulas no Instituto Superior Técnico, algures entre as 8.00 e as 19.00 horas, e ainda havia a dificuldad­e dos transporte­s públicos entre os locais (casa, piscinas, escola e, para alguns, trabalhos)”, lembrou.

Yokochi acredita que Portugal vai capitaliza­r estes grandes resultados do jovem campeão para desenvolve­r a modalidade. “É preciso continuar a manter a natação como um desporto de interesse nos jovens. E projetar instalaçõe­s que deem oportunida­de para participar­em neste desporto, sem colocar barreiras artificiai­s à participaç­ão, como por exemplo requerer certificad­os médicos para usar as piscinas. Peço às entidades portuguesa­s que ajudem a manter instalaçõe­s que permitam aos jovens desenvolve­rem hábitos saudáveis, por exemplo na zona onde eu morava, nas instalaçõe­s do Sport Algés e Dafundo, onde aprendi a nadar”, contou.

“A Natação portuguesa sempre teve bons resultados, pois estabelece­u muitas amizades entre jovens e ajudou-os a desenvolve­rem-se de uma forma saudável e como indivíduos. Mas sem grandes vitórias em Campeonato­s Internacio­nais. Agora, com a ajuda do mediatismo do Diogo, espero que cresça o interesse dos jovens e do Governo em desenvolve­r infraestru­turas que permitam a atividade física para pessoas de todas as idades”, acrescento­u.

Como professor de Engenharia, até estabelece­u, nas palavras do próprio, “uma versão analítica” que ajudará nesta questão. “A probabilid­ade de desenvolve­r um atleta ao nível do Diogo é o produto de várias outras probabilid­ades: de um jovem ter interesse em participar neste desporto e ter oportunida­de de participar, podendo nadar numa piscina em condições, bem como da probabilid­ade de poder continuar na modalidade, que envolve questões como precisar de trabalhar ou dificuldad­es de compatibil­ização com o horário escolar. Sem instalaçõe­s, a probabilid­ade de sucesso é zero e, da mesma maneira, sem interesse dos jovens, a probabilid­ade mantém-se a zero, mesmo que haja piscinas ao alcance fácil de todos”, explicou.

A terminar, deixou uma mensagem a Diogo Ribeiro. “Que continues focado no resultado final, sem prestar atenção a distrações, tanto na natação como na vida que há de vir mais tarde”, concluiu.

Alexandre Yokochi Antigo nadador

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Diogo Ribeiro conquistou o Ouro nos 50 e 100 metros mariposa nos Mundiais de Doha.
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