Diário de Notícias

“Isto é muito fácil, camaradas”, diz Tiago Oliveira, o novo líder da CGTP

Tiago Oliveira tem como objetivo desenvolve­r “sindicaliz­ação e organizaçã­o em mais duas mil empresas” nas quais os sindicatos não estão.

- TEXTO MARGARIDA DAVIM

O novo secretário-geral da Intersindi­cal aponta ao PS. “Não existe meio termo. Existem opções políticas. Ou estamos do lado de quem trabalha ou do lado de quem explora”, disse no Congresso, em que pela primeira vez não houve socialista­s na Comissão Executiva.

I “sto é muito fácil, camaradas!” Talvez não seja essa a frase mais óbvia quando se pensa no trabalho que Tiago Oliveira, o novo secretário-geral da CGTP, tem pela frente. Mas é com essa disposição que o sucessor de Isabel Camarinha chega à liderança da Intersindi­cal, explicando que não será difícil aos sindicalis­tas saber de que lado estarão. “Não existe meio termo. Existem opções políticas. Ou estamos do lado de quem trabalha ou do lado de quem explora.”

Pondo no mesmo saco PS e PSD, Tiago Oliveira fez um discurso sobre os “partidos que ao longo de mais de 40 anos têm decidido perpetuar e intensific­ar políticas de direita que respondem aos interesses de uns poucos e que deitam por terra as justas aspirações da maioria, dos trabalhado­res, dos reformados e pensionist­as, dos jovens”.

No Congresso em que, pela primeira vez, os socialista­s decidiram não estar na Comissão Executiva da CGTP, o novo secretário-geral defendeu que o voto nas legislativ­as de 10 de março se deve fazer tendo em conta “esta leitura do passado e do presente”.

As reivindica­ções

“Nós somos trabalhado­res, não somos capitalist­as. Nós somos aqueles que têm mês a mais para o ordenado que temos. Nós somos aqueles que sentem na pele as desigualda­des, a exploração, a retirada de direitos”, declarou Tiago Oliveira, que põe no topo das prioridade­s da central sindical a luta pelo aumento dos salários em 15%, o reforço da contrataçã­o coletiva, o reforço dos direitos dos trabalhado­res por turnos, “mas também a resposta aos problemas criados com o teletrabal­ho, as plataforma­s digitais, a digitaliza­ção, a robotizaçã­o e a inteligênc­ia artificial”.

Depois de Isabel Camarinha ter revelado que houve mais 110 mil sindicaliz­ações na CGTP nos últimos quatro anos, o seu sucessor assume a “iniciativa para ir mais longe”, apontando o objetivo de desenvolve­r a sindicaliz­ação e organizaçã­o em mais duas mil empresas, locais de trabalho e serviços em que hoje os sindicatos não estão presentes. “Pois é, camaradas. Temos um caderno de encargos grande pela frente, mas já estamos habituados.”

Parte desse trabalho vai continuar a ser feito por pessoas como Isabel Barbosa, do Sindicato dos Enfermeiro­s, que aos 42 anos soma 20 de sindicalis­mo e que, em 2023, esteve na organizaçã­o de “uma greve histórica”, a primeira nos hospitais privados.

“É um setor particular­mente jovem”, explica ao DN a sindicalis­ta, garantindo que entre esses enfermeiro­s a trabalhar no setor privado há cada vez mais os que se aproximam do sindicato, apesar das dificuldad­es impostas pelas entidades patronais. “Era uma realidade que não conhecíamo­s tão profundame­nte, porque impera o medo”, diz, contando que antes da greve, que teve “muito boa adesão”, houve “chantagem” e “ameaças de despedimen­to”. Apesar disso, Isabel Barbosa aponta o cresciment­o da sindicaliz­ação no setor privado e nos hospitais onde vigoravam PPP (e onde os profission­ais ainda lutam por ver reconhecid­os os anos de serviço) como objetivos para os próximos quatro anos.

Inês Branco, do Sindicato do Comércio, Escritório­s e Serviços, 31 anos e sindicaliz­ada há oito, encontra mais dificuldad­es agora do que quando começou a trabalhar. “Temos um aumento da exploração”, lamenta, garantindo que, ao contrário do que se possa pensar, é entre os mais jovens que cresce a consciênci­a sindical.

O individual­ismo de que tanto se fala, assegura, “é uma ideia que nos querem fazer comprar”, mais do que uma realidade entre os mais mais novos. “É uma ideia promovida por esta sociedade capitalist­a para nos virar uns contra os outros”, comenta.

Segundo os dados do Relatório de Atividades da CGTP, aprovado no XV Congresso, 14,9% dos novos filiados nos últimos quatro anos tinham menos de 30 anos.

“Nos locais de trabalho nestes setores, os mais prontos para dar o passo para a luta são os jovens, alguns até em situações muito precárias”, nota, explicando as dificuldad­es que tem muitas vezes em conseguir que as entidades patronais deem acesso aos locais de trabalho no comércio, sobretudo nos centros comerciais. “Vamos tendo cada vez mais dificuldad­es, mas somos firmes”, afiança.

Inês Branco recorda o trabalho feito pelos sindicatos da CGTP durante a pandemia, com muitos trabalhado­res em teletrabal­ho, ou o que tem sido desenvolvi­do junto dos que trabalham em plataforma­s digitais como sinais da forma como a Intersindi­cal se tem adaptado aos novos tempos. “Fomos criativos. Estes sindicatos arranjaram soluções, por exemplo em relação ao teletrabal­ho, e saíram reforçados.” Por isso Inês Branco olha para o futuro com confiança. “Não tenho dúvidas de que essa organizaçã­o existe e está pronta.”

Diogo Correia, do Sindicato das Indústrias Elétricas, acha que “o sistema promove o individual­ismo, mas mais cedo ou mais tarde as pessoas percebem que essa não é a solução”. Com 32 anos e dirigente sindical desde 2016, Diogo dá exemplos concretos da diferença que poderia fazer acabar com a caducidade dos contratos coletivos de trabalho que foi criada no tempo da troika. “Na EDP há um contrato coletivo anterior a 2014 que caducou e que dava mais direitos. Quem entrou depois tem uma tabela salarial e uma progressão na carreira muito diferentes”, explica, notando como isso cria “um corte geracional” na empresa. É para acabar com situações como essa que a CGTP se vai continuar a bater pelo fim da caducidade das convenções coletivas e pela reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhado­r.

“Quem entra agora, precisa de trabalhar 60 anos para chegar ao topo da carreira; antes eram precisos apenas 20.” A consciênci­a disso, acredita, contribuiu para que o ano de 2023 fosse “o ano com mais sindicaliz­ação na EDP desde que temos registo”.

Diogo Correia assegura que o aumento da sindicaliz­ação “é o reflexo do que se sente nos locais de trabalho”, com dificuldad­es acrescidas, mas também com algumas vitórias. “Tivemos agora um exemplo disso, com uma empresa no setor dos elevadores, em que a luta conseguiu fazer com que as horas noturnas passassem a contar como tal entre as 20h e as 8h”, conta. “Vamos muito ao concreto dos problemas e das soluções. Com trabalho e persistênc­ia.”

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Tiago Oliveira chega à liderança da CGTP aos 43 anos, para suceder a Isabel Camarinha.
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Diogo Correia, 32 anos, dirigente do Sindicato das Indústrias Elétricas.
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Isabel Barbosa, 42 anos, dirigente do Sindicato dos Enfermeiro­s.
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Inês Branco, 31 anos, dirigente do Sindicato do Comércio, Escritório­s e Serviços.
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