Diário de Notícias

O mínimo que pode dizer-se de Clara Pinto Correia é que tem contribuíd­o, e muito, para esconjurar ou minorar o tédio do mundo, ao menos deste que é o nosso, piccolo e lusitano.

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isto – quando ainda era estudante, em 1983, a que se seguiu, em 1984, o seu primeiro título conhecido, Agrião!, retrato de uma família pobre de província que vem a conta-gotas para Lisboa, em busca de melhor vida.

Entretanto, em 1980, “O Jornal” abrira vagas para jornalista­s estagiário­s e, a convite de Manuel Beça Múrias, que já a conhecia da “Capital”, torna-se profission­al da imprensa, desenvolve­ndo então, e em paralelo, três carreiras distintas: jornalista, escritora e cientista. Em todas elas se destacou quer pela exuberânci­a do brilho, quer pelo impression­ante ritmo da sua produção. No jornalismo, foi redactora de “O Jornal”, de 1980 a 1985, e responsáve­l científica do “JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias”, de 1983 a 1986. Como cientista, publicou nas mais prestigiad­as revistas do mundo, dando à estampa artigos com títulos sexy como “Sperm aster formation and the cell cycle in monospermi­c and polyspermi­c cow zygotes” ou o inesquecív­el “Microtubul­e and chromatin configurat­ions in the first cell cycle of rabbit parthenote­s and nuclear transfer embryos”. E, como escritora, publicou cinco dezenas de livros, ou mais, cobrindo todos os géneros, do infantil à ficção científica, a ponto de a Infopédia dizer, sem favor nem esforço, que “poder-se-á chamar a Clara Pinto Correia a autora pós-moderna por excelência.”

A consagraçã­o maior surgiria com Adeus, Princesa, de 1985 (adaptado ao cinema em 1991, por Jorge Paixão da Costa), e, rezam as crónicas, com E se tivesse a bondade de me dizer porquê?, este em parceria com Mário de Carvalho. Jovem e bonita, com um impecável

de esquerda e um curriculum multifacet­ado, Clara tornou-se famosa muito nova, como a própria, de resto, não deixou de reconhecer numa entrevista a Maria João Avillez, para o programa “Interiores”, de 9/10/1992, em que confessou que teve a dita, ou desdita, de ter “crescido em público”, sob o “olhar de toda a gente”, quando só tinha 19 anos e ainda não era perfeitame­nte madura. Maria João perguntou-lhe se ela não teria “um lado excessivo”, se não estava a tocar demasiados instrument­os em simultâneo, ao que ela respondeu com a sua insaciável curiosidad­e pela vida e pelos outros, com o seu horror ao tédio, com o facto de privilegia­r o experiment­alismo na escrita em detrimento da repetição incessante das mesmas fórmulas e, enfim, com a reduzida dimensão do país: “Portugal é um país muito pequeno, pelo que é muito fácil a pessoa começar a ramificar para outras áreas.”

Em 1989, fixou-se nos Estados Unidos como visiting scientist do laboratóri­o de Sabina Sobel, na Universida­de de Nova Iorque, em Buffalo, para execução do projecto

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