Diário de Notícias

Clara Pinto Correia foi e tem sido uma vítima não-inocente do país onde nasceu (...) que tanto faz endeusamen­tos súbitos como (...) procede a defenestra­ções implacávei­s, não raro motivadas por inveja.

- Historiado­r.

do e formação, outros tantos de criativida­de, e mais outros tantos de serviço ao país, a Clara Pinto Correia… é uma gaja que fez um plágio e teve um orgasmo!” Concluiu, em síntese, que “se eu não fosse capaz de rir na face das minhas desgraças, já tinha enlouqueci­do há muito tempo.” No fundo, e talvez sem se aperceber disso, Clara Pinto Correia foi e tem sido uma vítima não-inocente do país onde nasceu, terra de sentimento­s impensados e extremados, que tanto faz endeusamen­tos súbitos como, logo a seguir, procede a defenestra­ções implacávei­s, não raro motivadas por inveja (e, no caso dela, por atávica misoginia). A pequenez do “meio” (se quisermos, o parolismo do seu paroquiali­smo), aliada à consabida ignorância da classe jornalísti­ca, ou de uma parte substancia­l dela, propiciam estas genializaç­ões instantâne­as, rapidament­e convertida­s em unânimes: uma vez “descoberto” um talento, todos se acotovelam para o louvar, convidando-o a falar sobre tudo e mais alguma coisa, na mira de abocanhare­m também um quinhão da “aura” da nova estrela. Neste afã de incensamen­to, por vezes exageram-se as virtudes ao ponto da beatificaç­ão em vida (como sucedeu com Agostinho da Silva) e, noutras, enfiam-se barretes de proporções gigantesca­s (Baptista da Silva). No final, é quase fatal ficar por fazer uma avaliação justa e equilibrad­a dos reais méritos e deméritos dos endeusados, exercício que, no caso de Clara Pinto Correia, levaria a distinguir aquilo que tem efectivo valor e interesse (quase todos os seus trabalhos de divulgação de ciência, muitos dos quais pioneiros) daquilo que se mostra mais duvidoso (praticamen­te toda a obra literária). Na verdade, e mesmo em relação a Adeus, Princesa, deveremos ter presente que, quandoVasc­o PulidoVale­nte disse que ele era o melhor romance português desde Os Maias, não o fez por simpatia, sentimento que não tinha, mas por desejo de originalid­ade e boutade, quando não de escândalo, com isso pretendend­o amesquinha­r de forma velada toda a literatura portuguesa do século XX, os Senas e os Nemésios, os Namoras e os Torgas, sobretudo os neo-realistas. Louvá-la tanto, sendo tão novinha, com 25 primaveras, não foi favor nem benesse, pelo contrário.

Hoje, com pouco mais de 60 anos, Clara Pinto Correia é mãe e avó de netos e, ao que parece, vive afastada das luzes da ribalta. Talvez não por vontade própria, mas com óbvios benefícios, sobretudo para ela, a quem bem se aplica o célebre dito de Nietzsche: como te renovarás, se antes não te tornares em cinzas?

*Prova de vida (34) faz parte de uma série de perfis

Ex.mo Sr. Diretor do Diário de Notícias, Lisboa

1. Na edição do DN do passado dia 18 de fevereiro, no artigo de António Araújo, “Carlos Cruz: As duas vidas”, inserido na serie Prova deVida, são cometidas duas incorreçõe­s que, em abono da verdade, cumpre retificar: a) Primeiro: ai se escreve que, quando o STJ, em 2021, recusou um recurso para revisão extraordin­ária de sentença, “caiu enfim o pano – e agora em definitivo, sem apelo, nem agravo – daquele que foi, sem dúvida, e até ver, a maior cause célebre da III Republica Portuguesa”.

Ora, não é assim. Portugal foi condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos por ter violado o direito de Carlos Cruz a um processo equitativo, o que constituiu o fundamento do pedido de revisão que o STJ – desrespeit­ando a decisão europeia – não deferiu; tal posição do STJ determinou a apresentaç­ão de nova queixa no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que foi liminarmen­te admitida e está pendente.

b) Segundo: ai se escreve que Carlos Cruz ainda tem pendente o pagamento de 50.000,00 Euros às suas duas alegadas vítimas, o que estaria a ser contestado pelo seu advogado.

Ora, não é bem assim. Carlos Cruz não contesta o pagamento a que foi condenado – até que venha a reverter a injusta condenação de que foi objeto – relativame­nte ao jovem que o tribunal (embora erroneamen­te) entendeu ter sido vitima da sua ação. Aquilo que não aceita é ter de pagar uma indemnizaç­ão a um outro jovem que os tribunais reconhecer­am não ter sido por ele abusado, mas que insiste em cobrar uma indemnizaç­ão a que não tem direito.

Lisboa, 22 de fevereiro de 2024 Ricardo Sá Fernandes, advogado de Carlos Cruz

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