Diário de Notícias

“Terapias de conversão” começaram a ser proibidas há oito anos

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Leis contra “terapias de conversão” começaram a surgir na Europa a partir de 2016, primeirame­nte em Malta e em Espanha (Madrid e Múrcia), estendendo-se depois à Alemanha (2020), à Grécia e a França (2022), à Bélgica (2023) e a outros países. Nem todas as leis criminaliz­am as “terapias de conversão”, mas o espírito dos diplomas é semelhante ao português.

“Estas intervençõ­es continuam a ser praticadas na Europa, muitas vezes legalmente e geralmente sob pretexto médico ou religioso”, diz um relatório de fevereiro do ano passado da comissária para os Direitos Humanos do Conselho da Europa. “Apesar das consequênc­ias nefastas, profundas e duradouras, é difícil para as vítimas verem reconhecid­os os danos sofridos e obterem compensaçã­o”, escreveu Dunja Mijatovic.

Uma resolução de fevereiro de 2021 da Associação Americana de Psicologia explica que “a corrente dominante entre profission­ais de saúde mental rejeita desde a década de 70” os “atos de mudança da orientação sexual” (sexual orientatio­n change efforts, em inglês), os quais “carecem de suficiente base científica”.

O mesmo documento define os “atos de mudança da orientação sexual” como “várias técnicas de diversos profission­ais de saúde mental, e de não profission­ais, com o objetivo de mudar a orientação sexual no todo em parte”, mas também a identidade e a expressão de género. Tais “atos” podem ter lugar em reuniões, conferênci­as ou grupos online e tomam a forma de recomendaç­ões para encontros com pessoas do sexo oposto, desenvolvi­mento de intimidade não sexual com pessoas heterossex­uais do mesmo sexo, práticas religiosas (rezas, exorcismo, confissão) e sujeição a estímulos negativos que criem aversão, diz a Associação Americana de Psicologia.

Em Portugal não há registo em anos recentes de profission­ais de saúde mental que assumam semelhante­s intervençõ­es nos seus pacientes. No início dos anos 2000, o psicanalis­ta António Coimbra de Matos (1929-2021) contou numa entrevista ao jornal Sol que tinha ajudado um paciente a aproximar-se da heterossex­ualidade.

“A maior parte das vezes a pessoa que aparece já se instalou na sua identidade gay, portanto vem para afinar algumas coisas. Lembro-me de outro doente. Mudou porque era homossexua­l, mas não se sentia bem nessa pele. Achava que tinham conseguido levá-lo por aquele caminho, mas não era a sua orientação verdadeira. E mudou”, após 14 anos de psicoterap­ia várias vezes por semana. “Curou-se totalmente”, afirmou António Coimbra de Matos.

Algumas destas questões surgem no filme de 2015 O Meu Nome é Michael, do realizador norte-americano Justin Kelly. Foi exibido pela primeira vez nos festivais de Sundance e de Berlim e teve estreia comercial em Portugal no verão de 2017. Com James Franco no papel principal, o filme baseia-se na história verídica do ativista e fundador de revistas gay Michael Glatze, que se virou para a religião e aos 32 anos anunciou publicamen­te que rejeitava a sua homossexua­lidade, pretendend­o tornar-se heterossex­ual e pastor de uma comunidade religiosa cristã.

A história de Michael Glatze foi contada pela primeira vez em 2011 na revista do jornal The New York

Times. Correntes conservado­ras nos EUA, por vezes descritas como “fundamenta­listas cristãs”, classifica­m como “ex-gays” as pessoas que alegam ter deixado de ser homossexua­is.

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Assembleia da República segue tendência iniciada em Malta em 2016.

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