Diário de Notícias

Isto é gozar com as eleições

- Carlos Ferro Editor executivo do Diário de Notícias

Otítulo que o leitor já leu foi adaptado do programa que Ricardo Araújo Pereira apresenta diariament­e na SIC e ao qual agradeço desde já a inspiração para uma parte deste texto que é publicado no final de uma semana em que, devido à campanha eleitoral em curso, muito se discutiu a imigração e a sua culpa por quase tudo o que de mal acontece no país, tinta verde foi atirada a um candidato e, imagine-se, até houve quem se atrevesse a tentar falar de propostas para o futuro. Mas sem receber grandes respostas ou contraprop­ostas.

Mas, comecemos pelo título: “Isto é gozar com as eleições”. Ao contrário do que o leitor certamente pensará, não me refiro aos candidatos dos partidos, aos seus apoiantes ou a qualquer entidade abstrata que possa fazer comentário­s sobre as Legislativ­as marcadas para 10 de março.

Não, na realidade o alvo desta frase é a muito falada, nestas alturas, Comissão Nacional de Eleições (CNE). No domingo, dia 25 de fevereiro, Ricardo Araújo Pereira referiu que esta entidade tinha publicado um documento com diretivas para os tempos de antena nas rádios e televisões onde se faz referência às coimas que quem não cumprir a legislação terá de pagar. Até aqui está tudo bem, o problema é quando se referem os valores envolvidos.

Depois de ser surpreendi­do pelo que foi dito no programa, decidi esperar pela terça-feira – portanto dois dias depois da denúncia – e ir ler o documento. Foi o que fiz e, claro, estava tudo na mesma.

Aqui chegado deixo a explicação: o valor das coimas está em escudos. Sim, a moeda que foi substituíd­a pelo euro a 1 de janeiro de 2002.

Ao ler o “Caderno de Apoio – Tempo de Antena”, os responsáve­is pelas televisões e rádios ficaram a saber no artigo 132 que “o não cumpriment­o dos deveres impostos pelos artigos 62.º e 63.º constitui contraorde­nação, sendo cada infração punível com coima: a) De 750 000$00 a 2 500 000$00, no caso das estações de rádio; b) De 1 500 000$00 a 5 000 000$00, no caso das estações de televisão.”

Aqui chegados se calhar devemos parafrasea­r o atual secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres: “É fazer a conta”.

É verdade que o tema é ótimo para um programa de entretenim­ento, mas já não tenho dúvidas de que um documento oficial de uma entidade com a responsabi­lidade da CNE não pode ter este tipo de erros – já agora, só para que não fiquem dúvidas sobre a inércia ontem (sexta-feira, 1 de março de 2024) voltei a consultar o documento e nada tinha sido alterado.

Portanto, ou o responsáve­l pelas 46 páginas do “Caderno de Apoio – Tempo de Antena” não teve tempo para fazer a conversão, o que é estranho, ou então foi algo pior. Pelo menos depois da denúncia podiam ter feito uma correção ao documento.

Mas isso sou eu a dizer, que não gosto de

“gozar” com coisas sérias como uma votação para eleger, no caso, deputados da Nação.

Quem também anda a brincar nesta campanha são os elementos da Climáximo.

As suas preocupaçõ­es com a crise climática devem ser encaradas com cautela e interesse no que for realistica­mente possível. Mas só isso.

Atirar tinta a candidatos a deputados e interrompe­r programas de televisão, para referir só as ações mais recentes, já são situações que acabam por criar mais anticorpos que simpatia. E tenho muitas dúvidas de que ganhem apoios mesmo entre quem defende a luta contra as alterações climáticas.

O facto de ninguém ter falado sobre o que defende a Climáximo – cujos membros dizem estar numa guerra contra, por exemplo, os combustíve­is fósseis –, tendo-se centrado a discussão em redor da atitude contra o líder do PSD, Luís Montenegro, talvez devesse fazer repensar as ações de protesto.

É que para o caso de os representa­ntes do movimento não terem reparado ninguém quis saber o que defendem, preferindo todos os comentador­es e analistas criticar a atitude.

Lição a retirar: andaram a brincar e espero que se tenham divertido. Infelizmen­te para as causas que defendem a sua ação ficou por aí…

O valor das coimas para as rádios e televisões que não cumprirem a lei está definido em escudos. Sim, a moeda que foi substituíd­a pelo euro a 1 de janeiro de 2002.”

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