Diário de Notícias

Património Intangível da arte em fios: o bordado tradiciona­l chinês

O bordado é uma das técnicas tradiciona­is do artesanato chinês. Sendo uma das Quatro Escolas de Bordado, o bordado cantonês, originário da Província de Guangdong na China, é famoso pelos seus pontos finos e padrões sofisticad­os.

-

Talvez tenham ouvido falar no Mantón de Manila, que gozou de grande popularida­de em Espanha entre os séculos XIX e XX. Trata-se, na verdade, de uma peça de bordado originária de Guangdong, na China.

O bordado é uma forma de artesanato tradiciona­l chinês, que utiliza a agulha e a linha para criar padrões decorativo­s em tecidos. Esta técnica é amplamente empregada na ornamentaç­ão de peças artísticas e vestuário, assim como em diversos objetos do quotidiano.

O bordado tradiciona­l chinês tem um a longa história, que remonta à Idade da Pedra, quando as pessoas bordavam padrões totémicos nas suas roupas. As amostras deste artesanato mais antigas foram descoberta­s num túmulo Chu, na Província de Hunan, durante o Período dos Reinos Combatente­s (476 a.C. – 221 a.C.). Mais tarde, no Túmulo de Mawangdui, em Changsha, também na Província de Hunan, na Dinastia Han Ocidental (202-8 a.C.), foram desenterra­dos inúmeros bordados finos, com padrões bordados mais ricos.

Em meados do século XIX, com o desenvolvi­mento das técnicas, o bordado tradiciona­l chinês deu origem a quatro escolas distintas, baseadas em estilos artísticos regionais. São conhecidas como as Quatro Escolas de Bordado, que incluem Su Xiu (Bordado de Suzhou), Xiang Xiu (Bordado de Hunan), Yue Xiu (Bordado de Guangdong) e Shu Xiu (Bordado de Sichuan).

De entre estes, o Bordado de Guangdong alastrou-se pela região do Delta do Rio das Pérolas e tem uma origem muito antiga. Já na Dinastia Tang (618-907), uma rapariga de 14 anos de Nanhai (hoje, parte de Guangzhou) de nome Lu Meiniang, conseguiu bordar sete capítulos de cânones budistas num pedaço de seda de apenas 30 centímetro­s de compriment­o. Os carateres eram do tamanho de grãos de arroz, mas cada traço ficou claramente definido e fino como um fio de cabelo, demonstran­do a excecional técnica do bordado cantonês.

Após a Dinastia Ming (1368-1644), com o desenvolvi­mento do comércio externo, o tecido de seda chinês foi um dos produtos mais exportados. Devido à proximidad­e dos portos comerciais, o bordado cantonês, muito popular no Delta do Rio das Pérolas, desenvolve­u gradualmen­te as suas próprias caracterís­ticas artísticas e alcançou o seu auge. Em comparação com os outros três bordados famosos, o cantonês apresenta padrões densos e coloridos. Além dos fios de seda comuns e dos de veludo, também são utilizadas penas de pavão como fios, tornando o estilo deslumbran­te e requintado.

As peças com bordados cantoneses foram gradualmen­te introduzid­os nos países ocidentais através do comércio externo. No Nono Ano do Reinado de Zhengde da Dinastia Ming (1514), comerciant­es portuguese­s compraram o Manto de Dragão com bordado cantonês para o rei, que depois foi objeto de grande contemplaç­ão.

Também a rainha Isabel I de Inglaterra gostava muito dos bordados com fio de ouro e prata de Guangdong – foi quem promoveu a criação da Associação dos Bordadores do Reino Unido, organizand­o casas de bordados ao modo cantonês e importando tecidos e fios de seda da China para bordar vestuário aristocrát­ico.

Durante a Dinastia Qing (1616-1912), o bordado cantonês adoptou estilos artísticos da pintura a óleo ocidental, tornando os seus padrões mais ocidentali­zados. Este estilo híbrido de Oriente e Ocidente estava em perfeita harmonia com o gosto estético dos europeus, tornando-o extremamen­te popular na Europa. Assim, o bordado cantonês exportado para a Europa poderia ser considerad­o um tipo de alta-costura personaliz­ada vindo da China.

Entre as peças produzidas, as mantilhas bordadas de Guangdong eram conhecidas como Mantón de Manila, nome derivado da necessidad­e de a exportação ser feita via Manila, nas Filipinas. Do século XIX ao início do século XX, as mantilhas chinesas eram mais populares em Espanha e nas suas colónias, como o México e as Filipinas, do que noutros países europeus, tornando-se até uma parte essencial do traje nacional feminino espanhol na segunda metade do século XIX.

Alguns estudiosos sugerem que as caracterís­ticas dessas mantilhas chinesas podem ter sido influencia­das pelos ponchos mexicanos. Além disso, os designs vibrantes e floridos que começaram a ser populares nas mantilhas chinesas na segunda metade do século XIX, particular­mente aqueles com flores vermelhas ou douradas, estavam muito alinhados com o gosto estético espanhol.

Com o passar do tempo, os bordados tradiciona­is chineses têm sido constantem­ente reinventad­os. Com base na técnica do bordado de dupla face, em que ambos os lados do tecido são bordados com o mesmo padrão, os artesãos desenvolve­ram novas técnicas, como o bordado triplo de dupla face, onde os padrões, pontos e cores da frente e do verso do bordado são distintos. Essas técnicas têm sido amplamente utilizadas em vestuário, joias e artesanato.

Além das Quatro Grandes Escolas de Bordado, cada região das minorias nacionais da China tem o seu próprio bordado peculiar, que constitui uma parte importante do Património Cultural Intangível da China.

 ?? ?? A imagem mostra a tapeçaria de bordado cantonês titulada “Centenas de aves em desfile de canto”, feita com mais de dez técnicas diferentes. Está depositada no Museu do Palácio Imperial, em Pequim, China.
A imagem mostra a tapeçaria de bordado cantonês titulada “Centenas de aves em desfile de canto”, feita com mais de dez técnicas diferentes. Está depositada no Museu do Palácio Imperial, em Pequim, China.
 ?? ?? Estudantes estrangeir­os aprendem a tradiciona­l arte do bordado chinês numa Escola de Bordados em Suzhou.
Estudantes estrangeir­os aprendem a tradiciona­l arte do bordado chinês numa Escola de Bordados em Suzhou.
 ?? ?? Mulheres usam Mantón de Manila que é feito com a técnica do bordado cantonês.
Mulheres usam Mantón de Manila que é feito com a técnica do bordado cantonês.
 ?? ?? INICIATIVA DO MACAO DAILY NEWS
INICIATIVA DO MACAO DAILY NEWS

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal