Diário de Notícias

A política trocada por miúdos. Livros para construir cidadãos

A Assembleia da República reuniu alguns dos melhores escritores e ilustrador­es de livros infantojuv­enis para criarem 12 álbuns gráficos sobre temas de política e cidadania. Eleições, ditadura, República e Constituiç­ão são alguns dos temas que a coleção Mi

- TEXTO MARGARIDA DAVIM

Um grupo de crianças discute numa escola o destino do passeio de finalistas. Ninguém se entende e os miúdos não sabem como decidir. Até que um deles se lembra de ir falar com o avô e, juntos, começam a perceber como funciona uma eleição. Foi esta a forma que a escritora Luísa Ducla Soares encontrou para trocar por miúdos um dos momentos mais importante­s da democracia, as eleições, num livro que faz parte da Missão: Democracia, uma coleção de títulos infantojuv­enis lançada pela Assembleia da República.

Sara Ludovico, a coordenado­ra editorial juntamente com Maria Teresa Paulo, chefe da Divisão de Edições do Parlamento, e a especialis­ta em Literatura Infantojuv­enil, Dora Batalim Sottomayor, começaram por fazer duas listas: uma de temas que representa­ssem conceitos fundamenta­is para a cidadania; e outra com autores de várias gerações que representa­ssem o que de melhor se faz neste segmento literário.

A autora que foi política

Luísa Ducla Soares, uma das decanas da literatura infantil, estava na lista. Mas, quando lhe propuseram escrever sobre a Constituiç­ão, a autora torceu o nariz. “Não há mais nenhum para escolher?” Havia. O tema das eleições, que Ducla Soares não hesitou em agarrar.

“Vivi no mundo da política durante dezenas de anos. Conheço muita coisa sobre isso”, conta ao DN a escritora, que é também viúva do histórico socialista Mário Sottomayor Cardia.

“Fartei-me de colar cartazes, estive dezenas de anos nas mesas de voto nas eleições, cheguei a estar nas listas do PS em autárquica­s, sempre em lugares não-elegíveis”, conta, explicando que chegou até a fazer “um curso sobre eleições, que o PS organizou com uns alemães logo a seguir ao 25 de Abril”, onde aprendeu coisas sobre técnicas de abordagem em campanha e até algumas noções de marketing político.

“Felizmente nunca fui eleita”, diz com uma gargalhada a escritora, que também foi jornalista, diretora de uma revista, e trabalhou durante décadas na Biblioteca Nacional.

Defensora da ideia de que “há formas de falar com as crianças sobre todos os assuntos”, acredita que é importante explicar aos mais novos “que os políticos ponova dem mudar também a vida das crianças”, através das escolhas que fazem, seja nas mudanças que fazem nas escolas, na construção do espaço público ou até das condições laborais dos pais, e como isso pode afetar a sua vida familiar.

A coleção começou com a edição de um livro sobre a República, lançado no dia 5 de Outubro, e já conta com títulos sobre cidadania, democracia, lei e eleições, o último a ser lançado. A próxima edição, de um total de 12 volumes, será sobre a figura do deputado e será lançada assim que a Assembleia da República que sair destas eleições tomar posse.

Segue-se um livro sobre a ditadura e outro sobre o 25 de Abril, que serão editados em abril. A coleção fica completa com livros sobre a liberdade, o Palácio de São Bento, a Constituiç­ão e a União Europeia.

“Era preciso renovar a oferta infantojuv­enil das edições da Assembleia da República”, diz ao DN a coordenado­ra editorial do projeto, Sara Ludovico. Até agora, o portefólio para este segmento dos mais novos resumia-se a um

título sobre o 25 de Abril, de Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, lançado há já quase 20 anos, mas que Sara Ludovico garante ser “um verdadeiro best-seller”, que tem sido reeditado ano após ano.

A apetência por este tipo de livros acabou por ser a desculpa para lançar uma coleção, que faz agora também parte da comemoraçã­o dos 50 anos do 25 de Abril pela Assembleia da República. Estes livros, assegura Sara Ludovico, acabam por ser “uma montra da nossa melhor literatura e ilustração infantil”, com vários escritores e ilustrador­es premiados no lote dos que assinam as obras.

Inspirados nas próprias vidas

Em alguns casos, a proposta de fazer um livro sobre estes temas foi ao encontro de projetos antigos dos autores. Foi o caso de António Jorge Gonçalves, que nesta coleção escreve e ilustra uma novela gráfica sobre a ditadura. Gonçalves é um dos autores mais velhos deste lote de escritores e as memórias do que viveu quando Portugal vivia sob a mordaça do regime de Salazar serviram de inspiração para o livro.

A poeta Rita Taborda Duarte, que escreve sobre o 25 de Abril, também foi buscar à sua própria vida a inspiração para contar a revolução aos mais novos. Rita nasceu quando pai estava preso por motivos políticos em Peniche. A primeira vez que se viram foi através do vidro do parlatório da cadeia. E acabariam por fugir para o exílio depois disso. A biografia marcada por esse passado serve agora para dar corpo ao texto.

Obras dos 6 aos 100 anos

A coleção conta ainda com nomes como os de Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, Afonso Cruz, Isabel Zambujal ou David Machado. Todo o projeto tem a coordenaçã­o gráfica da equipa da editora infantil Planeta Tangerina. E para cada livro as coordenado­ras editoriais indicaram um consultor científico, que é sempre alguém que trabalha na Assembleia da República, para assegurar que toda a informação passada nas histórias é correta do ponto de vista factual.

“É importante que os livros sejam rigorosos”, vinca Sara Ludovico, contando que no caso da obra que se dedica a explicar o que é uma lei há, por exemplo, um fluxograma sobre o processo legislativ­o que foi revisto e validado por uma funcionári­a parlamenta­r que está na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias do Parlamento.

Estas obras foram pensadas para um público que vai dos 6 anos 14 anos, mas Sara Ludovico explica que elas se destinam a todos, adultos incluídos. “São álbuns gráficos. Cada um deles é um objeto artístico”, afirma a coordenado­ra editorial do projeto.

Uma vez que, como vinca Sara Ludovico, “o fito desta coleção não é o lucro” (as edições são financiada­s pela Assembleia da República), as obras estão à venda por 8,00 euros, um valor bastante abaixo da média para este tipo de títulos. E podem ser comprados não só na livraria da Assembleia da República, mas em várias livrarias espalhadas por todo o país.

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A coleção começou com a edição de um livro sobre a República, lançado no dia 5 de Outubro, e já conta com títulos sobre cidadania, democracia, lei e eleições, o último a ser lançado. A próxima edição, de um total de 12 volumes, será sobre a figura do deputado.
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