Diário de Notícias

Divórcio e pílula? Grandes pecados

- TEXTO AMANDA LIMA

Há cinco décadas, enquanto Portugal vivia uma ditadura, os vizinhos europeus também não viviam grandes momentos em termos de direitos, especialme­nte as mulheres. O DN noticiou a 14 de março de 1974 o lançamento de uma campanha “oficial” do Vaticano contra o aborto, os métodos contraceti­vos e o divórcio. O objetivo principal era banir da lei italiana o direito ao divórcio, aprovado em 1970 pelo Parlamento do país.

Foi a primeira declaração pública do Papa Paulo VI após o Governo de Itália anunciar um plebiscito que consultari­a a população sobre o direito ao divórcio. A consulta estava marcada para o dia 12 de maio daquele ano. O texto dava conta de consequênc­ias terríveis para as sociedades que “tolerassem” tais situações. “Toda a sociedade que ignore o papel da família estará condenada a tornar-se pó dos indivíduos, desenraiza­dos, vítimas de um trágico isolamento ou ditadura cruel.. E acrescento­u outras consequênc­ias como a “dissolução” ou “escravizaç­ão”.

O discurso era bastante incisivo, sem deixar margem para interpreta­ções dúbias, especialme­nte aos políticos da época, o que deixava clara a falta de laicidade do Estado .“As atitudes morais estão dependente­s da nobreza ou franqueza dos corações humanos, mas dependem também das suas condições sociais e das leis que os próprios criaram para se regerem. Neste último ponto, os cristãos não podem abdicar das suas responsabi­lidades .”

Havia ainda uma referência direta aos casais, que, reiteradam­ente, tinham de ficar juntos para sempre, não importando o que acontecess­e, como violência doméstica, deixar de amar o parceiro ou qualquer outro facto. “O amor dos casais deve poder apoiar-se com firmeza, na unidade e indissolub­ilidade da união.” O discurso do pecado e da falsa natureza do ser humano também não podia ficar de fora. “Muitos dos requisitos que assinalou estão na natureza humana que é boa, mas ferida pelo pecado, que, deste modo às vezes parecem impossívei­s aos não-cristãos.”

A notícia era de 1974, mas 50 anos depois e muito perto do 25 de Abril, este jornal também noticiou a vontade de um político, que estava em campanha eleitoral, de criar um novo referendo para consultar a população portuguesa sobre o direito ao aborto. Afinal, 1974 e 2024 possuem algumas semelhança­s.

 ?? ?? DITADURA CRUEL A referência não é como se vivia em Portugal em 1974. A notícia é que todas as sociedades que tolerassem direitos básicos viveriam a tal ditadura cruel, mas não só: também a dissolução e a escravidão. As ordens eram do próprio Papa da altura.
DITADURA CRUEL A referência não é como se vivia em Portugal em 1974. A notícia é que todas as sociedades que tolerassem direitos básicos viveriam a tal ditadura cruel, mas não só: também a dissolução e a escravidão. As ordens eram do próprio Papa da altura.

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