Três jovens veteranos juntam-se à estrela da nova esquerda
Isabel Mendes Lopes, Jorge Pinto e Paulo Muacho estão no primeiro grupo parlamentar do único partido de esquerda que ficou com mais deputados. Diálogo é uma palavra-chave.
Nascido em Campo Maior, o advogado foi deputado municipal em Lisboa, mas passou grande parte da vida na Margem Sul, contribuindo para a criação do núcleo distrital do Livre em Setúbal, círculo pelo qual foi eleito.
Nem todos os futuros deputados do Livre foram ontem ao Palácio de Belém, saindo a pedir nova audiência ao Presidente da República quando for conhecida a constituição completa da Assembleia da República, após o apuramento dos quatro deputados dos Círculos da Emigração. Mas Rui Tavares teve consigo outros dois representantes do primeiro grupo parlamentar do partido de esquerda ecológica e europeísta, com Isabel Mendes Lopes e Paulo Muacho integrados na comitiva, a que só faltou Jorge Pinto.
Devido ao aumento de votos do Livre, que de 1,28% passa para 3,26%, pouco atrás da CDU, convencendo 199 888 eleitores que facilmente ultrapassarão a barreira dos 200 mil com os votos da emigração, o até agora deputado único Rui Tavares, novamente cabeça de lista por Lisboa, terá ao seu lado no hemiciclo Isabel Mendes Lopes, segunda por Lisboa, e ainda os cabeças de lista pelo Porto, Jorge Pinto, e por Setúbal, Paulo Muacho.
Os quatro eleitos do Livre iniciaram ontem a discussão das comissões parlamentares em que estarão presentes, mas a nota dominante é a oportunidade de o partido participar em todas, e ter suplentes para assegurar a gestão da agenda parlamentar, o que esperam ver traduzido num aumento de produção legislativa e acompanhamento de todos os temas.
Ao DN, Isabel Mendes Lopes disse que, mais do que as sondagens”, foi a reação que os candidatos testemunhavam nas ruas o maior indício de que seria possível formar um grupo parlamentar, após o Livre ter
Formado em Engenharia do Ambiente, o cabeça de lista pelo Porto, natural de Amarante, define-se como alguém que está interessado no ecologismo político e em modelos de globalização alternativos.
A engenheira civil é deputada municipal em Lisboa, cidade onde sempre residiu, sendo especializada em transportes e mobilidade. Com a sua eleição conta ser uma voz a favor dos direitos das mulheres na Assembleia da República. eleito Joacine Katar-Moreira em 2019, e Rui Tavares em 2022. “As pessoas vinham ter connosco”, recorda, dizendo que havia muitos jovens, mas também mais velhos e casais com filhos.
“Estou no Livre desde o início e sempre soube o nome de todas as pessoas do partido, mas agora já não sei”, garante a deputada eleita, que partilha com os outros dois novos deputados a circunstância de estar entre os promotores do partido, legalizado pelo Tribunal Constitucional em 2014.
Muito importante para o resultado do Livre foi a resistência ao apelo ao voto útil feito pelo secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos. “Foi uma prova de que as pessoas perceberam que o seu voto importa e que é importante existir um partido que considere importante haver diálogo e que aponte um caminho de futuro para Portugal”, diz a deputada eleita por Lisboa.
Também Paulo Muacho conseguiu a difícil missão de se eleger em Setúbal, onde vários partidos apostaram e houve um grande avanço do Chega (passou de um para quatro deputados) aproveitando “a força que a esquerda tem no distrito”.
Como segredos do sucesso aponta as preocupações do partido com as principais preocupações dos eleitores do distrito, como a habitação, os transportes e os direitos dos trabalhadores. Mas também destaca a influência do trabalho parlamentar e da prestação de Rui Tavares nos debates televisivos.
Bem recebido por onde passava durante a campanha, Muacho recorda casos em que transeuntes lhe disseram: “Não vale a pena dar-me o folheto porque eu já vou votar Livre”. E, salientando que os deputados representam o país inteiro e não só os círculos eleitorais que os elegem, o cabeça de lista por Setúbal, nascido em Campo Maior, promete particular atenção aos distritos do Alentejo e do Algarve, “aqueles onde o Chega está a ganhar mais força”, num voto que acredita ser “sobretudo de protesto” e não tanto ideológico. E recorda que o problema da saída das novas gerações está longe de ser novo no Alentejo. “Sempre aconteceu os jovens irem para as grandes cidades e nunca mais voltarem”
Quanto ao futuro, “a esquerda tem de fazer uma reflexão grande”, reforça Muacho, admitindo que sem maioria na Assembleia da República “será mais difícil a aprovação de propostas”. Ainda assim, tendo em conta a força relativa da AD, do PS e do Chega, bem como o facto de a soma de todos os partidos do espetro político do Livre permitir “muitas configurações diferentes” na Assembleia da República, “abre-se espaço para um partido que saiba negociar e dialogar”.
Um ponto que também é destacado por Jorge Pinto, eleito pelo círculo do Porto, onde o Livre conseguiu ser a terceira força no centro da capital. Defendendo a “abertura sincera e a fuga ao sectarismo”, o futuro deputado diz que “a política é a arte do confronto, mas não se faz contra tudo e contra todos”, pelo que o Livre deverá nesta legislatura “continuar a fazer política pela positiva, de forma afirmativa e de forma construtiva”, apontando exemplos já existentes, como o passe ferroviário nacional e outras que marcaram a campanha, a começar pela herança social que poderá estar associada a um imposto sucessório sobre grandes fortunas.
O representante do Norte no grupo parlamentar do Livre, que gostaria de integrar a Comissão de Ambiente e Energia, conta estrear-se no Parlamento com a discussão da regionalização, propondo a organização da uma assembleia de cidadãos para definir, como já sucedeu na Holanda, uma pergunta que seja submetida a referendo. E defende a “obrigação e interesse de estar mais próximo da população”, recordando que, sendo de Amarante, sabe como 60 quilómetros podem separar o Grande Porto, uma das regiões mais ricas de Portugal, de uma das zonas com maior pobreza.