Salvar o DN, fortalecer o jornalismo: um dever de cidadania
É altura de se unirem e agirem todos os que se preocupam com a Democracia e com o papel do jornalismo.”
1 Aceitar ser diretora adjunta numa direção interina significa para mim, como jornalista que se orgulhava de, em mais de 30 anos de profissão, nunca ter exercido cargos de chefia, um enorme desafio profissional. Mas este é um, mais um, momento muito difícil para nós, para o DN, depois de um, mais um, anúncio de despedimento coletivo que pretende tirar-nos seis jornalistas – quase ¼ de uma redação esvaziada nos últimos anos como, creio, nenhuma outra do país o foi.
Nas 24 horas que, perante o convite de Bruno Contreiras Mateus, diretor interino nomeado a 12 de março, pedi para pensar, não me saíram da cabeça as palavras que o nosso jornalista Vítor Moita Cordeiro disse à nossa Grande Repórter Fernanda Câncio, na reportagem que ela escreveu sobre todos nós: “Gostaria que este jornal não morresse nas minhas mãos.”
Estou convencida de que todos no DN estão determinados em que isso não aconteça. Orgulho-me muito dos nossos jornalistas – praticamente todos aderiram à greve do passado dia 14 porque estão solidários, conscientes da relevância do seu trabalho e resilientes (quem não quer pessoas assim nas suas equipas?). Sabem que não é o momento para desistir. Porque o DN é muito maior do que nós. Porque salvar o DN é um dever de cidadania. Por tudo o que o DN simboliza na sobrevivência do jornalismo.
2 “A informação independente tem um custo e é reconhecido que media independentes e plurais são fundamentais para o bom funcionamento das sociedades e da sindicância dos sistemas políticos (…). Estando o mercado visivelmente a falhar no assegurar da sustentabilidade dos media independentes, o financiamento público está a emergir como uma solução possível para corrigir desequilíbrios e certificar que a informação permanece um bem público”, lê-se no relatório Public Financing in News Media/Financiamento Público dos Media Jornalísticos, da Comissão Europeia.
Segundo este relatório, publicado em 2024, Portugal está entre os países da União Europeia que menos apoiam o jornalismo. 40 cêntimos anuais per capita é quanto o Estado português gastou em 2022 no apoio, direto e indireto, a media privados. Ver o apoio do Estado como um “papão” que vai coartar a independência da comunicação social é absolutamente contrariado pelo facto de alguns dos países melhor pontuados nos índices de liberdade de imprensa, como a Dinamarca, Noruega e Suécia, serem dos que mais investem nos media privados.
E a ideia de que esse tipo de apoios estatais está ligado a uma noção coletivista da sociedade também esbarra com a realidade: os liberais Luxemburgo, Áustria ou Bélgica estão no topo desse investimento per capita.
Por cá, apesar de o último debate no Parlamento antes da dissolução ter sido sobre a crise na comunicação social, em geral e sobre a situação do Global Media Group, no qual está inserido o DN, em particular, não vimos que este tema tivesse merecido uma única menção nos debates televisivos da campanha.
Apesar disso, os programas eleitorais, se nada apresentam que se compare com os financiamentos em vigor nos países referidos, têm algumas propostas que podem constituir uma base de entendimento no sentido de criar medidas urgentes de apoio.
A Aliança Democrática (AD) pode propor a aprovação do seu Plano de Ação para os Media e em vez de apenas “avaliar a possibilidade”, aprovar a “criação de uma dedução no IRS de despesas com órgãos de comunicação social”, medida à qual a IL acrescenta ainda “um modelo de mecenato especialmente vocacionado para a comunicação social”.
Parece igualmente pacífico juntar a proposta do PS de um “cheque-jornal” à do BE que defende uma “assinatura digital gratuita” e à do Livre que propõe um “cheque-cultura”para incentivar os jovens à compra e leitura de jornais.
Por seu lado o Chega, que quer “estabelecer programas de formação para jornalistas e profissionais de comunicação social (…) focados em competências digitais, jornalismo de investigação e reportagem, a fim de elevar o padrão do jornalismo e adaptá-lo às novas exigências do mercado e às expectativas dos cidadãos”, defende ainda a criação de “um Fundo de Apoio à Comunicação Social” para “apoiar financeiramente os media regionais e locais”, setor que também merece a atenção especial do PCP, o qual propõe “um programa de apoio com uma componente a fundo perdido para aquisição de publicações periódicas de âmbito regional e local por entidades públicas e entidades sem fins lucrativos”.
É altura de se unirem e agirem todos os que realmente se preocupam com a Democracia e com o papel do jornalismo no combate às derivas extremistas, populistas, racistas e xenófobas que se alimentam da desinformação. Não por acaso, o título de um relatório dinamarquês de 2011 sobre subsídios públicos aos media era Apoio à Democracia.