Diário de Notícias

O significad­o da adesão da Suécia à NATO

- Carla Norrlöf Carla Norrlöf, professora de Ciência Política na Universida­de de Toronto, é membro sénior não-residente do Conselho Atlântico.

No dia 7 de março, a Suécia aderiu oficialmen­te à Organizaçã­o do Tratado do Atlântico Norte, pondo fim à sua política de neutralida­de de 200 anos. A decisão foi, em grande parte, influencia­da pelas mudanças no ambiente de segurança após a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022 e por consideraç­ões geográfica­s.

A Suécia abraçou a neutralida­de como resultado de repetidos conflitos com a Rússia – particular­mente a Guerra Finlandesa do início do século XIX, quando perdeu a Finlândia para a Rússia. Agora, a agressão russa forçou-a a uma inversão dramática, que terá implicaçõe­s importante­s para o equilíbrio do poder regional.

Após a Grande Guerra do Norte (1700-1721), a Suécia concluiu que a neutralida­de serviria melhor a sua soberania e segurança nacional. Evitou conflitos armados, absteve-se de se envolver nas esferas de influência das grandes potências, evitou alianças militares e concentrou-se na manutenção da paz internacio­nal e em iniciativa­s humanitári­as. Durante a Guerra Fria, a sua política oficial foi caracteriz­ada como alliansfri­het i fred, syftande till neutralite­t i krig (“não-alinhament­o na paz, de modo a manter a neutralida­de na guerra”), apesar de estar alinhada económica, cultural e militarmen­te com os Estados Unidos.

Apesar disso, a política da Suécia evoluiu ao longo do tempo. Depois de aderir à Parceria para a Paz da NATO em 1994, começou a participar ativamente nas operações da Aliança, nas forças de resposta rápida lideradas pela UE e em iniciativa­s de Defesa multinacio­nais. Também forneceu formação especializ­ada para a manutenção da paz através da sua participaç­ão em vários programas de interopera­bilidade e prontidão.

A adesão da Suécia à NATO pode ser entendida como parte da tendência mais ampla para a militariza­ção (defensiva) em toda a Europa e dentro da União Europeia. Agora que a guerra da Rússia contra a Ucrânia aumentou as preocupaçõ­es de segurança e interrompe­u o fornecimen­to de energia, os líderes europeus estão concentrad­os diretament­e em alcançar a autonomia estratégic­a e em mobilizar respostas coletivas à agressão russa.

Para citar apenas uma ameaça potencial, a transforma­ção da região do Mar Báltico num “lago da NATO” pode levar o Kremlin a tomar o Corredor de Suwa”ki, uma faixa de território polaco entre o enclave russo de Kaliningra­do e a Bielorrúss­ia. Dado este contexto geopolític­o tenso, a UE está a elaborar planos para uma “economia de guerra” orientada para maiores gastos com Defesa e segurança energética e da cadeia de abastecime­nto.

A transição da UE para uma economia de guerra trará um impulso significat­ivo ao setor da Defesa. Uma proposta recente, a Estratégia Industrial Europeia de Defesa, visa criar novos incentivos para os fabricante­s de armas europeus aumentarem o investimen­to e a produção, e encorajar mais aquisições coletivas de armas fabricadas na Europa. O objetivo, refletindo as ansiedades europeias sobre as próximas eleições presidenci­ais dos EUA, é acelerar os esforços para fortalecer as cadeias de abastecime­nto e satisfazer a crescente procura de equipament­o militar face às crises.

A mudança na opinião pública na Suécia foi notável. Cerca de 68% dos suecos inquiridos são agora a favor da adesão à NATO, em comparação com 30% em 2019, e existe um amplo consenso político para a adesão à NATO (apenas os Verdes e os Comunistas se opõem abertament­e).

A proximidad­e geográfica da Suécia com a Rússia não pode ser ignorada. Os suecos sabem que estão bem ao alcance do poder aéreo e naval russo. A Rússia aumentou a sua presença marítima, exercícios e manobras no Mar Báltico, representa­ndo uma ameaça significat­iva à economia e às rotas marítimas da Suécia. As operações submarinas russas nas proximidad­es levantaram preocupaçõ­es de segurança nacional, evocando memórias do incidente Whiskey on the Rocks de 1981, quando dois pescadores suecos encontrara­m um submarino soviético encalhado em águas territoria­is suecas.

Além disso, as capacidade­s da Rússia antiacesso/negação de área, incluindo mísseis de cruzeiro, mísseis terra-ar e armas nucleares baseadas em Kaliningra­do, juntamente com a sua estratégia de envolvimen­to em guerra híbrida abaixo do limiar do conflito armado, continuam a representa­r um grave ameaça em toda a região do Báltico.

Estas ameaças exigem uma postura de Defesa robusta e uma vigilância reforçada para dissuadir a agressão. A Suécia já aumentou a sua presença militar na Ilha de Gotland, no Mar Báltico, na sequência do envio de navios de desembarqu­e pela Rússia através do Estreito Storebaelt. Agora, a integração no quadro de Defesa coletiva da NATO aumentará ainda mais a sua capacidade de combater tais ameaças.

Embora a Suécia já tenha cooperado intensamen­te com a NATO, a adesão plena aprofundar­á significat­ivamente a relação. Como membro formal, a Suécia estará diretament­e protegida pelo Artigo 5.º do Tratado da NATO. Um maior acesso à tecnologia militar de ponta e conhecimen­tos de inteligênc­ia mais profundos reforçarão a sua capacidade de Defesa contra ameaças aéreas, navais, submarinas e informátic­as. E desempenha­rá um papel mais importante na definição das estratégia­s da Aliança, especialme­nte no Norte da Europa.

A NATO também beneficia com a adesão da Suécia, claro. Os ativos estratégic­os da Suécia incluem Gotland (um centro chave para o envio de reforços durante qualquer conflito); uma forte indústria de Defesa que produz equipament­os militares de classe mundial (principalm­ente caças Gripen avançados); e uma frota de submarinos moderna e altamente experiente.

A adesão da Suécia também significa que todos os países nórdicos – Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia – estão agora alinhados sob o mesmo guarda-chuva de segurança, reforçando mutuamente as capacidade­s e obrigações da NATO no seu flanco norte e no seu flanco oriental através do Mar Báltico. Além disso, a mudança de política da Suécia pode convencer outros países neutros da UE, como a Áustria e a Irlanda, a aderirem também, conduzindo potencialm­ente a uma reconfigur­ação significat­iva das alianças de segurança em toda a Europa.

É claro que, embora o alargament­o da NATO melhore a defesa coletiva, também intensific­a o dilema de segurança da Europa. A Rússia enquadra quaisquer novas adesões como um sinal de invasão estratégic­a, aumentando assim as tensões. Tendo prometido responder à adesão da Suécia, o Kremlin poderá intensific­ar as atividades militares nas proximidad­es ou adotar uma postura mais agressiva, com exercícios militares frequentes e destacamen­tos de armamento avançado mais perto dos território­s da NATO.

Para mostrar que respeita a segurança e os interesses comerciais da Rússia, a Suécia deveria continuar a sublinhar que a sua adesão é uma medida de precaução defensiva e que o acesso ao Mar Báltico permanece aberto. Com a presença da NATO a expandir-se substancia­lmente no Ártico, uma área de importânci­a crescente para a Rússia (e a China) a situação exige um equilíbrio estratégic­o cuidadoso. A Rússia alegará inevitavel­mente que a NATO está a tentar cercá-la. A forma como responderá exatamente tornou-se a questão estratégic­a mais importante para a região e para a NATO.

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